quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Autodidactismo e fotografia

Há pessoas que dão enorme valor a quem aprende pelos seus próprios meios. Eu não. Os únicos casos de autodidactas a cuja obra dou valor são os de José Saramago e do pianista austríaco Alfred Brendel. José Saramago ganhou um Prémio Nobel, o que bastaria para não se discutir o seu valor; todavia, quando o leio, sinto sempre que falta qualquer coisa - quando ele escreveu num estilo mais formal -, ou que a transgressão linguística não tem bases consistentes numa escola ou corrente literária. No caso de Alfred Brendel, o autodidactismo levou-o à busca de uma expressão própria que confere uma nova dimensão ao adjectivo «rebuscado». Embora estas linhas possam levar a questionar quem é este gajo para se atrever a falar desta maneira de dois gigantes, a verdade é que me sinto mais confortável ouvindo um concerto para piano de Beethoven por Maurizio Pollini que por Alfred Brendel.
Decidi há muito que não quero ser um autodidacta na fotografia. Embora tenha aprendido muito com a leitura e a apreciação de fotografias de bons mestres, a verdade é que os meus conhecimentos de fotografia - e, em consequência, as minhas fotografias - sofrem de alguma falta de solidez e consistência. Há muita coisa que ainda não sei e que a leitura de livros de Michael Freeman não me vai ensinar. Quero ser um bom fotógrafo: depois de ter percebido que sou capaz de dominar as funções da câmara e de tirar fotos decentes, quero aperfeiçoar-me e suprir as minhas faltas de conhecimento - especialmente quanto à composição e ao enquadramento, mas também quanto a aspectos técnicos que não domino, como por ex. o controlo da medição da luz.
Percebi que não poderia evoluir muito mais sem adquirir conhecimentos consistentes, de preferência ministrados ao vivo por quem sabe muito mais do que eu; tomei, pois, a resolução de me inscrever num workshop de fotografia digital no Instituto Português de Fotografia. Não, não é a mesma coisa que um curso - não estou interessado em tornar-me num profissional -, mas vai decerto ajudar-me a perceber melhor a fotografia e a aprender o que não sei. São €130,00 por seis sessões, mas tenho a garantia que só uma boa escola pode dar (e o valor pode baixar um bocadinho se conseguir arrastar alguém comigo...) Estou morto que chegue o dia 4 de Novembro!

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Conselho n.º 6: tirem muitas fotografias

Nos tempos do rolo, o fotógrafo amador tinha de ser comedido nas fotografias a tirar; tinha de fazer contas a um suporte de gravação limitado em espaço, que apenas admitia 24 ou 32 imagens. Isto tinha o seu lado bom, uma vez que obrigava a pensar bem antes de disparar, mas é óbvio que era uma limitação. Hoje o fotógrafo pode tirar mil fotografias em alta resolução, se tiver um bom cartão de memória, pelo que não há desculpas para descarregar quinze fotografias para o computador no fim de uma sessão fotográfica (a menos que se estivesse particularmente falho de inspiração, claro...) Esta abundância permite que se tire um número indefinido de fotografias do mesmo motivo, de maneira a que se possa escolher a que ficou melhor.
Isto é uma verdadeira bênção. Não apenas porque se podem eliminar as imagens mal tiradas, mas porque dá liberdade para fotografar um motivo de todos os ângulos, iluminações, perspectivas, configurações da câmara e momentos possíveis. Estamos, deste modo, no campo da experimentação, que é essencial para a evolução do fotógrafo. Quando se tem recursos tão vastos ao dispor, deixa de ter cabimento a noção de momento único que existia no tempo da fotografia analógica. As câmaras actuais permitem, até, que se tire fotografias em modo contínuo, com a possibilidade de se obter de três a dez - ou mais - fotogramas por segundo, pelo que desapareceu o imperativo de captar aquele momento particular, aquela fotografia especial e irrepetível que urge captar porque já só se tem dois ou três fotogramas no rolo.
Daí que o meu conselho para hoje seja o de tirarem tantas fotografias quantas as que forem necessárias até que se dêem por satisfeitos com uma; e, mesmo quando essa satisfação é alcançada, continuem a tirar mais fotografias. Por um lado, porque nunca se sabe se não vai acontecer algo que confira ainda mais interesse à imagem e, por outro, porque podem obter diversas imagens, tendo assim por onde escolher. Não tenham medo de experimentar, nem medo das críticas: fazer experiências é metade do prazer de fotografar. Ah - já agora: quando forem fotografar, tenham sempre, se possível, um cartão de memória e uma bateria suplementares. Nunca se sabe o que pode acontecer se seguirem o meu conselho... no domingo, por exemplo, fui à Fundação de Serralves. Tirei muitas dezenas de fotografias. Depois, para relaxar, fui até à Foz. Acabei por tirar outras tantas - que, para minha surpresa, ainda ficaram melhores que as de Serralves!

domingo, 25 de setembro de 2011

Conselho n.º 5: treinar o olhar

A fotografia tem uma vertente técnica importante, mas só a técnica de nada vale se não houver um conteúdo. A fotografia existe para ser exibida, para ser partilhada; tem, por isso, de despertar uma reacção emocional ou intelectual em quem a vê. Este aspecto não pode deixar de estar presente. A técnica, essa, potencia a apreciação da imagem, tornando-a mais agradável e desafiadora para o espectador. A esta conjugação da forma e do conteúdo chamo eu interesse: a fotografia tem, para resumir tudo a uma palavra só, de ser interessante. Tem de mexer com o cérebro ou as sensações de quem vê.
Uma das maneiras de tornar a fotografia interessante é olhar as coisas de uma maneira diferente. Cada um de nós vê os objectos segundo um determinado ponto de vista, de acordo com uma forma de perceber as coisas que é peculiar a cada um. Esta percepção também se treina: basta estar atento e procurar ver o que, de outra maneira, poderia passar despercebido. Mesmo aquelas imagens que já toda a gente viu podem ser fotografadas de uma maneira diferente e original. Ninguém se interessa por fotografias banais, com planos rígidos e sem nada que desperte a curiosidade. A fotografia tem de intrigar pela sua originalidade.
É evidente que a originalidade é um conceito subjectivo. Há motivos que valem a pena ser fotografados, mesmo que toda a gente os tenha já visto centenas de vezes. O que o fotógrafo deve fazer é treinar o olhar para encontrar uma perspectiva ou um enquadramento diferente, ou adicionar-lhe um motivo que estabeleça uma distinção em relação a outras fotografias. Pode ser pessoas - mas não se estiverem a posar para a câmara -, animais, um céu com nuvens particularmente interessantes, etc.
A técnica ajuda a despertar o interesse numa fotografia. Há regras que devem ser seguidas, ou pelo menos estar presentes na mente do fotógrafo quando dispara. Uma regra básica do enquadramento é a regra dos terços, que já referi neste blogue e para cujo texto remeto. Com efeito, uma fotografia cujo objecto surja no centro da imagem é uma fotografia estática e desinteressante. Do mesmo modo, o próprio formato da imagem pode contribuir para tornar a fotografia mais interessante. Fotografias quadradas são de evitar, a menos que a imagem preencha todo o enquadramento. Depois há uma miríade de outras regras quanto à composição e ao enquadramento: por exemplo, a fotografia deve ter um motivo principal, e este deve ser destacado, de modo a que os olhos se concentrem nele. Deve fugir-se da tentação de pôr todos os objectos no enquadramento, uma vez que não é desejável que existam objectos a competir pela atenção do espectador com o motivo que se quis fotografar. Depois há cuidados que se devem ter com a luz, a exposição e outros parâmetros que ajudam à composição, mas abordar estes aspectos obrigaria a um texto tão extenso que desafiaria a paciência do leitor.
Seguir estas regras é importante, mas mais importante ainda é ter um olhar atento. O fotógrafo deve ser capaz de olhar um objecto e adivinhar-lhe imediatamente as suas possibilidades fotográficas. Deve compor um enquadramento mentalmente, e só depois obtê-lo no visor da sua câmara. E deve, acima de tudo, ter em mente que as fotografias são para ser partilhadas, e que devem despertar o interesse de quem as vê. O simples facto de o motivo ser bonito, ou agradável, não chega, por si só, para tornar a fotografia interessante. Devem procurar-se motivos únicos, originais, ou, quando se fotografam motivos conhecidos, deve tentar-se mostrá-los de uma maneira diferente. Este é o segredo mais mal guardado da fotografia...   

sábado, 24 de setembro de 2011

Conselho n.º 4: fazer tudo à mão

O conselho que vou dar de seguida pode ser interpretado por alguns como uma bizarria ou uma excentricidade, mas estou plenamente convicto, pelo que a experiência me mostrou, da sua validade: usem a focagem manual. Não digo que a usem sempre, em todas as ocasiões, mas procurem usá-la sempre que for possível ou prático fazê-lo. Vão ficar surpreendidos com o que se pode aprender focando manualmente.
O domínio da focagem manual fez-me compreender melhor o uso da abertura e um conceito importantíssimo em fotografia: a profundidade de campo. Os mais afortunados de entre vós terão uma lente com um pequeno visor na base, ou mesmo com alguns algarismos e marcações junto ao anel de focagem; estas informações não estão ali apenas para dar um aspecto mais sofisticado e complexo à câmara: são escalas de distância. Servem para determinar (manualmente) a profundidade de campo ideal mediante uma dada abertura. Usando-as, é possível determinar a focagem mesmo sem olhar para o visor ou ecrã. Acreditem se quiserem: não há melhor maneira de aprender fotografia que usar a focagem manual.
Nem sempre o ideal é manter tudo em foco: por vezes é desejável usar uma focagem um pouco menos que perfeita para obter um determinado efeito, como na fotografia acima. Ora, o sistema de focagem da câmara tende a obter a maior nitidez possível ao longo da imagem, e só a focagem manual pode contrariar essa tendência irritante da câmara para nos mostrar que sabe mais do que nós sobre fotografia e ela é que decide como a focagem vai ficar. Aprender a focar manualmente é mais um passo na emancipação do fotógrafo em relação à autoridade do fotómetro...
Não é apenas para efeitos didácticos, nem para se dizer que se é um grande fotógrafo porque se sabe fazer tudo à mão, que é importante saber focar manualmente. Embora se possa sentir que a focagem manual é completamente desnecessária, uma vez que a câmara trata do assunto por nós, a verdade é que há casos em que a câmara não consegue focar automaticamente. Quando não há contraste suficiente no motivo, ou quando a luz é demasiado escassa, a focagem automática pode falhar rotundamente.
Talvez seja interessante saber como é que a câmara foca. Há dois sistemas de focagem automática: a detecção de fase e a detecção de contraste. Algumas DSLR têm os dois, usando a detecção de fase quando se visualiza a imagem pelo visor e a detecção de contraste quando a função mirror lock é accionada, mas as compactas e as câmaras mirrorless apenas focam por detecção de contraste. Até há pouco, a detecção de fase era mais rápida, embora menos precisa, mas algumas mirrorless já conseguem velocidades de focagem comparáveis ou superiores. A detecção de fase é processada separando e analisando a luz que penetra na lente, através de dois captadores que comparam cada um dos fluxos de luz que detectam e estabelecem a focagem de acordo com a diferença de fase entre os dois feixes de luz comparados. A detecção de contraste é feita pelo fotómetro, que selecciona um ponto da imagem na qual exista um contraste nítido (ponto que pode ser determinado pelo fotógrafo ou pela própria câmara). Ora, nos casos em que não existam diferenças notórias de fase entre os feixes analisados, ou quando o motivo não tem contraste suficiente, a câmara não consegue focar: a lente fica a mover-se para trás e para a frente à procura de um ponto onde possa focar, para depois desistir de focar e recusar-se teimosamente a fotografar, apesar da nossa insistência. Isto pode ser frustrante. Neste tipo de casos, se estivermos mesmo com vontade do fotografar o que a câmara não consegue captar, há um truque que vem nos manuais e que pode ser usado: apontar a um motivo fora do enquadramento que a câmara aceite focar, carregar no botão de disparo até meio para obter a confirmação da focagem e depois mover a câmara de novo para o enquadramento e disparar. Na teoria funciona, mas a exposição pode resultar completamente diferente daquilo que queríamos, por vezes com resultados decepcionantes. Se não queremos desistir daquele motivo (por ex. uma ave branca na água cheia de reflexos do sol, ou um motivo negro sobre um fundo também negro), a única solução que nos resta é a focagem manual.
Aprender a focar manualmente não é difícil: basta rodar o anel de focagem até a imagem surgir nítida. Algumas câmaras têm até uma função que amplia uma porção da imagem, para que a focagem seja precisa. Focar manualmente apenas requer um pouco de tempo e de prática. No fim, quando dominarem a técnica, pode até acontecer-vos o mesmo que a mim: depois de ter aprendido a focar manualmente, não quero outra coisa!

Conselho n.º 3: comecem no modo P

Este foi um conselho que já dei antes, embora então não tivesse feito um texto dedicado ao tema. Esqueçam o modo AUTO e os modos SCN (macro, paisagem, fotografia nocturna e essas coisas todas). A primeira coisa que devem fazer, quando puserem as mãos numa câmara avançada, é começar desde logo a compreender a exposição. O modo P não é ainda o ideal para obter total controlo da exposição, mas é um bom primeiro passo: é possível tirar fotografias fantásticas em P. E é útil em circunstâncias nas quais não há tempo para regular a velocidade do disparo e a abertura, como por ex. na fotografia de rua. Os modos avançados não são excludentes: não há uma progressão de P para A, deste para S e de S para M. Cada um destes modos serve funções diferentes: o P serve para termos uma exposição determinada automaticamente, mas com algum controlo, que é obtido usando a compensação de exposição e o equilíbrio dos brancos. O modo A é usado quando queremos tirar fotografias em que a escolha da abertura é determinante - por ex. quando queremos usar a focagem selectiva -, o S quando precisamos de usar velocidades de disparo particularmente rápidas ou lentas e o M quando queremos (e podemos) regular tudo à mão.
Apenas uma nota para referir que esta minha insistência na necessidade de compreender a câmara e como ela funciona não tem que ver com tecnicismo. Se repararem no canto superior direito da página, verão uma citação de Henri Cartier-Bresson: «A técnica é importante, mas apenas no sentido em que tem de ser dominada para que se comunique o que se vê... Seja como for, as pessoas preocupam-se demasiado com a técnica e não se preocupam o suficiente com ver.» O domínio da técnica não é, decerto, tão importante como ter uma boa ideia para uma fotografia, mas abre caminhos à criatividade. Daí a sua importância. Hoje mostrei as fotografias do meu Flickr a alguém, que ficou impressionado pelo que entendeu ser a minha evolução nas últimas semanas. Pois bem, essa evolução deu-se graças às lentes de controlo manual que uso desde há um mês. Dominar a técnica permite fotografar melhor. E este blogue não é para quem se satisfaz com apontar e disparar: esses poderão achar tudo isto uma seca. É para partilhar o meu entusiasmo e os conhecimentos que fui adquirindo - embora com a falta se solidez que caracteriza o autodidactismo - ao longo deste tempo que tenho dedicado à fotografia.

A guerra das mirrorless

Quando pus os olhos pela primeira vez na Olympus E-P1, imaginei que ela prefigurasse o futuro da fotografia: uma câmara pequena e cheia de estilo, mas com uma qualidade de imagem mais que aceitável e a possibilidade de trocar de lentes conforme a intenção do fotógrafo. Tudo isto me parecia fazer sentido; a clientela do mercado da fotografia que imaginei nesse momento compor-se-ia, para além das multidões que usam compactas e telemóveis para fotografar, de fotógrafos amadores desejosos de fazer boas fotografias sem terem de carregar vários quilogramas de equipamento, aos quais as câmaras como a E-P1 ou as Panasonic G e GH se destinariam, e, no cume da pirâmide, fotógrafos seriamente interessados e profissionais que continuariam a usar as suas DSLRs e câmaras de médio formato, mas que teriam as câmaras «sem espelho» de topo como alternativa. Haveria um mercado para todos, o sonho de qualquer pessoa que acredite nas virtudes da livre concorrência.
Infelizmente, a evolução não foi exactamente a que eu imaginei. Os fotógrafos a sério continuam a ter as suas DSLRs e médios formatos, mas o mercado e os fabricantes acabaram por assimilar as mirrorless às compactas. Câmaras como as Olympus Pen, as Panasonic G, GF e GH, as Sony NEX ou as Samsung NX são vistas pelos consumidores como compactas. É provável que 98% destas câmaras acabem por ser compradas por pessoas que nem sequer sabem que se pode mudar as lentes das suas câmaras - quanto mais usar modos de exposição avançados.
O que é uma pena, porque está a determinar uma evolução perversa nestas câmaras: a Olympus Pen Mini e a Panasonic GF3 são câmaras para adolescentes japonesas que as compram para fazer conjunto com as suas bolsas Hello Kitty; as Sony NEX são para tarados da tecnologia que não percebem nada de fotografia, e as Samsung são para ser compradas por coreanos tristes e solitários que habitam os subúrbios de Seul. E agora, para acentuar ainda mais o descrédito das mirrorless junto dos fotógrafos entendidos, a Nikon lançou a série 1, composta por duas câmaras cujo conceito está mais próximo das compactas do que das DSLR. E há ainda o caso da Pentax Q, que junta à falta de qualidade da imagem um preço absolutamente injustificado.
Grande parte da culpa desta evolução tem de ser imputada a um núcleo de entusiastas da fotografia que, do alto dos seus sites e blogues e brandindo os seus sacos pejados de lentes mastodônticas e várias DSLRs, trataram de opinar negativamente sobre as câmaras do formato Micro Quatro Terços: que o sensor isto, que a focagem automática aquilo, que não têm visor óptico, e renhanhã, renhanhã... estes fotógrafos não são profissionais, nem fazem parte de nenhum lobby, mas é a eles que os decisores do mercado dão ouvidos. Isto contribuiu para castrar as possibilidades de desenvolvimento das mirrorless para algo sério, relegando-as para uma categoria de supercompactas para que nenhum fotógrafo que se preze se digna sequer olhar - ou, se olha, é com uma condescendência desdenhosa, qualquer coisa como «Ah, faz boas fotografias... para uma compacta, não está mal». Isto serve às mil maravilhas o duopólio Canon/Nikon, que partilha entre si a fatia mais importante do mercado das câmaras de lentes amovíveis. As Nikon 1 não são mais que a expressão deste entendimento das mirrorless como compactas para gente endinheirada que adora impressionar com os seus gadgets caros.
A diversidade das mirrorless também não ajuda. Em lugar de acordarem num determinado tipo ou tamanho de sensor, à semelhança do que aconteceu com o formato 35mm nos dias da fotografia analógica e com os sensores APS-C das reflex, as marcas decidiram seguir cada uma o seu caminho: a Panasonic e a Olympus aproveitaram o formato 4/3, a Sony, a Samsung e a Fuji optaram pelos sensores APS-C, a Pentax por um sensor de compacta e a Nikon por um que é pouco maior que o das câmaras compactas. Isto levou a que fosse impossível desenvolver um standard que concorresse, em termos de qualidade de imagem, com as DSLR. Quando a Canon lançar a sua mirrorless (parece que é já em Novembro), será, com toda a probabilidade, uma câmara conceptualmente mais próxima das compactas do que das DSLR.
Nesta guerra toda, que mete tamanhos de sensores, fotografias tiradas antes de disparar o obturador e outros disparates destinados a impressionar patetas, quem sai ganhador? As DSLR. Porque vão ser sempre tidas como a referência em qualidade de imagem, contra as quais as «supercompactas» não têm a menor hipótese. Ou pelo menos é assim que o duopólio Canon/Nikon quer que pensemos. Contudo, se olharmos para as mirrorless isoladamente, vemos que algumas destas câmaras têm padrões de qualidade de imagem bastante elevados, que, se não fosse a evolução do mercado a que aludi e a falta de concertação quanto a um formato de sensor, poderiam ser bem apelativas para muitos fotógrafos amadores que gostariam de ter uma câmara mais manuseável que uma DSLR. Quando fotografo com a minha E-P1 e as lentes da série OM, obtenho padrões de qualidade de imagem que não ficam atrás de fotografias obtidas com câmaras DSLR. As câmaras Micro Quatro Terços parecem-me ser a proposta mais equilibrada de todas as mirrorless actualmente no mercado; podem sacrificar um pouco de qualidade de imagem - é inegável que o ruído compromete algumas fotografias -, mas trazem três importantes benefícios: a portabilidade, a discrição e lentes pequenas e económicas, mas de muito alta qualidade. Algo que a Samsung, a Sony e a Fuji não podem fazer e que a Nikon e a Pentax não vão conseguir atingir com os seus sensores minúsculos. Acresce que o Micro Quatro Terços tem ainda a vantagem concorrencial de um portfolio de lentes muito amplo e de ter já fabricantes externos à Panasonic e à Olympus a produzir lentes e acessórios específicos para este formato.
O ideal seria que o formato Micro Quatro Terços pudesse tornar-se num standard adoptado por outras marcas, o que traria uma evolução que permitiria, eventualmente, acabar com o domínio da Canon e da Nikon no segmento das boas câmaras. Bastaria, para que isso acontecesse, que os visores electrónicos continuassem a evoluir e que os sensores se libertassem do nível de ruído produzido a sensibilidades elevadas. Contudo, não me parece que isso vá acontecer. O mais provável é que venham a proliferar câmaras cor-de-rosa, cada vez mais pequenas e vendidas com uma lente que o comprador nunca se dará à maçada de substituir. Espero, contudo, que o nicho actualmente ocupado pela E-P3 e pela Panasonic GH2 não desapareça - porque, se isso acontecer, a única opção para quem se interessa seriamente por fotografia será entre uma DSLR da Canon... ou da Nikon.
Está bom de ver que a livre concorrência não assegura liberdade de escolha... 

