quinta-feira, 30 de junho de 2011

As minhas referências, parte 5

Garry Winogrand
Devo dizer que tive dúvidas em colocar Garry Winogrand entre as minhas referências. Afinal de contas, o meu conhecimento da sua obra não é assim tão vasto, e o meu primeiro contacto com ela não foi o mais ortodoxo. Na verdade, nunca tinha ouvido falar nele até ler o capítulo acerca da intenção no livro de Michael Freeman O Olhar do Fotógrafo. E as referências deste estão longe de ser elogiosas: «evidente falta de capacidade ou de objectivo preciso». Claro que, com base neste dogma, poderia dizer, numa conversa sobre fotografia, que Garry Winogrand era um mau fotógrafo - mesmo sem ter visto nenhuma das suas fotografias -, porque já estaria suficientemente documentado com o argumento da autoridade de Michael Freeman. O comentário de Freeman teve o efeito oposto, levando-me a procurar conhecer a obra de Winogrand para compreender a razão daquelas palavras tão depreciativas, e acabei por descobrir algumas das fotografias mais interessantes que se fizeram no século passado!
 Concedo que, ao contrário de HCB, que procurou dar conteúdo artístico aos instantâneos da vida organizando-os e ordenando-os no rectângulo do visor da sua Leica, Garry Winogrand (que também usava Leicas...) parece não ter outro propósito que não seja o de fotografar. Mas será isso tão mau? Não me acontece a mim, usando a expressão de Garry W., fotografar só para ver como é que aquilo que se me depara fica quando fotografado?
E, mesmo admitindo que esta é uma obra sem intencionalidade (não é), será que é menos válida por isso? Merecerá Winogrand que se fale de «falta de capacidade» a propósito das suas fotografias?
Em meu entender, nenhuma das respostas a estas perguntas é positiva. Algumas das fotografias de Garry Winogrand denotam mestria técnica (lembrem-se de que me estou a referir a um fotógrafo que usava câmaras analógicas e de manuseamento manual) e excelente noção de composição: é o caso da fotografia no topo deste artigo, e da que se segue:
Concedo que muitas das fotografias de Winogrand quebram regras elementares do design: não se deve cortar os pés das pessoas fotografadas, deve obedecer-se à regra dos terços, etc. Mas o facto de muitas das fotos de GW terem estes problemas será incapacidade, ou será transgressão? Não traduzirão estas falhas a sede de fotografar motivos que pareciam merecedores de ser retidos no rolo?
É precisamente pela sua avidez de fotografar, e por fazê-lo sem preocupações técnicas excessivas, que Garry Winogrand é uma das minhas referências. Esta ausência de preocupações técnicas (que na verdade é apenas aparente) tem outro significado: a prevalência do conteúdo sobre a forma. Não, Michael Freeman: a obra fotográfica de Garry Winogrand não está viciada por falta de objectivo preciso. O seu objectivo era fotografar. Pode parecer pouco, mas é muito. Muito.

Sem comentários: