sábado, 29 de outubro de 2011

Palácio de Cristal

Esta manhã diverti-me a fotografar nos jardins do Palácio de Cristal. Procurei temas que não fossem aqueles que toda a gente fotografa, treinando o olhar para o pormenor e o que fica despercebido, mas por vezes não há maneira de fugir a temas comuns: entretive-me a fotografar pavões, já que alguns deles aquiesceram em posar para mim. 
Infelizmente, não consegui persuadir nenhum deles a abrir o espantoso leque de penas: vou ter de estudar estes animais para descobrir quando é a época do namoro...
Depois andei pela Casa Tait e pela Rua de Entre Quintas. Há algo que me choca neste património histórico: o seu abandono. Não compreendo por que motivo estes espaços estão tão desleixados: eles são vestígios de uma das épocas de apogeu da minha cidade, testemunhos de uma prosperidade que já não existe. Em lugar de serem vigiados e conservados, têm as paredes cobertas de graffiti (posto que alguns sejam bem interessantes). Trocava de bom grado o WTCC por obras de conservação do património histórico da minha cidade. Mesmo na zona considerada património mundial, a ruína e o desmazelo são evidentes, com as casas abandonadas e o lixo que se acumula nas ruas. Os jardins da cidade, esses, parecem ter sido deixados à mercê da falta evidente de brio profissional dos funcionários camarários, que recebem o mesmo (pouco) se trabalharem ou não fizerem nada. É raro o jardim ou parque que tenha flores em bom estado.
Uma cidade que elege autarcas como estes patetas que ocupam a Câmara Municipal talvez não mereça mais, mas os que amam a cidade não conseguem deixar de se sentir revoltados. Valha-nos a beleza que ainda vai sobrevivendo aqui e ali.
Mais fotos da sessão de hoje no meu Flickr

domingo, 23 de outubro de 2011

Preto e branco

Sou um incondicional da fotografia a preto e branco. Sempre que faço fotografia de rua, faço-o a preto e branco - e, mesmo quando não fotografo na rua, há sempre motivos que resultam melhor a preto e branco que a cores.
Com efeito, o preto e branco tem atributos que, em determinadas circunstâncias, servem melhor a fotografia artística que a cor. Desde logo, porque quando se fotografa a cores, estas tornam-se no elemento visual preponderante da imagem; ora, quando o elemento cor é eliminado, a atenção crítica concentra-se nas formas, texturas, tonalidades e contrastes. O preto e branco tem o potencial de gerar fotografias que apelam mais ao intelecto que aos sentidos, favorecendo uma fotografia mais conceitual - ao passo que a fotografia a cores se dirige a uma percepção mais imediata.
Há, contudo, um pressuposto que me parece essencial referir: hoje é muito fácil fotografar a cores e converter a imagem em preto e branco na pós-produção. Há até quem faça esta conversão por não ter ficado satisfeito com a cor da imagem. Isto é um erro. A fotografia deve ser pensada a preto e branco antes de se premir o botão de disparo. Nem todas as fotografias têm condições para resultar bem a preto e branco: a título de exemplo, as fotografias de paisagens, bem como as de motivos da natureza, nas quais a cor é um elemento essencial, raramente são interessantes quando tiradas (ou convertidas) em preto e branco. A fotografia a preto e branco exige contrastes acentuados, texturas nítidas e linhas fortes.
Uma vez que a fotografia deve ser pensada a preto e branco desde o início, penso que o ideal é seleccionar o modo preto e branco na própria câmara antes de fotografar - o que implica, naturalmente, planear a sessão fotográfica para que se use apenas o preto e branco. Isto é preferível à conversão na pós-produção, uma vez que predispõe e prepara o cérebro para fotografar motivos que resultam melhor em preto e branco (claro que há sempre a opção de reverter para a configuração a cores se surgir um motivo em que a cor seja um elemento fundamental).
O fotógrafo deve resistir à tentação de rejeitar o preto e branco por ser um modo de fotografia anacrónico. Esta ideia é falsa. A fotografia a preto e branco é tão válida hoje como antes do advento do Kodachrome, e é usada por milhares de fotógrafos. Acima de tudo, o preto e branco ajuda a conferir mais expressão à fotografia, ao revelar aspectos da imagem que a cor dissimula e favorecendo linhas que, na fotografia a cores, se tornariam secundárias. Está para a fotografia como o desenho a carvão para as artes plásticas: revela a forma, as sombras e os contrastes de uma forma que é impossível reproduzir quando se usa a cor.

sábado, 22 de outubro de 2011

Que se passa com a Olympus? (nova actualização e uma adenda a despropósito...)


Começo a sentir-me embaraçado por ter uma Olympus. E não é só a câmara: é o adaptador, são as lentes... até as tampas das lentes transportam a marca da vergonha, lembrando-me em permanência a asneira de ter dado dinheiro a ganhar àqueles yakuzas
Mas a verdade é que as fotos que este material produz são tão boas que o Olympusgate fica facilmente esquecido diante da beleza das imagens que capto. Hoje estive nos jardins da Bonjóia, exercitando a profundidade de campo com a OM 50mm/f1.4. Os resultados obtidos com esta lente chegam a ser maravilhosos.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Que se passa com a Olympus? (actualização)

A desvalorização das acções da Olympus Corp. já vai em 40%. Desde Sexta-feira, data do despedimento de Michael C. Woodford, que o valor não pára de cair. Não sei o que pode acontecer se isto continuar; o mais provável é que as acções vão parar às mãos de especuladores sem escrúpulos e que a Olympus acabe nas mãos de um grupo económico que não nutra qualquer respeito pela história da marca. O capitalismo é isto mesmo: a única coisa sagrada é o dinheiro. 
Não é apenas pela probabilidade forte de desaparecer uma das marcas de material fotográfico mais estimadas em todo o mundo que a notícia tem corrido desta maneira, a ponto de encher páginas no Financial Times e no Bloomberg. De acordo com os analistas, este escândalo está a abalar a credibilidade das corporações japonesas, que já tinham a reputação de opacas e fechadas. Mais ainda, é a própria reputação do Japão que sai prejudicada.
Eu não sei quem tem razão. Continuo a não saber, e provavelmente só daqui a muitos anos se saberá a verdade sobre o que está a acontecer. O que é seguro, no momento em que escrevo, é o seguinte (*):
a) A Olympus Corp. pagou 36% do valor do negócio a duas empresas de consultoria - uma delas com sede nas Ilhas Caimão, que desapareceu logo de seguida - antes da aquisição da Gyrus;
b) A Olympus Corp. adquiriu três pequenas empresas - uma delas fabrica recipientes do género dos Tupperware! - por 773.000.000 USD, que sofreram uma desvalorização (impairment charge) de 586.000.000 USD logo após o último pagamento. Estas empresas são inúteis para as actividades da Olympus;
c) Três dias antes de ser despedido, Michael C. Woodford escrevera uma carta ao actual presidente executivo, Tsuyoshi Kikukawa, na qual expunha estes negócios e exigia a destituição de Kikukawa e de um vice-presidente do conselho de administração de apelido Mori;
d) Kikukawa-san mentiu quanto aos honorários pagos às consultoras aquando do negócio da Gyrus, tendo admitido o pagamento de apenas cerca de metade do valor realmente pago.
Certamente mais factos vão ser descobertos, especialmente se o Serious Fraud Office descobrir movimentações ilícitas de dinheiro. Para mim tudo isto é um choque: não que imaginasse que os executivos da Olympus fossem amantes da fotografia que se dedicassem ao negócio para dar a possibilidade aos fotógrafos de adquirir excelente material, mas por mais esta prova da enorme desonestidade e corrupção que existe nos meios financeiros - sejam eles norte-americanos, portugueses ou japoneses. O mundo atingiu um grau de amoralidade tal na prossecução do lucro que já não subsiste qualquer espécie de ética ou escrúpulo na mente de certos administradores.
Outro pensamento chocante é a possibilidade de a Olympus, uma das marcas de equipamento fotográfico com maior factor de estima junto dos seus consumidores, poder estar a despoletar uma crise financeira de consequências imprevisíveis. Não é bem aquele lugar-comum do bater de asas da borboleta na China - é mais o disparo de um obturador no Japão que pode provocar uma catástrofe financeira no mundo todo. Como se o mundo precisasse de mais uma crise financeira!
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(*) Fonte: Financial Times

A distância focal equivalente

Todas as lentes, sem excepção, têm uma distância focal, que é a distância que os raios de luz que entram na lente percorrem até a imagem focar. Fala-se em lentes de 35mm, 50mm, 18-55, 14-150, mas estes valores podem não traduzir a distância focal real quando a lente é montada numa câmara.
Com efeito, todos os fabricantes de lentes indicam a distância focal com base no padrão mais comum na era analógica: a do fotograma de 35mm, correspondente a uma área de 36 × 24 mm. É esta a referência utilizada para medir a distância focal das lentes.
Simplesmente, os sensores das câmaras digitais são, por regra, mais pequenos que o fotograma de 35mm. Como se pode ver no diagrama acima, existem diversos sensores cuja área é consideravelmente menor que a do filme de 35mm (a castanho). Isto significa que a distância focal de uma dada lente varia conforme o sensor da câmara na qual é montada. A esta variação chama-se distância focal equivalente, também denominada EFL (equivalent focal length) ou crop factor. Como importa conhecer qual é a distância focal real da lente, utiliza-se uma fórmula matemática na qual se multiplica a distância focal por um determinado factor. Apenas para referir as mais comuns, direi que, num sensor APS-C - de longe o mais utilizado nas câmaras DSLR (a vermelho no diagrama) - esse factor é de 1,5 (Nikon, Pentax, Sony) ou 1,58 (Canon). Pelo que, se montarmos uma lente com uma distância focal nominal de 50mm numa DSLR da Canon com sensor APS-C, a distância focal equivalente é de 79mm (50 X 1,58 = 79); numa Nikon, Sony ou Pentax, essa distância focal será de 75mm.
Numa câmara micro quatro terços, que usa um sensor 4/3 (a púrpura no diagrama), este coeficiente de multiplicação é 2, pelo que a mesma lente de 50mm equivale a uma lente de 100mm. Uma lente standard, ou normal, comporta-se, quando montada numa destas câmaras, como uma teleobjectiva. Nas novas Nikon 1, cujo sensor tem cerca de metade da área do padrão 4/3, esse factor é ainda maior: 2,7. A mesma lente de 50mm tem uma distância focal efectiva de 135mm. Está bom de ver que isto comporta uma vantagem - a possibilidade de fabricar lentes mais pequenas do que seria necessário no padrão 35mm. 
Na verdade, as lentes apenas funcionam de acordo com a distância focal nominal nas câmaras com sensor full frame (correspondente a 35mm ou 36 × 24 mm). Exemplos destas câmaras são as Nikon D3, as Leica M8 e M9 e as novíssimas Canon EOS 1D x. Esta equivalência é um factor que deverá ser levado em conta pelo adquirente de lentes, uma vez que a falta de correspondência entre as distâncias focais nominal e efectiva pode alterar por completo as características da lente quando montada numa determinada câmara: uma lente que, atenta a sua distância focal, pode ser considerada uma grande-angular, comportar-se-á como uma lente standard em certas câmaras, e uma lente standard pode tornar-se numa teleobjectiva. O que pode baralhar os cálculos do aspirante a fotógrafo.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Que se passa com a Olympus? (Continuação)

Naquela altura era tudo sorrisos...
O folhetim Olympus Corporation promete desenvolver-se. Agora descobriu-se que a companhia pagou qualquer coisa como quinhentos milhões de euros em honorários a consultores antes da aquisição da Gyrus ACMI, empresa britânica que agora pertence ao grupo Olympus. Esta quantia é cerca do dobro do que o actual presidente executivo, Kikukawa-san, admitiu apenas há alguns dias. Tudo leva a crer, deste modo, que Michael C. Woodford tinha razão ao advertir o conselho de administração e pedir a exoneração de Kikukawa e de outro vice-presidente, e parece agora plausível que Woodford tenha sido afastado por saber demais. O conselho de administração invoca, para consubstanciar os conflitos culturais a que aludira, o facto de Michael Woodford ter o hábito de tomar decisões sem ouvir o conselho de administração e de comunicar directamente com os empregados, ignorando a cadeia hierárquica. Ainda bem que o fazia, pois de outro modo seria impossível tomar decisões.
Por outro lado, o modo como Woodford foi tratado depois do afastamento foi humilhante: minutos depois da deliberação de despedi-lo, informaram-no que já não tinha direito a automóvel da empresa, pelo que deveria tomar um autocarro para o aeroporto, obrigaram-no a entregar o apartamento e exigiram-lhe o cartão de crédito. Aviltante. Não sabia que a mentalidade empresarial japonesa era assim. Corrijo: espero que este tipo de atitude não seja característico das empresas japonesas.
Entretanto, Michael C. Woodford entregou os elementos que tinha em seu poder ao Serious Fraud Office, no Reino Unido, para que as transacções da Olympus fossem investigadas. Este expediente é de eficácia duvidosa, uma vez que me parece improvável que o SFO tenha poderes de acção contra os membros do conselho de administração da Olympus Corporation, cuja sede é em Tóquio, mas sempre poderemos ficar a saber melhor o que se está a passar.
Diante de tudo isto, quase sinto vergonha de ter uma Olympus. Pensar que parte do que gastei com material fotográfico da marca pode ter sido usado em negócios escuros! Claro que os cérebros que conceberam a E-P1 não têm culpa nenhuma, e, na verdade, a Olympus Imaging Corporation pesa apenas 16% no volume de negócios da Olympus Corporation - mas, mesmo assim, custa-me ver este escândalo a acontecer. Até à semana passada, esperava que a Olympus não vendesse a divisão de imagem; agora parece-me que essa venda era o melhor que podia acontecer à marca Olympus.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Que se passa com a Olympus?

É muito raro ver uma empresa de fotografia ser notícia e, quando tal acontece, raramente é pelos produtos que lança. Na Sexta-feira, 14 de Outubro, Michael C. Woodford, CEO (presidente executivo) da Olympus Corporation - o primeiro não japonês a desempenhar essas funções - foi despedido. Os membros do Conselho de Administração deliberaram destituí-lo sem sequer o ouvir. Disseram-lhe para apanhar um autocarro para o aeroporto, segundo o próprio. Para o seu lugar foi designado Tsuyoshi Kikukawa, que acumulará o cargo com o de presidente do conselho de administração.
A história por trás do despedimento de Woodford é confusa e de contornos obscuros. Aparentemente, Michael C. Woodford escrevera uma carta a Kikukawa na qual denunciava algumas aquisições potencialmente ruinosas e totalmente desnecessárias, o que terá feito o conselho de administração reagir despedindo Woodford. Contudo, o conselho de administração publicou uma nota invocando um conflito de culturas entre Woodford e o conselho, sugerindo que os seus métodos eram incompatíveis com a política da empresa. A verdade é que, nos oito meses em que Michael C. Woodford exerceu o cargo, os resultados líquidos da Olympus Europa GmbH se tornaram positivos, mas alguns especularam que a referência à diferença de culturas significava que Woodford se preparava para enveredar por uma política, tipicamente ocidental, de downsizing e despedimentos colectivos, à qual os membros do conselho de administração - todos eles japoneses - se opunham. Esta tese não tem fundamento em qualquer publicação ou declaração entretanto patenteada, embora seja plausível: afinal de contas, a Olympus alienara, ainda há pouco tempo - embora antes de Michael C. Woodford ter tomado o cargo de CEO - o importante negócio de imagiologia clínica.
Michael C. Woodford
Contudo, não é esta a versão de Woodford: segundo ele, a administração enveredara por uma política de aquisições incompreensível, e o despedimento foi a retaliação por ter exposto os negócios. Como se sugerisse que havia interesses ocultos por trás das referidas aquisições.
Não sei quem diz a verdade, uma vez que ambas as versões são plausíveis. Sei que as acções da Olympus Co. desceram 24% entre Sexta-feira e hoje, e que o escândalo tem recebido mais atenções na imprensa mundial do que o lançamento das novas PEN. O que significa que anda nas bocas do mundo pelos piores motivos possíveis, e isto não costuma ser prenúncio de coisas boas. Espero que esta história seja tirada a limpo: assim como as diferentes versões de Woodford e do conselho de administração parecem plausíveis (embora antagónicas), também não me custa admitir que Michael Woodford tenha resolvido vingar-se do despedimento através do lançamento de suspeitas infundadas (o que patentearia baixeza de carácter), tal como não me parece impossível aceitar que os membros do conselho de administração tenham despedido Michael C. Woodford por ter exposto negócios escuros (o que significaria que o conselho de administração pode ser um gang de delinquentes, quem sabe uma espécie de yakuza). Simplesmente, esta última hipótese seria demonstrativa de estupidez, uma vez que seria mais que previsível que Woodford denunciasse o que sabia quando fosse despedido. 
Francamente, não sei que pensar. Sei que a Olympus tem cometido inúmeros erros ao longo da sua história, e as aquisições desastrosas seriam apenas mais um acréscimo ao rol. Espero que isto não afecte a continuidade da subsidiária Olympus Imaging Corporation, porque seria uma pena que os erros dos administradores levassem ao fim de uma marca com quase cem anos. Seria também lamentável que a Olympus terminasse envolta em tamanha sordidez.
Mais sobre o olympusgate aqui:
http://video.ft.com/v/1223228352001/Ex-Olympus-boss-alerts-UK-authorities
http://www.bloomberg.com/quote/7733:JP
http://www.agenciafinanceira.iol.pt/mercados/olympus-accoes-bolsa-toquio-asia-mercado-accionista/1289881-1727.html
http://www.nytimes.com/2011/10/15/business/global/in-rare-move-olympus-fires-its-chief.html
http://graphics8.nytimes.com/packages/pdf/business/20111018/letter-text.pdf

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Mirrorless, compactas e DSLRs

Ontem pude comprovar algo de que já suspeitava há muito. Vi um casal jovem na Ribeira, com o rapaz fotografando a rapariga com uma câmara que me pareceu peculiar. Era uma Sony NEX-5, uma das três mirrorless da Sony. Após alguns minutos de conversa, veio a confirmação das minhas suspeitas - nenhum deles fazia ideia de que podiam trocar as lentes. Usavam-na como se fosse uma compacta, embora uma compacta cuja lente adquire o estatuto de símbolo fálico. E haviam de ter visto a cara deles quando lhes mostrei o sensor da minha câmara: não faziam ideia do que aquilo era! Quando lhes referi que tinha quatro lentes, perguntaram-me se era um profissional...
É este o triste destino das mirrorless. Concebidas para ser uma escolha para fotógrafos a quem não interessa ter uma câmara com o volume das DSLR - foi com esse propósito que as Panasonic GF1 e GH1 e a Olympus E-P1 foram anunciadas -, acabam a ser compradas por pessoas que não têm qualquer interesse especial por fotografia mas querem uma compacta cara.
A culpa disto não é dos consumidores, mas de uma estratégia que se interessa mais pelo volume de vendas que pela qualidade e funções da câmara. Esta estratégia pode ser legítima do ponto de vista das multinacionais, mas arruinou por completo o conceito mirrorless. (Ou, pelo menos, o conceito que eu tinha das mirrorless.) Já me referi aqui à guerra insensata a que os fabricantes se entregaram, pelo que não me vou repetir, mas este marketing destruiu de vez toda e qualquer esperança de surgir uma alternativa às DSLR. Com consumidores que, embora sensíveis ao argumento da qualidade de imagem, não são entusiastas, não lhes fazendo muita diferença a possibilidade de mudar lentes, a maneira de aumentar as vendas foi subsumir o conceito mirrorless à categoria das compactas. Até a Olympus entrou no jogo das câmaras cor-de-rosa!
Isto significa que as mirrorless, por imposição do mercado (i. e. das multinacionais), nunca serão mais que compactas um pouco mais caras e sofisticadas. O que, por seu turno, significa que se perdeu muito rapidamente uma oportunidade de ultrapassar o conceito DSLR - ou, pelo menos, de se instituir uma alternativa decente. Com efeito, este conceito surgiu em 1884 e a primeira câmara comercialmente viável foi lançada em 1949. À parte o processamento digital da imagem, os progressos do conceito SLR têm consistido em evoluções irrelevantes. A única inovação significativa - deixando de lado a implementação do vídeo e os ecrãs rotativos, que nada adicionam - foi a implantação de um espelho translúcido e um visor electrónico nas Sony SLT Alpha 33 e 55, e mesmo essa evolução não revolucionou coisa nenhuma, pois o conceito espelho-pentaprisma mantém-se.
Nos anos 70 do século passado, os fotógrafos amadores tinham uma escolha real: os mais exigentes tinham as SLR, como as Nikon F, as Olympus OM e muitas outras, e os que queriam qualidade de imagem num conjunto mais compacto tinham as rangefinders, como a venerável Minolta 7S. Hoje têm de escolher entre uma Canon ou uma Nikon se quiserem fotografias de alta qualidade, não existindo verdadeiras alternativas. As compactas não são alternativa às DSLR, e a evolução do conceito mirrorless leva à degradação do potencial de qualidade de imagem, com os fabricantes a voltar-se para sensores minúsculos - o que reduz as câmaras e respectivas lentes à condição de gadgets caros. Nem a Sony e a Samsung, com os seus sensores APS-C implementados em compactas, conseguirão inverter esta tendência, uma vez que quem as compra fá-lo seguindo os critérios que levariam à aquisição de uma compacta. A possibilidade de existir um produto alternativo às DSLR perdeu-se por completo - e, provavelmente, ainda vai tornar-se mais inexequível se a Canon se sair com uma espécie de G12 com lentes intermutáveis, como tudo indica que acontecerá. Escolher entre uma DSLR e uma compacta é como escolher entre um Peugeot 508 e um Microcar: pura e simplesmente não é uma escolha.

domingo, 16 de outubro de 2011

Uma exposição fascinante

Vão ao palacete dos Andresens ver a exposição que está lá instalada, com a biografia e algumas fotografias de Harold Edgerton! O quê? Ainda estão aí a ler isto? Vão já! Imediatamente! Nem sabem o que perdem se não forem!
Agora com mais calma e sem ultimatos: está patente na Casa Andresen, sita à Rua do Campo Alegre, 1191, Porto, uma exposição de fotografias de Harold Edgerton (1903-1990). Harold Eugene «Doc» Edgerton era, antes de mais, um cientista e inventor que estudou e experimentou a luz estroboscópica e aperfeiçoou a sua sincronização com a velocidade de disparo - por vezes superior a milionésimo de segundo! - para obter imagens «congeladas» de movimentos tão rápidos que são imperceptíveis a olho nu. Foi dele a primeira fotografia de uma gota de leite caindo e formando um diadema, que mais tarde todos copiaram. E que dizer da foto abaixo?
A exposição dura até 8 de Janeiro de 2012, e pode ser visitada de Quarta a Domingo, entre as 14h30 e as 18h30. As fotografias expostas são fascinantes. Qualquer pessoa com um mínimo de interesse em fotografia - ou mesmo apenas com um pouco de curiosidade científica - devia visitá-la. Não vou dizer que vale a pena, porque esta fórmula não é suficiente para descrever o que vão ver: é antes uma experiência única e enriquecedora!
E, no fim, sempre podem ir até ao Jardim Botânico, que é mesmo nas traseiras do palacete, ver onde eu tiro as minhas fotos de flores com bokeh...