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Uma lente superlativa

As minhas primeiras impressões acerca da G.Zuiko OM 50mm/f1.4 foram hoje confirmadas com as primeiras fotografias sérias que fiz com ela, das quais vos mostro três exemplares. Esta é uma lente de qualidade absolutamente soberba, e já não me suscitam quaisquer reservas as opiniões segundo as quais as lentes OM estão entre as melhores do mundo. É uma lente desprovida de aberrações, de uma construção imaculada e capaz de imagens belíssimas.
Pensando um pouco, é também uma proeza tecnológica: uma teleobjectiva com uma abertura incrível e extremamente compacta não é fácil, nem barata de produzir. Que a Olympus tenha conseguido fabricar lentes desta qualidade num formato tão pequeno (embora seja uma lente substancial e pesada) é um testemunho da mestria em ópticas da marca. Que tenha adquirido esta lente nos dias de hoje, com uma qualidade intacta, também o é. E não - não vou revelar quanto paguei por ela. Só vos posso dizer que foi menos de metade do que teria pago se comprasse a lente digital 45mm/f1.8, que é um pouco menos luminosa, substancialmente maior e feita de plástico. Um bom negócio, mesmo sem focagem automática e com o custo adicional do adaptador (que foi amortizado com a compra desta que é a minha segunda OM).
A lente é composta por sete elementos em seis grupos, com um diafragma de oito lâminas (e não de seis, como é a norma), focagem manual e regulação da abertura na própria lente, num aro que a circunda, em oito stops: f1.4, f2.0, f2.8, f4, f5.6, f8, f11 e f16. Como toda a boa lente dos anos 80 que se preze, tem um calculador de profundidade de campo na sua base. A lente foca desde 45 cm até ao infinito, o que é, desde logo, uma vantagem substancial em relação à minha teleobjectiva 40-150, que obriga a uma distância mínima de 70 cm.
Montada na E-P1 com o adaptador, esta lente confere à câmara um ar sério de máquina profissional, embora seja ainda suficientemente compacta para não se tornar desproporcionada. Tal como a irmã 28mm/f3.5, esta é uma lente que dá prazer manejar: os comandos são precisos, nunca deixando qualquer sensação de folga ou construção deficiente.
Mas chega de técnica. A qualidade de imagem é simplesmente soberba. Contudo, eu não usaria a abertura máxima com muita frequência - a menos que tivesse de fotografar quase sem luz. Esta é uma lente que, pela sua luminosidade, torna o flash redundante, mas o uso da abertura f1.4 torna as cores desbotadas e a imagem plana. Aumentar a velocidade do disparo não melhora a imagem, apenas a torna mais escura por todo. A partir de f2.0, porém, as coisas começam a tornar-se interessantes: a lente tem uma profundidade de campo extremamente reduzida, o que a torna numa objectiva extremamente capaz para obter fundos desfocados e para focagens selectivas. É espantoso o que se consegue fazer com esta lente: o bokeh é simplesmente excelente, como ainda não tinha conseguido obter com qualquer das outras lentes: as formas desvanecem, deixando apenas cores suaves e diluídas. Sem dúvida que a abertura octogonal contribui para esta qualidade. A focagem do motivo desejado é incrivelmente simples e precisa, não deixando dúvidas quanto à nitidez. A reprodução das cores é belíssima, apenas sendo de ressalvar que a abertura máxima pode prejudicá-las ao produzir sobreexposição, roubando-lhes vivacidade e relevo. Fora esta advertência, as cores que esta lente capta são tipicamente Olympus: saturadas, mas não em demasia, e muito naturais e fiéis à realidade. E, sobretudo, é uma lente rápida, como já havia referido no texto anterior. Dei por mim a fotografar a mais de 1/500 num fim de tarde nublado! 
Esta é, pois, uma lente superlativa, ideal para grandes planos - embora não seja uma macro - e, sem dúvida, para retratos (uma modalidade a que ainda não me dediquei). O único lamento quanto a esta lente é não ter uma câmara que tire ainda melhor partido do seu potencial em termos de qualidade de imagem. Por muito boa que seja a E-P1, fico sempre com a sensação de que a câmara é o limite à qualidade das imagens a que esta lente pode aceder.  

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Entretanto...

Hoje perdi a cabeça e comprei uma lente. Mais uma Olympus da série OM, de focagem e regulação da abertura manuais. Desta vez comprei a 50mm/f1.4, uma lente de distância focal fixa (prime). Já a experimentei, mas não tive tempo de sair e fotografar fora de casa, pelo que ainda não tenho fotografias apresentáveis para mostrar. Já posso, contudo, tirar algumas conclusões. Antes de mais, é uma lente de enorme qualidade de construção: tirando o vidro dos elementos da lente e a borracha que envolve o anel de focagem, é toda feita de metal. Os comandos respondem de forma irrepreensível, transmitindo uma sensação de precisão notável numa lente que pode ter cerca de trinta anos. 
Como se poderia esperar de uma abertura tão ampla, é uma lente extremamente rápida: a sua luminosidade permite utilizar velocidades de disparo muito altas, o que a torna ideal para fotografar com pouca luz ambiente. É também uma lente com uma profundidade de campo extremamente reduzida, o que significa que me vou divertir com a focagem selectiva: esta é uma daquelas lentes com as quais se consegue obter planos de fundo completamente esbatidos. Já sei que vou passar muito tempo no Jardim Botânico a fotografar flores!
Com 50mm de distância focal (que na minha câmara equivale a 100mm), esta lente é já uma teleobjectiva. Serve para comprimir perspectivas e fotografar a uma certa distância, o que, conjuntamente com a baixa profundidade de campo, a torna ideal para retratos e fotografias de grandes planos. Depois eu dou-vos notícias; quando tiver tempo para a experimentar a sério, relato-vos as minhas impressões, já devidamente documentadas com fotografias.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Conselho n.º 2: compreender a câmara (continuação)