sábado, 15 de outubro de 2011

Desconstruindo os mitos sobre lentes

Lente grande-angular
Para um neófito, a chegada ao mundo da fotografia é acompanhada por um sem-número de mitos e preconcepções que importa desfazer, sob pena de se laborar perpetuamente em erro. Estas ideias preconcebidas incidem, principalmente, sobre as lentes, o que é agravado pelo advento das compactas e das bridge, com as suas lentes únicas que cobrem uma gama de distâncias focais.
Vamos começar por aqui: o que é a distância focal?
A distância focal é aquela que os raios de luz que entram na lente percorrem até focar. Isto tem, desde logo, a implicação de o ângulo de visão ser tanto menor quanto maior for a distância focal, uma vez que, quanto mais curta for a distância, maior será a quantidade de luz projectada sobre o sensor, tornando a imagem mais larga. É por este motivo que o ângulo de visão diminui à medida que aumenta a distância focal: de uma lente fisheye de 8mm, com o seu ângulo de 180º, até aos 2º de uma 1200mm (ver diagrama abaixo). É também por este motivo que as lentes grande-angulares têm, em regra, aberturas maiores que as teleobjectivas.
Isto significa que a construção das lentes varia conforme a distância focal, sendo, por regra, tanto maiores quanto maior for a distância focal. O leigo pode ser tentado a pensar que uma lente grande-angular é uma lente fisicamente grande, pela inclusão deste adjectivo na denominação, mas esta noção não corresponde à realidade. As lentes grande-angulares são grandes quanto ao ângulo de visão; fisicamente, estão entre as mais pequenas. Há excepções: há lentes grande-angulares que, para evitar a distorção causada pelo ângulo amplo (i. e. para evitar o efeito de curvatura das fisheye), são construídas com um número maior de grupos ópticos, o que aumenta o seu comprimento. Um dos melhores exemplos desta construção é a nova Olympus 12mm/f2.0.
Teleobjectiva com zoom
As teleobjectivas contêm em si um paradoxo: consideram-se como tal aquelas lentes cuja distância focal é menor do que a sua dimensão física. Isto tem uma explicação: se as teleobjectivas tivessem um tamanho correspondente à sua distância focal, seriam monstruosas. Uma lente de 1200mm teria um metro e vinte - fora a baioneta! Daí que sejam construídas com elementos convergentes e divergentes para diminuir o seu comprimento. A partir de, digamos, 80mm, as lentes são construídas de modo a que a sua dimensão física seja menor do que a distância focal. Há casos em que esta diminuição é conseguida através de construções especiais, como as lentes reflex, ou catadióptricas, que recorrem a espelhos internos para diminuir o tamanho, obtendo distâncias focais elevadas com uma construção que não ultrapassa a dezena de centímetros mas cujo desempenho óptico é sofrível.
Em termos práticos, tudo isto resulta numa especialização do uso das lentes. Quando, por ex., se fotografam paisagens, as lentes indicadas são as grande-angulares, uma vez que só estas permitem obter uma largura da imagem conforme ao enquadramento pretendido. As grande-angulares têm o efeito de favorecer a sensação de profundidade, uma vez que tendem a fazer convergir as linhas direitas em diagonais. Por vezes vejo gente tentando fotografar paisagens com teleobjectivas, o que é um erro: antes de mais, porque estas lentes têm ângulos de visão reduzidos, pelo que são incapazes de exprimir a sensação de amplitude no plano horizontal; depois, porque comprimem a imagem em profundidade, diminuindo as dimensões relativas entre os motivos mais próximos e os mais distantes. Por muito paradoxal que isto possa parecer, a dimensão da imagem de uma teleobjectiva é menor que a de uma grande-angular; embora a teleobjectiva amplie o motivo focado, fá-lo à custa das dimensões de largura e de profundidade.
Lente zoom 18-135
Há também uma questão importante, que é a da proliferação das lentes zoom. Há lentes zoom grande-angulares, teleobjectivas e «normais» (uma classificação intermédia pouco relevante, algures entre os 40 e os 80mm), mas algumas destas lentes de distância focal variável cobrem distâncias que, no plano teórico, permitem ter uma grande-angular e uma teleobjectiva numa só lente (por ex. 18-135mm). Estas zoom têm a vantagem resultante desta combinação, permitindo captar imagens de diferentes dimensões a partir da mesma distância em relação ao objecto sem ter de trocar lentes, mas com o efeito perverso de os defeitos típicos de umas distâncias focais se repercutirem nas outras. Há aberrações da imagem típicas das grande-angulares que se manifestam quando a lente é usada como teleobjectiva, e vice-versa. Para eliminar estes defeitos são necessárias correcções ópticas que encarecem as lentes, pelo que não surpreende que os verdadeiros fotógrafos tenham vastas colecções de lentes de modo a cobrir o maior número possível de distâncias focais com lentes prime, i. e. de distância focal fixa.
Deste modo, o ideal é termos lentes de distância focal fixa para cada aplicação. Simplesmente, isto não é muito prático e, a menos que planeemos as nossas sessões fotográficas de modo a usar apenas uma ou duas lentes, teremos de estar preparados para mudar rapidamente as lentes - este é um procedimento que tem de ser o mais rápido e preciso possível, de maneira a que não entre sujidade no compartimento do sensor - ou aceitar os compromissos de qualidade da imagem que os zoom implicam. Quando experimentei a lente 14-42, senti-me intensamente frustrado com uma lente que é demasiado lenta para grande-angular e que induzia os piores defeitos das teleobjectivas nas distâncias focais mais longas. Foi nesse dia que compreendi por que razão os entendidos gostam tanto de lentes prime.
Há, à custa desta especialização, uma quantidade incrível de tipos de lentes no mercado. O ideal é simplificar, sem contudo cair na asneira de pensar que uma zoom pode ser uma solução 2 em 1. O ideal é ter uma grande-angular (à volta de, digamos, 25mm), uma lente «normal» - cerca de 50mm - e uma teleobjectiva, sempre que sentirmos a premência de fotografar aves ou fazer retratos. Esta selecção chegará para manter o fotógrafo satisfeito - pelo menos por algum tempo...  

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Obter nitidez na focagem

Hoje reparei, ao consultar o Statcounter com que equipei este blogue, que há muita gente a procurar os meus textos através do Google à procura de indicações práticas, como qual é a melhor hora para fotografar ou como manter a focagem nítida. Isto significa que já não posso olhar este blogue como um veículo do meu diletantismo, uma vez que tenho a responsabilidade de dar indicações correctas a quem o consulta. Tenho o dever, para quem veio ter a esta página em busca de conhecimento, de fornecer informações precisas, que não induzam em erro. Apesar de haver áreas francamente subjectivas, dependentes do gosto de cada um, há aspectos que são suficientemente objectivos. A nitidez da focagem é uma delas.
Quando o tema é a focagem, há que dizer, antes de mais, que esta depende da abertura e da profundidade de campo. Já me referi a isto por diversas vezes, designadamente aqui e aqui. Por outro lado, embora o normal seja querer fotografias nítidas em toda a extensão da imagem, isto nem sempre é possível ou desejável. É relativamente fácil obter uma focagem homogeneamente nítida ao longo de toda a imagem com lentes de distância focal reduzida, como as grande-angulares, porque a sua profundidade de campo (*) é relativamente extensa. Como a profundidade de campo se reduz à medida que aumenta a distância focal, nas teleobjectivas é mais difícil manter uma focagem homogénea. Isto é algo que tem de se aceitar como uma inevitabilidade: as lentes com mais de 80mm não são concebidas para manter uma nitidez constante ao longo da imagem. Estas lentes servem, acima de tudo, para comprimir perspectivas, de maneira a fotografar objectos distantes, e não para obter uma visão panorâmica (como as grande-angulares). Isto implica um compromisso em termos de concepção óptica, com o resultado de a focagem se concentrar num determinado ponto e deixar tudo o resto desfocado.
Exemplo de compressão da perspectiva: a estátua e o edifício por trás parecem estar quase no mesmo plano, quando na realidade distam mais de 300 metros um do outro. A teleobjectiva diminui a percepção de profundidade.
E o que se entende por «comprimir perspectivas»? As teleobjectivas diminuem as dimensões de largura e profundidade; como se destinam a obter grandes planos de motivos longínquos, o seu ângulo de visão é diminuto - e tanto menor quanto maior a distância focal -, pelo que a largura da imagem obtida é bastante reduzida. Por outro lado, a noção de profundidade dada pela dimensão de uns objectos relativamente a outros é consideravelmente menor que nas grandes-angulares.
Como referi, esta é uma questão de concepção das lentes; como a teleobjectiva é concebida para ir buscar objectos distantes, é um compromisso aceitável que ela não foque o espaço entre a câmara e o motivo, nem o que está para lá deste último, assim obtendo o máximo de nitidez no plano em que a focagem incide.  
Há, contudo, uma maneira de manter a nitidez da imagem entre o plano mais próximo e o mais afastado; simplesmente, esta técnica implica compromissos que o fotógrafo pode ou não considerar aceitáveis. A maneira de conservar a nitidez em toda a extensão da imagem com uma teleobjectiva é reduzir a abertura para próximo do valor mínimo. Simplesmente, a redução da abertura diminui a quantidade de luz que atinge o sensor, pelo que a maneira de compensar esta menor exposição é diminuir a velocidade do disparo. E nós já temos obrigação de saber que o resultado de velocidades de disparo lentas é fotografias tremidas. (E não há estabilização de imagem que lhes valha!) Com efeito, as teleobjectivas são concebidas para trabalhar com valores de abertura elevados, uma vez que, pela sua própria concepção, são lentas: as suas aberturas mínimas começam, regra geral, em f4 (**). Há também a possibilidade de aumentar o ISO, mas já sabemos que há um preço a pagar na quantidade de ruído presente na imagem. Tudo isto significa que é impossível obter uma nitidez homogénea com uma teleobjectiva sem recurso a um tripé, ou pelo menos a um suporte estável (como quando vemos fotógrafos com as suas enormes teleobjectivas pousadas sobre o próprio saco do equipamento).
Imagem a 100mm de distância focal. Foi necessário regular a abertura para f11 para manter a nitidez em todos
os planos Note-se a escassa largura da imagem, consequência de um ângulo de visão reduzido.
Contudo, nem tudo é mau quando se trata de fotografar com lentes de profundidade de campo reduzida, como as teleobjectivas: estas são as melhores lentes para a focagem selectiva, em que apenas uma parte da fotografia surge em foco. Por vezes é mais importante conhecer e dominar esta técnica do que tentar obter uma nitidez homogénea ao longo da imagem.
Na fotografia como em qualquer outro aspecto da vida, não se pode ter tudo: não podemos tirar fotografias com um ângulo de visão amplo com uma teleobjectiva, nem captar motivos distantes com uma grande-angular. Nenhuma lente  - nem as zoom - pode fazer tudo bem. As lentes para fotografia são o resultado de uma evolução que conduziu a uma cada vez maior especialização, havendo lentes específicas para ângulos abertos e outras para grandes distâncias. Por outro lado, há limites impostos pelas próprias leis da óptica: se focarmos o olhar num ponto distante, tendemos a perder a percepção de tudo o que está em volta (mesmo que não nos apercebamos). Por que haviam as lentes de ter um desempenho melhor que os nossos olhos? Do mesmo modo, é impossível escapar ao facto de que o ângulo de visão das lentes é tanto menor quanto maior a distância focal, e que a profundidade de campo varia na proporção inversa da distância focal. Uma solução para evitar a frustração é encarar estas realidades como factos da vida e usar cada lente - ou, no caso das zoom, cada distância focal - de acordo com o que pretendemos, estando preparados para aceitar os respectivos compromissos. Como disse, não se pode ter tudo - tal como não podemos querer que um automóvel desportivo tenha o conforto de uma limusina, ou que esta curve com a precisão de um carro de competição. Mas podemos escolher os melhores compromissos.
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(*) A profundidade de campo é a distância ao longo da qual a imagem se mantém nítida.
(**) Há teleobjectivas com aberturas amplas - da ordem dos f2.0 ou f2.8 -, mas são extremamente caras e volumosas.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Estabilização da imagem

Como é possível não gostar de uma câmara cujos criadores pensaram em tudo? A Olympus E-P1 tem a característica espectacular de poder ser usada com as lentes da série OM, cuja reputação é elevadíssima (e merecida: eu posso confirmá-lo - duplamente). Simplesmente, o simples facto de se poder montar lentes de focagem manual redundaria em muito pouco se não existissem funções para melhorar o desempenho dessas lentes numa câmara digital. Uma delas já mencionei: é a função MF Assist, que amplia uma área da imagem entre 7X e 10X. Outra é a possibilidade de regular o estabilizador de imagem para a distância focal da lente.
Convém esclarecer, antes de mais, que as Olympus são das poucas câmaras com estabilizador de imagem incorporado. Normalmente, a estabilização é feita na lente, o que tem a vantagem de permitir que a lente seja instalada em qualquer corpo, mesmo que este tenha estabilizador de imagem (que pode sempre ser desligado), mas não é mais eficaz. O estabilizador de imagem incorporado na câmara actua provocando um contra-movimento no sensor sempre que é detectado um movimento de amplitude anómala, ao passo que o sistema da lente funciona através de sensores piezoeléctricos de movimento aplicados a elementos ópticos flutuantes, que são ineficazes no caso de movimentos rotacionais, carecendo de um sistema de estabilização suplementar para compensar esta insuficiência. O pessoal da Canikon costuma referir-se desdenhosamente à estabilização no corpo, mas isso faz parte da mania de que sabem tudo e que só a Canon e a Nikon sabem fazer material fotográfico... 
Seja como for, o sistema de estabilização da Olympus é sensor-shift, movimentando o sensor em resposta a movimentos anómalos da câmara, e age em todos os planos (IS1), apenas no horizontal (IS2) ou apenas na vertical (IS3). Isso já eu sabia. O que desconhecia era que a eficácia do sistema pode ser ajustada conforme a distância focal quando se usam lentes de focagem manual, que não transmitem qualquer tipo de informação à câmara. Seleccionando o estabilizador de imagem no menu ou no super painel de controlo, surge uma barra na base do ecrã, na qual há uma quadrícula que permite seleccionar a distância focal da lente utilizada, à qual se acede premindo o botão da compensação de exposição (+/-) no topo da câmara. Esta função não se aplica às lentes «digitais», uma vez que, nestes casos, a câmara calcula qual a operatividade do estabilizador com base na informação da lente. As opções são imensas, incluindo todas as distâncias focais das lentes OM - o que inclui, evidentemente, 28mm e 50mm...
Esta função é extremamente interessante. Com efeito, a intervenção do estabilizador optimiza a relação entre a distância focal e a velocidade do disparo, de modo a que a imagem seja sempre nítida (*), desprovida de distorções causadas pela instabilidade da câmara e da lente quando seguras nas mãos. E as mãos tremem sempre um pouco, mesmo com a DSLR mais ergonómica. Ter estabilização da imagem no corpo da câmara é um benefício enorme, por permitir usar lentes não estabilizadas; que seja também possível ajustar o estabilizador a lentes como as OM é uma prova de que os cérebros em Shinjuku pensaram em tudo.
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(*) Nem sempre: o estabilizador de imagem não funciona no caso de movimentos extremos, e deve ser desligado no caso de a câmara ser montada num tripé, uma vez que pode mover o sensor para contrariar a oscilação causada pelo obturador, o que resulta numa dupla vibração que prejudica a nitidez da imagem.