5. O modo M

O modo M, inicial de manual, é o cume da evolução do fotógrafo; é a sua emancipação em relação à câmara e ao fotómetro. Neste modo, tudo está sob controlo do fotógrafo: é ele quem regula a exposição, controlando a abertura e a velocidade do disparo. Apenas a compensação de exposição está fora dos comandos controláveis pelo fotógrafo, uma vez que é desnecessária: o excesso ou deficiência de exposição são corrigidos aumentando ou diminuindo manualmente a velocidade do disparo ou a abertura.
Quem leu os textos anteriores com atenção recordar-se-á, decerto, que a abertura, a velocidade do disparo e a sensibilidade ISO agem entre si numa relação de interdependência para determinar a exposição. No modo M tudo isto é feito pelo fotógrafo, o que pode, de início, deixá-lo com a sensação de que se encontra sozinho a contas com algo que não domina, mas é sempre possível ter uma pequena ajuda do fotómetro, uma vez que este está permanentemente em funcionamento, medindo a quantidade de luz, e a câmara indica sempre o valor da exposição em EVs. Esta é uma pequena batota que pode ajudar nos primeiros tempos, mas deve ser encarada como as rodas auxiliares de uma bicicleta, que se descartarão quando se adquirir o equilíbrio necessário. O domínio da técnica adquire-se por tentativa e erro - com a vantagem, no caso da fotografia, de não haver arranhões nem ossos partidos!
Dizia que a abertura, a velocidade do disparo e a sensibilidade ISO agem entre si numa relação de interdependência para determinar a exposição. Com efeito, quanto maior a abertura, maior poderá ser também a velocidade do disparo e menor a sensibilidade ISO; inversamente, aberturas diminutas requerem velocidades de disparo mais baixas e, se o objecto estiver em movimento, sensibilidades elevadas. Como regra de bolso, podemos memorizar que as aberturas grandes se usam para concentrar a focagem num motivo e as pequenas são empregues quando queremos que toda a imagem, desde o ponto mais próximo ao infinito, se mantenha nítida. Há, naturalmente, uma miríade de possibilidades entre estes dois extremos, mas é incrivelmente divertido descobrir as correlações entre a abertura e a velocidade do disparo e aprender a jogar com elas.
O modo manual tem também a vantagem de ser o único que garante que as fotografias saem como queremos; há algumas explicações maçadoras para que isto aconteça, nomeadamente os parâmetros de medição da luz, mas a verdade é que, nos modos de exposição automática (AUTO e P), a temperatura da cor e a luz raramente têm correspondência com aquilo que vemos a olho nu - especialmente no lusco-fusco e ao amanhecer. A câmara tende a compensar a escassez da luz com grandes aberturas ou velocidades de disparo reduzidas, assim aumentando a exposição, pelo que é frequente termos céus muito azuis quando o sol já desapareceu, ou céus brancos quando o sol já se está a pôr. Só no modo M é possível evitar estes efeitos e obter uma exposição correcta nestas circunstâncias, sendo que a compensação de exposição, embora útil, obscurece a imagem por todo, e não apenas na parte que queremos. Já exemplifiquei aqui o que se pode obter com o modo M, pelo que remeto para o texto correspondente e para os exemplos que ilustram o texto.
O M é o modo de eleição dos fotógrafos avançados, mas não significa que estes o usem em exclusividade. Os outros modos têm a sua pertinência: até o P é usado, por ex., quando se faz fotografia de rua, na qual não há tempo para regular a câmara. É que, se fotografarmos de um lado da rua com determinados valores de exposição, podemos descobrir que estes são completamente desajustados quando fotografarmos do outro lado, o que obriga a regular a câmara de novo, com a consequência óbvia de o enquadramento que queríamos ter desaparecido enquanto procurávamos os botões que regulam a abertura...
Também os modos A e S são frequentemente usados em circunstâncias especiais, como por ex. para fotografar com focagem selectiva ou captar motivos em movimento, respectivamente. Não se pode ter a pretensão de fotografar exclusivamente no modo manual. Posso assegurar-vos, contudo, que, quando aprenderem a usá-lo, raramente vão querer fotografar nos outros modos.

sábado, 17 de setembro de 2011

Conselho n.º 2: compreender a câmara (continuação)

4. O modo S

Os textos que aqui publico não têm a pretensão de formar um manual; muitos dos meus conhecimentos estão ainda incompletos, pelo que apenas me atrevo a escrever sobre aquilo que a minha curta experiência me diz ser correcto e cuja correcção pude comprovar repetidamente. No caso do modo S, de Shutter priority («prioridade ao disparador»), a minha experiência diz-me que este modo de exposição é apenas usado quando o motivo requer velocidades de disparo muito baixas ou muito altas, sendo pouco prático de usar em circunstâncias normais. Ao seleccionar S, estamos a deixar que a câmara escolha qual a abertura mais apropriada em função das condições de luz, bem como a sensibilidade ISO – se esta estiver programada para ser seleccionada automaticamente pelo fotómetro.
Vejamos o que se passa nestas circunstâncias: quando queremos fotografar à noite, ou ao lusco-fusco, importa que a exposição seja maior do que sob luz intensa. Quanto menos luz, menor deve ser a velocidade do disparo. Para que a exposição se prolongue, de maneira a que o sensor capte o máximo de luz possível, a velocidade de disparo deve ser reduzida, podendo ser necessário que a exposição dure alguns segundos. Há até um modo denominado Bulb, pelo qual o obturador permanece aberto durante períodos que podem ultrapassar os 30 segundos. O que pode levantar um problema se a intenção for captar objectos em movimento, caso em que não existe outra alternativa para além de aumentar a sensibilidade ISO - o que, como sabemos, tem um preço a pagar no incremento do ruído na imagem.
Já escrevi aqui sobre a fotografia nocturna, pelo que remeto para o respectivo texto. Além da necessidade de um tripé para fotografar à noite referida no texto anterior, importa ter em consideração a lente. Uma das maravilhas de ter uma DSLR ou uma câmara como as Olympus Pen (ditas «compactas de lentes intermutáveis») é a possibilidade de escolher a lente mais adequada para as condições em que se pretende fotografar. Para fotografar com pouca luz é fundamental que se usem lentes com aberturas grandes. Digamos qualquer coisa entre f2.0 - ou menos - e f3.5. Lentes com aberturas mínimas a partir de f3.5 são desaconselháveis, porque obrigam a que se empreguem velocidades de disparo demasiado lentas para compensar as fracas características de luminosidade da lente, o que pode não ser o mais adequado. O que significa, quase forçosamente, que se devem usar lentes grande-angulares, uma vez que as zoom tendem a ter aberturas reduzidas - e tanto mais quanto maior for a distância focal escolhida. Há excepções; há teleobjectivas com grandes aberturas, e outras cuja abertura é invariável seja qual for a distância focal, mas estas lentes são caríssimas.
O modo S não serve apenas para fotografar à noite: serve também para seleccionar velocidades de disparo altas em quaisquer outras condições de luminosidade, por exemplo para captar objectos em movimento. A velocidade escolhida deve ser directamente proporcional àquela com que o objecto se desloca. Nestas circunstâncias não é prático estar a seleccionar a melhor abertura, uma vez que se pode perder o momento ideal para fotografar; deixar a abertura ao critério da câmara é a melhor solução para obter bons resultados. Por outro lado, tentar fotografar estes objectos no modo P pode ser um fracasso, já que o fotómetro vai sempre demorar algum tempo a calcular a velocidade e a abertura ideais. Isto pode prejudicar a focagem, ou mesmo levar a que o objecto já não esteja lá quando a câmara finalmente se resolveu a disparar...
É possível fazer fotografias imensamente interessantes com recurso ao modo S: jogando com a velocidade do disparador, podemos obter fotografias em que se congela o motivo mas o plano de fundo é arrastado, parecendo estar em movimento, ou o efeito inverso. É também no modo S, escolhendo uma velocidade de disparo relativamente lenta e um valor ISO baixo, que se obtém o efeito de arrastamento dos motivos, que pode resultar em imagens espectaculares (ou, dependendo do ponto de vista, ser interpretado como inépcia do fotógrafo...). Este modo permite exercitar a criatividade do fotógrafo de uma maneira que é simplesmente impossível nos modos automáticos, que tendem sempre a escolher as regulações correctas para que a imagem resulte nítida. E a nitidez nem sempre é o que se pretende.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Conselho n.º 2: compreender a câmara (continuação)


3. O modo A

Por este comando, que nas Canon e Pentax é designado «Av» (Aperture value), o fotógrafo controla a abertura do diafragma e a câmara selecciona a velocidade de disparo mais adequada. A abertura é o modo de fazer variar a quantidade de luz que a lente deixa entrar no sensor. As lentes têm um diafragma, constituído por diversas lâminas, que controla a quantidade de luz captada contraindo ou expandindo as lâminas. A cada posição do diafragma corresponde um número designado por «número f». Quanto mais alto for este número, menor a abertura.
Uma vez que a fotografia é a captação de luz, a abertura é absolutamente determinante para a qualidade da imagem. É pelo controlo da abertura que se determina a quantidade de luz que chegará ao sensor, o que tem implicações não apenas na luminosidade da imagem, mas também na focagem e na profundidade de campo.
Determinar manualmente a abertura é algo que tem interesse em determinadas aplicações: podemos usá-la quando instalamos uma lente com comando manual da abertura, se quisermos que seja a câmara a decidir qual a velocidade do disparo mais adequada à abertura escolhida, ou quando pretendemos obter determinados efeitos jogando com a focagem.
Referi que a abertura tem implicações na focagem. Com efeito, a abertura determina-a da mesma maneira que nós usamos os olhos para ver objectos ao perto ou ao longe: abrimo-los o mais possível para ver nitidamente um objecto próximo e tendemos a semicerrá-los para observar algo distante. Com as lentes é a mesma coisa, uma vez que o diafragma simula a nossa íris, mas os efeitos de focagem e desfocagem são exacerbados, já que os nossos olhos tendem a ver com maior nitidez (pelo menos enquanto não perfizermos quarenta anos, altura em que começamos a frequentar o oftalmologista com mais assiduidade...).
Ora, quando conseguimos ver algo longínquo com nitidez, o que está entre os nossos olhos e o objecto tende a manter-se nítido; quando concentramos o olhar num objecto próximo, perdemos acuidade visual de tudo o que rodeia o objecto. A câmara e a lente comportam-se sensivelmente da mesma maneira. Se queremos manter tudo em foco, usamos uma abertura pequena e, se queremos focar apenas um determinado plano, escolhemos uma abertura maior. É isto que se designa por profundidade de campo.
Se repararem bem, as lentes contêm uma indicação quanto à distância coberta: por ex. 0.30-∞. Isto significa que a sua profundidade de campo vai da distância mínima em relação ao objecto (neste caso 30cm) até ao infinito, valor esse que se modifica conforme a abertura e a distância da lente em relação ao objecto. A profundidade de campo não é regulada por um comando - embora algumas lentes permitam calculá-la -, mas é determinada pela abertura e pela distância entre a câmara e o objecto. Uma profundidade de campo diminuta produz imagens desfocadas, ao passo que uma profundidade longa mantém todo o campo de visão nítido.
Exemplo de profundidade de campo reduzida: o fundo está, propositadamente, desfocado. A abertura usada para esta foto foi f4.2, próxima da abertura mínima da lente (4.0)
É o modo A que deve ser usado quando queremos usar a focagem selectiva, i. e. quando queremos destacar um objecto mantendo-o em foco e deixando que tudo o resto (não necessariamente apenas o plano de fundo) permaneça desfocado. Aquelas fotografias que vemos com um objecto perfeitamente em foco e o fundo desfocado são obtidas seleccionando uma grande abertura (a que corresponde um número f baixo), aproximando a câmara do objecto e focando sobre o motivo que se pretende manter nítido. É extremamente simples obter este efeito nos modos de exposição avançada, sendo os resultados superiores aos obtidos quando se selecciona o modo «Macro» da câmara.
Temos, deste modo, que a profundidade de campo depende do valor da abertura; daí que o controlo desta seja fundamental para obter a focagem desejada. Se optarmos por uma abertura ampla, a profundidade de campo reduz-se, ao passo que aberturas estreitas alongam a profundidade de campo.
Há algumas variáveis que importa considerar. Antes de mais, quanto menor a abertura, menor é a quantidade de luz, o que pode originar fotografias tremidas porque o fotómetro, para compensar a menor quantidade de luz captada, vai seleccionar uma velocidade de disparo reduzida. Aberturas estreitas podem tornar necessário o uso de um tripé.
Por outro lado, a resolução da imagem pode não ser a melhor quando se escolhem aberturas demasiado amplas ou diminutas. Por regra, a melhor resolução obtém-se nas aberturas intermédias (f5.6, f8, f11). Devem assim evitar-se os extremos mínimo e máximo da abertura.
Por fim, deve notar-se que existe uma relação proporcional entre a profundidade de campo e a distância focal da lente: quanto maior for esta, mais reduzida é a profundidade de campo. É mais simples obter nitidez ao longo de toda a imagem numa grande-angular de 50mm que numa teleobjectiva de 300mm. 