sábado, 8 de outubro de 2011

O Bokeh

Por vezes é importante isolar o objecto fotografado do plano de fundo. Deste modo podemos concentrar-nos no motivo da fotografia sem que outros objectos compitam pela atenção do olhar. Para o fazer, o ideal é concentrar a focagem no objecto, deixando que o fundo surja desfocado. Esta técnica, denominada bokeh, não serve apenas o propósito utilitário de destacar o motivo na imagem; é também um instrumento criativo capaz de produzir imagens de enorme beleza. Com efeito, é mesmo a única forma de conferir criatividade àquilo que, de outro modo, seria uma imagem meramente documental.
Tecnicamente, não existe qualquer dificuldade na obtenção deste efeito. É uma questão de escolher a distância adequada - o bokeh é usado, essencialmente, em close-ups - e a abertura indicada. Tudo o que é necessário é afastar ou aproximar a câmara do objecto até que este surja perfeitamente nítido e o fundo esbatido e seleccionar o ponto de focagem no objecto que se pretende manter em foco. 
Tecnicamente, os requisitos são uma lente com uma distância focal elevada - pode ser uma teleobjectiva ou uma prime, mas não uma grande-angular -, uma vez que a profundidade de campo varia na proporção inversa da distância focal. Diria que os melhores efeitos se obtêm a partir de 50-100mm, sendo certo que esta distância se afere, não pelo valor indicado na lente, mas pela equivalência desta na câmara a usar: numa câmara como a minha, do formato micro quatro terços, a distância focal da lente é multiplicada por 2: uma lente de 50mm equivale a 100mm. Numa reflex com sensor APS-C, a equivalência é de xX1,58, pelo que a mesma lente de 50mm equivale a 79mm.
Este efeito, por depender largamente da abertura, é obtido, quer no modo de exposição A, quer no M (este último obriga a regular a velocidade do disparo). A abertura deve ser a maior possível, mas não tão grande que torne a imagem sobreexposta, o que a deixaria plana e indefinida. Aberturas entre f2 e f4 dão os melhores resultados, com a vantagem de se poder usar velocidades de disparo elevadas.
Não é apenas com flores que o bokeh resulta: este efeito pode ser empregue com qualquer objecto, mas há um género de fotografia em que é especialmente interessante: o retrato. Aqui é essencial que o olhar se concentre no rosto, sem quaisquer elementos que desviem a atenção. Contudo, o fundo pode ser importante para conferir um contexto ao retrato - como na imagem acima, na qual o fundo informa acerca da luminosidade intensa da manhã. O que o fundo não pode é competir com o motivo principal, disputando a atenção do olhar.
Um último parágrafo para referir que o close-up, ou grande plano, não se confunde com o macro: este último é um modo de ampliação de um motivo para além da dimensão que o olhar permite. O macro exige lentes específicas, não sendo possível obtê-lo com lentes convencionais. Algumas câmaras incluem, no selector de modos de exposição ou num menu, um comando macro, geralmente assinalado por uma flor, mas os resultados não são os mesmos que aquilo que se pode obter com uma lente macro. Acresce que este modo não é o indicado para close-ups e retratos: a única maneira de obter um bom bokeh é a que indiquei: escolher uma abertura ampla e aproximarmo-nos do objecto escolhido até que o motivo fique em foco e o fundo esbatido.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Pensar

Agora que já temos uma boa câmara, uma ou mais boas lentes e noções de composição e enquadramento, já temos condições para fazer grandes fotos. Ou não.
Fotografar exige um trabalho cerebral intensivo. Não basta olhar para uma pessoa ou objecto e tirar uma fotografia. Há que pensar, antes de mais, na composição: o que queremos que surja na imagem? E há que pensar, de imediato, no enquadramento: como queremos que aquilo que escolhemos surja na imagem? Algumas escolhas terão de ser feitas: vamos enquadrar apenas o motivo principal, ou outros? Vamos esbater o fundo para destacar o sujeito, ou manter tudo nítido? E onde vai o motivo surgir na imagem: ao centro? À esquerda? Em cima?
E, antes de tudo o mais, há que fazer um planeamento: onde vou tirar fotografias? A quê? A que horas? E, se for ao escurecer, devo ou não levar o tripé? E que lentes levo?
Depois há as opções técnicas. Ao contrário do que acontece com as compactas, com uma câmara séria não basta apontar e disparar: é necessário escolher a distância focal mais apropriada - o que tem consequências não apenas no tamanho relativo dos motivos, mas também na focagem - e as configurações da exposição mais apropriadas. Não há duas condições de luz iguais, e às vezes basta deslocarmo-nos alguns centímetros para que a exposição mude drasticamente. O que obriga a ser criterioso na escolha dos três valores que determinam a exposição: a abertura, a velocidade e a sensibilidade.
Mesmo com a exposição ideal - que é a que queremos, o que nem sempre coincide com a que o fotómetro indica -, há que ter em atenção outras configurações: a medição de luz, se houver na imagem disparidades muito grandes de luminosidade (pode-se determinar que a câmara meça a luz apenas numa área ou ponto), e o equilíbrio dos brancos. Esta função, que nasceu na era digital, ajuda a encontrar a temperatura da cor ideal para cada exposição. Normalmente, a selecção automática funciona bem, mas nem sempre: se, por ex., tirarmos fotografias de noite a motivos iluminados artificialmente, é natural que a câmara compense a falta de luz natural com valores de abertura maiores, o que deixa os motivos iluminados artificialmente sobreexpostos e satura excessivamente a temperatura da cor. Nestas condições, importa escolher bem qual a temperatura da cor indicada.
E, já depois de tirada a fotografia e descarregada para o computador, há um trabalho de edição que pode obrigar a novas escolhas: Será necessário cortar porções supérfluas da imagem, ou recortá-la para melhorar o enquadramento? Estamos satisfeitos com a tonalidade, o contraste, a nitidez e a definição? Podemos reduzir o ruído e corrigir uma eventual distorção causada pela lente? Tudo isto pode ser melhorado - desde que não estejamos a criar uma fotografia nova, adicionando o que não estava na imagem e adulterando o que os nossos olhos viram e entendemos ser merecedor de ser fotografado.
Não é minha intenção dizer que a fotografia é uma coisa complicadíssima, com laivos de esoterismo. Não é. Uma vez compreendida a exposição e dominada a técnica, tudo surge de uma maneira intuitiva e simples. A experiência tem um papel essencial nesta aprendizagem, pelo que nada substitui o tirar muitas fotografias até ficarmos satisfeitos com os resultados.