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Conselho n.º 2: compreender a câmara (continuação)

2. O modo P

Vimos, no texto anterior, que a exposição pode ser determinada pela câmara, mas a intervenção do fotógrafo é fundamental para que a fotografia corresponda melhor à sua intenção. Contudo, os modos de exposição avançados (PASM) não servem apenas para que o fotógrafo determine a exposição, como veremos melhor em textos posteriores; servem também para adequar a captação de luz a determinadas condições especiais.
Dos modos de exposição avançados, o mais simples de utilizar é o P. Já vimos que esta é a inicial de Programme («Programa»), fórmula abreviada para exposição automática programada. Este é o meu conselho n.º 3: quando começarem a fotografar com uma câmara evoluída, escolham sempre este modo. Esqueçam o AUTO e os modos pré-determinados de exposição: estes nem sempre produzem os efeitos anunciados, e é possível obter resultados melhores - muito melhores - nos modos de exposição avançados. A primeira coisa que devemos fazer, depois de ligar a câmara, é rodar o selector para o modo P. Este é o primeiro degrau da escada que leva ao domínio das técnicas fotográficas.
O modo de exposição automática programada significa que a câmara, através do fotómetro, vai determinar automaticamente os valores da exposição, regulando a abertura e a velocidade do disparo de acordo com a luz captada pelo sensor através da lente. O fotógrafo não tem de se preocupar com a regulação destes valores, o que o torna ideal para começar - desde que o fotógrafo o encare como o primeiro passo na compreensão da câmara, que lhe permite ir treinando as suas aptidões fotográficas, e não como um modo que torna os demais desnecessários. Com efeito, no modo P já é possível obter imagens de grande qualidade, pelo que o fotógrafo pode entender que não necessita de evoluir para os outros modos de exposição, mas pensar assim é um erro porque é possível fazer ainda melhor.
O modo P difere do automático (AUTO) por, apesar de a exposição ser definida automaticamente, permitir o acesso a três comandos importantes que influem na qualidade da imagem: a compensação de exposição, o equilíbrio de brancos e a sensibilidade ISO.
Quem leu os textos anteriores com atenção lembra-se, certamente, das noções de exposição referidas anteriormente. A exposição refere-se à quantidade e às características da luz captada pela câmara, dizendo-se, de uma fotografia demasiado clara - i. e. com excesso de luz -, que está sobreexposta, e que está subexposta quando a luz captada é escassa, produzindo uma imagem escurecida.
Embora o fotómetro determine com razoável precisão os parâmetros da exposição, os valores calculados podem não produzir o efeito desejado pelo fotógrafo. Uma exposição que é correcta pela medição do fotómetro pode não ter correspondência com a intenção do fotógrafo. Pode este querer um pouco mais de contraste, ou mais luminosidade. Acresce que a medição da luz é feita por parâmetros matriciais (embora possam ser seleccionados outros modos de medição), pelo que os valores da exposição são calculados de acordo com a forma como a luz se distribui pela imagem, o que pode resultar em fotografias com um contraste deficiente entre zonas de sombra e de luz. É para corrigir estes problemas da exposição que existe a compensação de exposição, que é accionada por um comando assinalado pelo símbolo +/- (ver imagem). A exposição pode ser corrigida em passos de 1 EV (iniciais de Exposure Value) ou fracções de 1/2 ou 1/3 EV: tipicamente, se rodarmos o comando para a esquerda, obteremos uma imagem com menos brilho, mais escura e contrastada, produzindo-se o efeito inverso - mais claridade - quando rodamos o comando para a direita. (Nalgumas câmaras a compensação de exposição é accionada por um comando circular, noutras por botões.) Normalmente basta 1/2 ou 1/3 EV para se obter o resultado pretendido, a menos que se pretendam imagens muito low-key ou banhadas em luz. Note-se, porém, que a compensação de exposição age sobre toda a imagem, não servindo para corrigir contrastes excessivos entre luz e sombra: para corrigir isto tem de se usar uma função avançada, que é a do controlo do modo de medição.
O equilíbrio dos brancos (WB - White Balance) serve para adaptar a tonalidade da imagem a diferentes condições de luminosidade. O branco é a fundação das cores - ou, mais correctamente, a soma de todas elas -, e a forma como a luz afecta a sua tonalidade determina a das demais cores e a tonalidade geral da imagem. O branco, tal como as demais cores, não tem a mesma tonalidade debaixo de diferentes condições de luz: as cores que a câmara capta não são idênticas debaixo da luz solar ou dentro de um quarto iluminado por uma lâmpada de tungsténio. O equilíbrio dos brancos ajusta as cores às condições de luz, modificando os valores Kelvin de temperatura da cor e adaptando a exposição em conformidade. A câmara oferece valores Kelvin pré-definidos para diferentes condições de luz: Luz Solar, Nublado, Sombra, Tungsténio, Fosforescente (incluindo diferentes regulações) e Flash. O equilíbrio dos brancos pode ser deixado ao critério da câmara, deixando em «auto», ou pode ser configurado pelo próprio fotógrafo, mas esta última possibilidade já implica conhecimentos extremamente avançados e o uso de acessórios que tocam o esoterismo...
Exemplo de ruído na imagem
O modo P permite subtrair a regulação da sensibilidade do sensor à luz ao controlo da câmara, o que é de extrema importância. O aumento da sensibilidade (ISO) permite que o sensor capture mais luz, o que tem o benefício de poder usar velocidades de disparo mais altas em condições de pouca luz, o que facilita a captação de imagens em movimento nessas circunstâncias. Se quisermos fotografar, por ex., um automóvel em marcha durante a noite, precisamos de uma velocidade de disparo rápida, uma vez que, se usarmos velocidades menores, surge um efeito de arrastamento das luzes do veículo e este aparece desfocado. Simplesmente, aumentar a velocidade de obturação reduz a exposição, o que resulta em fotografias subexpostas. Aumentando a sensibilidade consegue-se capturar o motivo focado e sem o efeito de arrastamento, mas o uso de valores ISO elevados tem a sua contrapartida no aumento de ruído da imagem, que confere um aspecto granuloso à fotografia que, se for muito pronunciado, pode destruir a imagem.
O modo P ainda não é aquele em que o fotógrafo assume o comando, mas deixa-lhe a possibilidade de regular parâmetros importantes da exposição. Como mencionei, é este - e não o modo totalmente automático AUTO - com que se deve começar a fotografar. 

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Conselho n.º 2: compreender a câmara (continuação)


1. Os comandos da câmara: introdução

Decerto que a primeira reacção do neófito ao ver uma câmara evoluída será o de se interrogar: para que serve esta parafernália de botões? 
Não nos deixemos intimidar. Os botões importantes para começar a explorar a câmara são três; os demais podem ser descobertos mais tarde, gradativamente, à medida que o utilizador se vai familiarizando com a câmara. Nesta fase exploratória, os três botões que se devem descobrir - não é muito difícil... - são o interruptor ON/OFF, o botão de disparo e o selector de modos de exposição, todos eles situados na parte superior da câmara. Quanto aos dois primeiros, não há nada de especial a dizer: um serve para ligar ou desligar a câmara, o outro para disparar. Ressalvada a necessidade de, uma vez escolhido o objecto e o seu enquadramento, premir o botão do disparador apenas até meio para que a câmara foque o motivo, e só premir completamente depois da confirmação da focagem (isto pode parecer redundante, mas já vi fotografias desfocadas por não se observar este procedimento), não há nada de especial a assinalar quanto a estes comandos.
O selector de modos de exposição é bem mais complexo de compreender. Tipicamente, este selector é um disco rotativo situado na parte superior da câmara (semelhante ao da imagem acima) e tem marcadas diversas posições: AUTO, P, A, S, M, SCN. Alguns têm desenhos, como uma câmara de vídeo e uma série de ícones referentes aos modos «fáceis» de exposição. O meu conselho, a quem queira realmente tirar partido do investimento que fez com a câmara, é o de simplesmente ignorar estes modos «fáceis» e o modo AUTO. Estes são comandos para gente preguiçosa, não para fotógrafos. Com eles, quem está a tirar fotografias não é o fotógrafo, mas a câmara, que se substitui ao primeiro na escolha dos valores de exposição, que por seu turno são aqueles que o fotómetro entende serem os mais correctos - mas que podem não coincidir com a fotografia que o fotógrafo queria realmente obter. Para se manusear uma câmara de acordo com a intenção criativa do fotógrafo, os únicos modos de exposição que interessam são os que surgem no selector assinalados como P, A, S e M - ou, nas Canon e Pentax, P, Av, Tv e M. O resto é para quem teve uma câmara compacta e quer evitar o sobreaquecimento dos neurónios.
Esqueçamos, deste modo, os comandos redundantes e concentremo-nos naqueles que permitem ao fotógrafo ser ele a determinar os valores da exposição - e, consequentemente, a obter as fotografias que quer, e não as impostas pela câmara. Vejamos, de maneira sistemática, quais são estes comandos, conhecidos na gíria fotográfica por PASM:
  • No comando P, esta letra é a inicial de Programme (ou Program), que por seu turno é a abreviatura de Programmed Automatic Exposure («exposição automática programada»); 
  • A é a inicial de Abertura (Aperture), abreviação de «prioridade à abertura» (Aperture priority) (*);
  • S é a primeira letra do vocábulo Shutter, que literalmente significa «disparador», representando a expressão Shutter priority («prioridade ao disparo») (**);
  • M representa Manual, de Manual exposure («exposição manual»).
Nos próximos textos analisaremos o que são estes comandos, em que circunstâncias devem ser usados e quais as suas vantagens e inconvenientes.

(*)(**) Nas Canon e Pentax, A é substituído por Av (Aperture value) e S por Tv (Time value).

Conselho n.º 2: compreender a câmara

Agora que já tem uma câmara decente, o leitor deste blogue pode começar a tentar entender-se com ela. Nada melhor, para poder familiarizar-se rapidamente com a câmara, que a leitura atenta do manual de instruções. Pode parecer penoso, ou mesmo assustador, perante a quantidade inesgotável de termos e funções de que nunca ouvimos falar, mas fotografar com uma boa câmara é mais simples do que a consulta do manual de instruções pode sugerir. O processo de aprendizagem da operação de uma câmara é longo, e por vezes podemos sentir-nos derrotados pela dificuldade em apreender todos os seus controlos, mas já referi aqui que o prazer de fotografar aumenta à medida que vamos dominando a técnica, pelo que vale a pena.
Para compreender o que uma câmara faz - o que permitirá entender melhor a forma como ela opera - convém ter algumas noções básicas sobre a fotografia antes de fotografar. A câmara é um aparelho que reproduz imagens através da captação de luz. Já o era quando foi inventada por Joseph Nicéphore Niépce, foi assim nos tempos de Daguerre, continuou a sê-lo quando inventaram as SLR e assim é com as câmaras digitais. Não há outra maneira de fazer fotografia. As câmaras de hoje continuam a captar a luz através de um sistema de lentes e a registar a luz, por acção de um obturador, num suporte fotossensível - tal como quando foram inventadas. A única diferença, neste processo, é que hoje se usam chips em lugar de películas. Este registo da luz dá-se quando o fluxo que alimenta o sensor (ou filme) é captado por intermédio de uma peça de nome obturador, cuja acção pode ser mais ou menos longa, dependendo do tempo de exposição.
À quantidade de luz, e suas características, chama-se exposição. É o controlo da exposição que determina a qualidade da imagem. De uma fotografia demasiado clara - i. e. com demasiada luz - diz-se que está sobreexposta; no caso inverso, diz-se que está subexposta. O controlo da quantidade de luz é feito por um aparelho óptico denominado fotómetro, que está permanentemente em funcionamento e mede os valores da exposição, determinando esta última para a obtenção de uma exposição equilibrada - embora a sua acção possa ser mitigada, ou mesmo inteiramente suprimida pelo fotógrafo através dos modos de exposição avançados.
Antes de mais - o que são os valores da exposição? São os valores que vão determinar a aparência da imagem, através do controlo da luz. São três: a abertura, a velocidade do obturador e a sensibilidade do sensor.
A abertura determina a quantidade de luz que vai entrar na câmara através da lente. Já vimos que é aumentada ou diminuída através de um conjunto de lâminas que formam um orifício que pode ser mais largo ou ou mais estreito, conforme as necessidades da exposição. Não há uma regra básica quanto à abertura: dizer-se que esta deve ser maior quando há menos luz e menor debaixo de luz abundante é apenas parcialmente verdadeiro. A abertura conjuga-se com os outros valores para determinar a exposição desejável. A maior influência da abertura é na focagem, como escrevi aqui e aqui. A abertura mede-se em números, denominados pela letra f, que variam na proporção inversa da abertura das lâminas da lente: quanto mais fechadas estas, maior é o número f, e vice-versa. Por exemplo, numa lente com aberturas entre f2 e f18 - estes números podem ser encontrados na parte frontal da lente -, o primeiro valor refere-se à abertura maior e o outro à menor. Confuso? Neste caso basta pensar no número f como uma fracção e escrever f=1/2 em lugar de f2, ou f=1/18 em lugar de f18 para que tudo faça sentido. Só por simplicidade é que o valor da abertura se exprime em números inteiros.
A velocidade do obturador, ou velocidade do disparo, é a medida do tempo durante o qual a luz vai ser registada no sensor ou no filme. Quanto menos luz existir, menor terá de ser a velocidade do disparo, porque o sensor vai precisar de captar o máximo de luz disponível para obter imagens nítidas. Inversamente, quanto mais luz houver, mais elevada será a velocidade do disparo. Também aqui esta regra peca pelo excesso de simplicidade, porque a velocidade do disparo conjuga-se com a abertura para obter a exposição ideal.
Por fim, a sensibilidade do sensor é a quantidade de luz que este consegue captar. Este valor é denominado por ISO (que é a sigla da Organização Internacional para a Normalização), e pode ser regulado para valores que vão, tipicamente, desde os 80 ou 100 a 6400 ou 12800. O ISO tem um papel fundamental na exposição, permitindo obter velocidades de disparo mais rápidas em condições de pouca luz, mas o seu incremento tem, como o leitor mais atento deste blogue o sabe, uma contrapartida indesejável: o surgimento de ruído na imagem. E o ruído é algo de insidioso: pode não se dar pela sua presença numa imagem thumbnail, mas, quando esta é ampliada, descobre-se que está arruinada pelo excesso de ruído. Daí que o valor da sensibilidade ISO deva ser sempre o menor possível.
No próximo post começaremos a ver como se controlam estes valores na câmara, dando desde já por adquirido que estes conhecimentos são imprescindíveis para compreender como funciona uma câmara e para que sejamos nós, e não a câmara ou o fotómetro, quem tira as fotografias.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Conselho n.º 1: o equipamento

Um principiante a dar conselhos a outros principiantes pode ser o caminho para um desastre; o que vou escrever nos próximos textos é apenas um conjunto de sugestões baseadas na minha própria experiência, que não é necessariamente idêntica à dos leitores ou à de outros fotógrafos, pelo que deve ser lido com um grão de sal. Cum grano salis, como diziam os antigos. Não tenho a experiência de um fotógrafo com décadas de fotografia e material de ponta, nem sequer tenho um curso de fotografia; o que vou escrever é mais uma forma de evitar que os leitores caiam nos meus erros, e de partilhar os conhecimentos em que me sinto seguro, do que uma tentativa de escrever um manual de fotografia.
A primeira coisa que nos devemos certificar, antes de tomarmos a decisão de adquirir uma câmara, é se temos jeito para fotografar. Se não tivermos, gastar dinheiro em material de qualidade não será mais que um desperdício. Seria como comprar um Steinway quando só sabemos tocar os Martelinhos e não temos intenção de aprender mais. O que vou escrever de seguida apenas se aplica a quem tiver um interesse verdadeiramente sério pela fotografia e tenha vontade de desenvolver a percepção visual dos objectos que o rodeiam; para os demais, o telemóvel é mais que suficiente. Desculpem se pareço presunçoso, mas as coisas são mesmo assim. Ninguém compra um Ferrari para ir de casa para o trabalho (e vice-versa) e levar os miúdos à escola: tal seria um desperdício estúpido.
Depois desta introdução, o conselho com que quero começar é o seguinte: COMPREM A MELHOR CÂMARA E LENTE QUE PUDEREM. (Não, não accionei o caps lock por engano: isto é mesmo importante.) Quando decidi começar a fotografar, em finais de Julho do ano passado, cometi um erro do qual me arrependi ao fim de apenas dois meses: comprei uma câmara compacta. Imaginei que deveria evoluir progressivamente, passando da compacta para uma câmara intermédia se sentisse essa necessidade, para só mais tarde adquirir uma câmara de qualidade, quando confirmasse que era capaz de tirar boas fotografias. Foi um erro: ao fim de algum tempo a compacta já era um obstáculo. As compactas não são versáteis, apesar de anunciarem valores de zoom astronómicos e funções XPTO. A lente das compactas gera aberrações lamentáveis, como um nível assustador de distorção da imagem, e o sensor produz uma quantidade horrenda de ruído em imagens captadas com pouca luz. Acresce que a resolução das imagens destas câmaras é apenas sofrível, dependendo de condições de luz óptimas. Não se deixem enganar pelas bridge, aquelas câmaras de lente fixa que parecem DSLRs mas que são, na verdade, câmaras compactas que sofrem dos mesmos problemas. O melhor é começar com uma boa câmara e ir progressivamente aprendendo a tirar o melhor partido das suas funcionalidades. Sei que uma boa DSLR pode parecer intimidante, e de facto estas câmaras são de uma enorme complexidade técnica, mas a verdade é que muitas câmaras de acesso incluem aplicações que instruem o proprietário com indicações sobre a melhor exposição e quais as funções que pode usar para obter as fotografias que pretende. A Nikon D3100 e as Olympus Pen mais recentes têm estas aplicações, denominadas, respectivamente, Guide Mode e Live Guide. Esta é uma boa maneira de começar a perder o temor reverencial pela câmara.
As minhas sugestões para quem quiser comprar uma boa câmara:
  • Canon 1100D: boa qualidade de imagem, mas pouco ergonómica para quem tiver mãos grandes, o que pode ser inconveniente. Qualidade de construção melhorável;
  • Nikon D3100: ligeiramente inferior à Canon em qualidade da imagem; aconselhável apenas a quem se propuser usar o Photoshop;
  • Pentax K-r: uma excelente câmara que dá acesso às lendárias lentes Pentax SMC - desde que não se importem com o facto de ser alimentada por pilhas, e não por bateria;
  • Olympus Pen E-P3: cara - pelo menos por agora -, mas a melhor na sua categoria. Oferece virtualmente o mesmo que as anteriores, mas num corpo compacto. Não é a mais indicada para fotografia nocturna. 
Qualquer destas câmaras assegurará uma excelente qualidade de imagem e o acesso a funções avançadas de controlo da exposição pelo fotógrafo, mas é possível - e preferível - adquirir câmaras de uma gama superior. Quanto melhor for a câmara, maior será a margem de progressão do fotógrafo.
E não se esqueçam de um princípio importante que vou enunciar: os corpos (i. e. as câmaras propriamente ditas) vão e vêm, as lentes permanecem. O fotógrafo experimentado constrói o seu sistema à volta da sua colecção de lentes, e não do corpo. Os corpos são compostos por elementos mecânicos e electrónicos sujeitos a avarias, enquanto as lentes tendem a durar décadas. É também importante que se tenha em mente que, por regra, as lentes de uma determinada marca não podem ser montadas em corpos de outras marcas, a não ser com recurso a adaptadores cuja aquisição, nesta fase, não se justifica. As Canon e as Nikon têm a vantagem de haver dezenas de fabricantes (Sigma, Tamron, etc.) a produzir lentes para as suas câmaras, que podem ser boas alternativas às lentes das próprias marcas. Os requisitos mínimos são uma lente grande-angular e uma teleobjectiva média; a grande-angular, a despeito da presença do adjectivo «grande», é uma lente que cobre distâncias focais curtas (grosso modo entre os 18 e os 50mm), e a teleobjectiva cobre uma gama de distâncias focais superior (acima dos 50mm). As diferenças entre as lentes foram tratadas neste blogue (aqui, aqui e aqui), pelo que não vale a pena prosseguir com a descrição das suas diferentes características e aplicações. Apenas deixo uma recomendação a quem adquirir uma Canon: uma das melhores lentes que podem adquirir é uma grande-angular de 50mm, que pode ser comprada por preços ridiculamente baixos - por volta dos €100. Diz quem sabe que esta lente é a pechincha do século.
Como habitualmente neste tipo de aquisições, é importante escolher onde comprar o material. Eu não aconselharia as grandes superfícies, e usaria da maior prudência nas aquisições online: as lojas especializadas têm a enorme vantagem de possuir pessoal qualificado que pode ajudar a resolver as dúvidas do potencial comprador, para além de uma assistência técnica mais confiável. A ideia de que os preços são mais altos nestas lojas é falsa. Exemplificando: o meu saco, comprado numa loja especializada, custou-me menos vinte euros do que o preço praticado numa grande superfície para o mesmo produto.
Por falar em sacos, esta é uma despesa que pode parecer vultosa, mas é absolutamente necessária. Aconselho os Lowepro pela sua versatilidade, pela modularidade do interior, que assegura possibilidades de arrumação quase infinitas, e pela resistência ao choque e robustez. Um bom saco é acolchoado, de maneira a amortecer os impactos causados por quedas ou choques. Não é fútil, nem redundante, adquirir um bom saco - é proteger um investimento.
Uma compra que é muito mais importante do que parece é o cartão de memória; este deve ter boa capacidade - não recomendo menos que 8GB - e deve ser rápido. A rapidez traduz-se na aptidão para gravar as imagens no menor espaço de tempo, o que é importante quando se pretende colher uma imagem imediatamente a seguir à anterior, ou no disparo sequencial. O leitor deve evitar cair no erro de pensar que todos os cartões de memória são iguais e fazem a mesma coisa, e devem também estar preparados para despender mais de €30 na sua aquisição; um preço destes poderá parecer um exagero, mas a verdade é que é uma despesa inteiramente justificada. Tomem cuidado, porém, com os cartões SanDisk: embora sejam muito bons (eu tenho um, de 8GB), há no mercado inúmeras falsificações. Outra alternativa de qualidade são os Lexar. Mais uma vez, recomendo que se aconselhem numa loja especializada.

domingo, 11 de setembro de 2011

O melhor é começar de novo...

Conhecendo alguns dos leitores deste blogue, sei que esperam extrair daqui alguns ensinamentos de ordem prática. Muitos dos que começaram a fotografar na era digital - e eu, note-se bem, sou um destes - não têm algumas noções básicas de fotografia, uma vez que se habituaram a que a câmara faça tudo, bastando carregar no botão de disparo para obter fotografias de qualidade aceitável. Isto pode ser suficiente, dependendo do tipo de fotografia que se quer obter, mas fica muito longe do que se pode fazer quando se tem conhecimentos acerca do funcionamento da câmara e da forma como esta capta a imagem. Na verdade, diria que quem fotografa no modo automático apenas aproveita 10% do potencial da câmara.
A primeira noção a ter em conta, para compreender a fotografia, é que esta consiste em captar luz. Daqui depende uma longa série de parâmetros, como o ajuste da exposição, a velocidade do disparo, a abertura, a sensibilidade à luz do sensor ou o equilíbrio dos brancos. Apesar de, como já disse, ser possível obter boas fotografias deixando estas regulações ao critério da câmara, a verdade é que, quando o fazemos, não estamos a fotografar: estamos apenas a escolher um enquadramento. É a câmara, recorrendo às medições feitas pelo fotómetro, que está a fotografar, e não o fotógrafo. Isto pode ser perfeitamente aceitável para uns, mas não o é para outros. Decerto, captar um bom motivo é o mais importante em fotografia, mas isto, por si só, não garante que a imagem reproduza aquilo que queremos transmitir. Não é, deste modo, uma fotografia criativa. E a criatividade e expressão são o que separa a arte do mero documento e da reprodução textual de um tema.
É por estes motivos que apenas aqueles que pretendem dar expressão às imagens nutrem interesse pelo conhecimento das técnicas fotográficas. Contudo, quem sentir algum grau de satisfação pelas imagens que capta acaba, necessariamente, por querer ir mais longe e procurar expandir a sua criatividade.
Alguns poderão argumentar que o conhecimento técnico subtrai ao factor lúdico da fotografia, mas a minha experiência - que admito ser ainda demasiado curta - mostra-me que é exactamente o contrário: quanto melhor conhecemos as técnicas fotográficas, mais prazer retiramos da fotografia. É que a técnica permite expandir a criatividade, ao soltar as potencialidades do fotógrafo de modo a que este obtenha as fotografias que quer, e não as que a câmara lhe impõe. E o fotógrafo conhecedor das técnicas pode aplicá-las de modo a dar expressão às suas fotografias. E, como disse há pouco, a expressão é uma das fundações da arte.
É pois altura de me deixar de conversas técnicas e procurar fornecer sugestões simples para ajudar quem se quiser lançar na fotografia - tal como eu fiz há pouco mais de um ano atrás, embora sem ajuda. Eu sei que não sou um especialista, mas se puder inocular a alguém o vício da fotografia com o meu entusiasmo, tanto melhor...

sábado, 10 de setembro de 2011

Eu, a Olympus e as outras marcas

O texto anterior não significa que eu nutra alguma idolatria pela marca que tão longamente versei. Estamos perante uma companhia que fabrica os seus produtos em países onde o respeito pelos direitos da pessoa humana não existe, o que refreia consideravelmente o meu entusiasmo (*). Muito menos significa que seja pago para publicitá-la. E ainda menos que sinta alguma espécie de espírito de facção que me impeça de ver mérito noutras marcas. Pelo contrário: a minha primeira câmara foi uma Canon compacta. Se não fosse ter feito já um investimento substancial em lentes do formato Micro 4/3, e se sentisse a necessidade de ter uma câmara melhor, a única opção seria uma DSLR - e esta não seria uma Olympus.
A aquisição de uma DSLR mereceu-me sempre algumas reservas, à cabeça das quais está a estética. Não tenho dúvidas que, ao enunciar este aspecto em primeiro lugar, incorro na qualificação de frívolo, mas a verdade é que o aspecto estético sempre comandou, desde muito novo, a minha apreciação de uma câmara. Nos tempos idos da minha juventude, as câmaras eram bonitas; eram, na sua maioria, rangefinders, e o seu aspecto físico tornou-se a minha referência: câmaras relativamente pequenas, com uma parte do corpo de metal e a outra revestida de imitação de couro; nada de punhos inestéticos, linhas moles ou alojamentos protuberantes para o prisma, visor e flash. As únicas câmaras feias eram as de dimensões grotescas, como algumas Praktica e as câmaras russas. Ainda hoje as minhas referências são as Leica da série M, que são a expressão mais pura das rangefinders.
A outra reserva é a das dimensões das DSLR. A complexidade do seu manuseamento não me assusta, mas ter de trazer ao peito um conjunto de mais de um quilograma é uma ideia aterradora - quanto mais carregar um saco cheio de lentes fálicas e mastodônticas. Não estou interessado em ser um fotógrafo profissional, embora possa ver-me forçado a comprar uma DSLR se a minha evolução como fotógrafo assim o determinar.
Depois há o gosto pela originalidade, que eu cultivo dogmaticamente. Convenhamos que ter uma Canon ou uma Nikon não é nada original, pelo menos se compararmos com a minha E-P1. A proporção entre as reflex da Canon e Nikon e as E-P1 deve ser, pelo menos aqui em Portugal, de 1000 para 1. Mais uma vez corro o risco de ser tomado por frívolo, ou pelo menos por um esteta de gostos estranhos, mas entendo que a originalidade é importante. Vivemos numa civilização demasiado massificada e homogénea, e esta é a minha reacção à banalidade. Tal como ouvir música alternativa, clássica e jazz, comprar discos de vinil ou preferir processadores AMD.
Por fim - mas não o menos importante - há o factor económico e a relação entre custo e qualidade. As DSLR de acesso, como a Canon 1100D ou a Nikon D3100, não têm uma qualidade de imagem superior à da minha Pen E-P1. Podem ser melhores em determinados aspectos, mas a qualidade dos JPEGs saídos da câmara não é melhor que a das imagens da E-P1 - especialmente se usar uma lente como a G.Zuiko de 28mm, que captura as cores mais extraordinárias. Para ter uma DSLR que me desse mais do que aquilo que tenho neste momento, teria precisado de gastar muito dinheiro - e este, como sabemos, não cresce nas árvores. Ademais, li há meses um artigo que me deixou preocupado, no qual o autor afirmava que os corpos actuais são concebidos para durar não mais que quatro ou cinco anos. Neste aspecto a E-P1, com o seu corpo totalmente construído com metal, parece-me uma escolha superior a uma DSLR de plástico que terei de deitar fora dentro de alguns anos. (E eu nunca revelei publicamente a pechincha que a minha E-P1 foi...)
Como referi, se tivesse um interesse ainda mais sério pela fotografia (que não estou livre de vir a desenvolver), encararia a aquisição de uma DSLR como a única possibilidade; e não seria uma Olympus, uma vez que as suas reflex têm limitações consideráveis por virtude da opção pelos sensores 4/3, que diminuem a relação sinal/ruído, causando níveis de ruído na imagem que as colocam fora dos padrões de qualidade obtidos pelas câmaras de outras marcas. E o ruído é uma das minhas bêtes noires em fotografia, logo atrás da distorção de barril e à frente das aberrações cromáticas. Se eu fosse profissional, ou pelo menos fizesse trabalhos ocasionais de fotografia, a minha escolha não seria uma Olympus: seria uma Canon. Se tivesse de contar os cêntimos, seria uma 600D; se pudesse ir um pouco mais longe, a minha opção seria a 60D. É enorme, feia, e tem aquele LCD no topo cuja complexidade intimida mesmo quando a câmara está desligada - mas, a avaliar pelos testes da Digital Photography Review, é uma câmara que torna difícil de justificar a opção por outra de gama e preços superiores. Claro que toda a gente tem uma Canon (e quem não tem uma Canon tem uma Nikon...), mas a qualidade das cores, a nitidez, a neutralidade tonal, os níveis de resolução e a qualidade das imagens com sensibilidades ISO elevadas fazem com que esta seja a câmara que eu compraria, se tivesse o dinheiro necessário e a necessidade real de ter uma reflex. Poderia considerar outras opções: tenho a certeza que o modelo equivalente da Nikon, a D7000, é uma belíssima câmara, mas a qualidade de imagem da Canon está mais próxima dos meus padrões; a Pentax tem câmaras belíssimas (a K-x esteve na minha lista de possíveis aquisições) e, pelo que sei, as suas lentes são de enorme qualidade - incluindo as da era da focagem manual -, mas o futuro da Pentax, agora que foi adquirida pela Ricoh, é demasiado incerto, não sendo improvável que esta marca tenha por futuro descansar no céu das máquinas fotográficas, fazendo companhia à Minolta. Em todo o caso, preferia uma K-5 a uma Olympus E-5.
As reflex têm, desde logo, uma vantagem tremenda sobre as compactas de lentes amoviveis: o visor óptico. Não é apenas pela clareza da imagem, nem pela enorme vantagem de ver exactamente o mesmo enquadramento que a lente capta: é também por permitir segurar a câmara de uma forma muito mais estável. Depois há a ergonomia, que também ajuda a focagem e a resolução das imagens, ao garantir uma posição de disparo muito mais firme. E há, evidentemente, os aspectos relacionados com a qualidade intrínseca da imagem, desde logo os níveis diminutos de ruído. E a velocidade: se me dedicasse, ainda que ocasionalmente, à fotografia de desportos ou de animais no seu habitat natural (o meu gato, o Sousa, não conta...), as compactas de lentes amovíveis estariam excluídas. Porém, no meu patamar de conhecimentos fotográficos, e atendendo às minhas necessidades, a E-P1 serve perfeitamente - por agora.
E é uma Olympus...
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(*) Este texto foi escrito antes do Olympusgate...   

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Eu e a Olympus

Não vou mentir: a Olympus não é uma marca com que tenha grande familiaridade. Ao contrário da Minolta, por exemplo, já  que um dos meus tios foi vendedor da representante da Minolta para Portugal, que importava também material da FujiFilm. O meu pai tinha uma Minolta 7S, que estou a pensar restaurar, pelo que as minhas recordações de fotografia não passam pela Olympus. O meu primeiro contacto com esta marca aconteceu em 1978 ou 1979, quando a Olympus patrocinou a Lotus na Fórmula 1 (o que me levou a uma impressão favorável, já que era, nessa altura, um taradinho pela F1...). A marca que está mais perto do meu coração é a Minolta, que já não existe: foi adquirida pela Sony, cujas câmaras nada me dizem. Como, aliás, qualquer dos seus produtos.
Não posso, deste modo, sentir nostalgia por tempos que passaram sem que me desse conta, nem inventar um passado que não vivi. A Minolta já não existe, e o meu conhecimento dos produtos da Olympus, antigos ou novos, vem do ano passado, altura em que me procurei informar sobre a câmara que ia comprar. Foi um mundo novo e inexplorado que encontrei. Não posso dizer que tenha ficado maravilhado com as descobertas, mas a verdade é que sinto orgulho em ter uma Olympus - o que não sucederia se tivesse uma Reflex da Canon ou da Nikon. Com efeito, a Olympus tem câmaras e lentes absolutamente notáveis. Das primeiras, a que mais me impressiona - a câmara que compraria se me dedicasse à fotografia analógica - é a Olympus OM-1. Em termos estéticos, porém, não tenho dúvidas: após a OM-1, a câmara da Olympus com a melhor estética é a Pen E-P1. A minha câmara. Sim, eu tenho uma das câmaras mais bonitas da história da fotografia. Fiz questão de trabalhar e poupar arduamente para adquiri-la. Nestes tempos de compactas, DSLRs e compactas com forma de DSLRs, a E-P1 sobressai. Bastou-me saber que era uma boa câmara, com funções tão avançadas quanto as DSLRs, para a querer de imediato.
O que me agrada, na Olympus, é o seu carácter, digamos, afectivo: é uma marca que cria vínculos fortes com quem teve as suas lentes e câmaras. Conheço algumas pessoas que se referem às suas velhas Olympus com genuína veneração; falam-me das suas OM e das Trip 35 com um sorriso enorme e olhos refulgentes de orgulho, o que não acontece com outras marcas. Neste aspecto lembra-me a Citroën dos anos 60 e 70, a propósito da qual os franceses diziam: On n'achéte pas une Citroën, on l'épouse. Quanto às lentes Zuiko, elas são referenciadas, pelos entendidos, entre as melhores do mundo - em especial as da série OM, das quais sou o vaidoso proprietário de um exemplar.
Hoje a Olympus está a pagar o preço de tentar seguir o seu próprio caminho. Cometeu, pelo menos, dois erros crassos: tardou demasiado a aderir à focagem automática (talvez por não querer abandonar a produção das lentes OM), o que a fez ser superada por praticamente todas as concorrentes, e, mais recentemente, construiu duas gamas de câmaras com base numa tecnologia cujas vantagens não chegam para superar os problemas técnicos que, neste tempo em que as aquisições são determinadas pelo marketing, a deixaram a marcar passo. Lançaram o formato 4/3, apesar de o sensor em torno do qual as câmaras e as lentes deste sistema são produzidas ter um handicap evidente quanto à sensibilidade ISO, o que prejudica a qualidade da imagem em fotografia nocturna e de motivos em movimento rápido. Basta, a qualquer das outras marcas, invocar a existência de um sensor enorme no interior das suas câmaras para que os consumidores virem as costas às E-5, E-30 ou E-620. Por outro lado, a incerteza quanto à continuidade da sua linha de câmaras DSLR está a deixar nervosos todos aqueles que construíram um sistema fotográfico em torno das lentes para 4/3, e são muitos os que põem de lado a lealdade para seguir o caminho Canon/Nikon. Até a Sony e a Samsung se estão a aproveitar da miopia dos administradores da Olympus.
Com o Micro 4/3 a história não difere muito. Apesar de compreender o que a Olympus está a fazer - câmaras pequenas com uma qualidade de imagem superior são uma dádiva para quem quer fazer fotografias de qualidade sem o volume e o peso de uma DSLR -, o mercado entende as câmaras deste formato como simples compactas com o gadget das lentes intermutáveis, o que a Panasonic parece estar a aproveitar melhor do que a Olympus. Este ano foram lançadas três câmaras idênticas em especificações e com pouca variação no tamanho: a E-P3, a Pen Lite e a Pen Mini. As duas últimas são produtos que concorrem entre si, sem que se veja muito bem por que alguém há-de comprar um modelo em detrimento de outro. Mais um erro. E a aventura Micro 4/3 pode tornar-se desastrosa para a Olympus, que aceitou ficar com as sobras dos sensores da Panasonic para as suas câmaras em troca da cedência do seu imenso know-how.
Tudo isto leva os analistas a questionar o futuro da Olympus. Há rumores - embora não muito consistentes - de que a Panasonic pode adquirir a Olympus. Se isto acontecer, é possível que a Panasonic faça o que a Sony fez à Minolta. O que seria um fim lamentável: uma companhia especialista em óptica com quase cem anos comprada por uma marca de aspiradores!