Entretanto...
Hoje este blogue atingiu 1000 visualizações. Obrigado a todos os leitores: isto constitui um enorme estímulo, e demonstra que o que escrevo não é em vão. Oxalá tenham tanto gosto nestas leituras como o que tenho ao escrever!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Experimentações

Experiência com a focagem selectiva
Já referi aqui que, em fotografia, nunca se deve ter medo de experimentar. As experiências não têm consequências negativas - não danificam a câmara, a lente nem o cartão de memória -, mas não experimentar pode ter o efeito de fazer o fotógrafo estagnar, conformando-se com um determinado nível de resultados.
Eu faço muitas experiências. Com um ano e dois meses de fotografia digital, e apenas cinco meses com uma câmara decente, é natural que encare a fotografia como um adolescente que descobre o prazer (não consigo acreditar que tenha escrito isto...). Faço muitas experiências: umas por tentativa e erro, outras já com um elevado grau de certeza quanto aos resultados. Experimento com a focagem, a abertura, a velocidade do disparo, o equilíbrio dos brancos e o ISO. Experimento até me dar por satisfeito com os resultados, mas por vezes decido experimentar mais um bocadinho - às vezes com êxito, outras vezes nem por isso. Não posso dizer que sou um fotógrafo experimental (ou melhor: experimentalista); na verdade, nem sequer sei se posso dizer que sou um fotógrafo. As minhas experiências são o resultado da curiosidade; são um meio para alcançar um fim - conhecer a câmara e as possibilidades da fotografia - e não um fim em si.
Quem diria que se podia tirar uma fotografia interessante da VCI?
Felizmente, algumas das minhas experiências têm resultados imensamente satisfatórios. Tomemos o exemplo da fotografia acima: aqui usei a câmara montada num tripé, com a teleobjectiva 40-150 (precisava de comprimir a perspectiva em largura) na distância focal mínima; a velocidade de disparo foi regulada, no modo manual, para 13", a abertura para f22 e a sensibilidade ISO para - sim, adivinharam! - 100. O fotómetro avisou-me que a fotografia estava subexposta em 2.3 EV, mas ignorei-o olimpicamente; a imagem tinha de ficar escurecida para que as luzes dos automóveis sobressaíssem. Para o equilíbrio dos brancos - que é uma regulação bem mais importante do que se possa pensar - escolhi Fluorescente 2, equivalente a 4000 Kelvins. Não ficou exactamente como esperava, mas considero esta, apesar de tudo, uma experiência bem sucedida que me confirma que vale a pena fazer experiências.

sábado, 1 de outubro de 2011

Fotografando aves

Fotografar aves no seu habitat não é tão fácil como parece. Antes de mais, é extremamente difícil convencê-las a posar para nós. Geralmente estão de costas voltadas, ou numa posição que nos obriga a fotografar a contra-luz, e não têm a noção de que o lugar onde pousaram é péssimo como plano de fundo. Como modelos, as aves são um pesadelo. Ainda bem que não me dedico a fotografá-las. Daria em doido. Não é por acaso que os ornitólogos têm todos aspecto de excêntricos.
O facto de não me dedicar a este tipo de fotografia não significa que não o experimente. O facto de me faltar uma lente apropriada também não me demoveu de tentar algumas fotografias. Afinal de contas, basta-me caminhar meio quilómetro a partir de casa para estar num local conhecido pela diversidade da fauna - o estuário do Douro. Daí a querer tirar fotografias de aves foi um pequeno passo que transpus esta manhã.
A primeira desilusão, quando procurei as garças-reais mais fotogénicas, foi descobrir que a lente 40-150 não tem alcance suficiente para captar os motivos do modo como eu queria. Precisava, provavelmente, da superzoom 70-300 para ter mais ampliação e comprimir um pouco mais a perspectiva. (As fotografias que ilustram o texto são crops das fotografias originais.)
Outra curiosidade que aprendi nesta sessão foi a de que a focagem automática não funciona como deve ser. Pelo menos com esta lente. Este é um problema que já me tinha acontecido quando tinha a compacta: a imagem surge com uma espécie de halo à volta do motivo focado. Consegui resultados melhores com um modo misto de focagem manual e automática, em que foco a imagem manualmente e a câmara dispara em modo de focagem automática. (Este modo chama-se qualquer coisa como «MF+S-AF», ou coisa parecida.)
Depois desta primeira experiência, penso poder chegar às seguintes conclusões:
1. Equipamento: para fotografar aves é necessária uma lente com mais de 300mm de distância focal efectiva. As aves são, em geral, tímidas, e tendem a fugir se um ser humano se aproximar demasiado. Daí a necessidade de manter grandes distâncias e de usar lentes com um factor de ampliação (zoom) elevado. 
2. Configurações da câmara: as fotografias devem ser tiradas com um valor ISO da ordem dos 400 ou superior, de modo a poderem usar-se velocidades de disparo altas com aberturas estreitas. Se possível, deve ser usado um tripé - a menos, claro, que se queiram fotografar aves em pleno voo. Neste último caso, deve usar-se o disparo sequencial e a função que é activada por aquele botão misterioso com as letras AEL/AFL (AFL é as iniciais de Auto Focus Lock) ou o modo de focagem contínua.
3. Local: qualquer local com muita passarada. A menos que se seja um ornitólogo consumado, daqueles que sabem que nos bosques de árvores X há mais abundância de pássaros Y que nos bosques onde prevalecem árvores Z, convém escolher locais onde se saiba que existe grande diversidade de aves. Os estuários dos rios costumam obedecer a este requisito.
4. Altura do ano: os meses de Outubro a Maio são os mais interessantes. Portugal é um país com um clima que atrai muitas aves de arribação, pelo que é fácil encontrar espécies relativamente raras: garças-reais, corvos-marinhos, flamingos, etc.
5. Altura do dia: fica ao critério do fotógrafo captar as aves com uma luz mais, digamos, objectiva - caso em que qualquer hora do dia serve -, ou procurar o lusco-fusco para obter imagens mais interessantes. O que me parece de evitar é aqueles dias em que o céu está nublado por todo, em que as nuvens deixam ainda passar bastante luz, porque o céu tende a surgir branco na imagem. O nevoeiro, se for baixo, pode ser usado com bom efeito.
Um último conselho: eu não usaria fato, nem sapatos de sola de couro, para fotografar aves. Preferiria roupas que pudesse sujar sem complexos. Uma vez que é extremamente difícil convencer as aves a posar para nós, pode ser necessário caminhar por terrenos lodosos ou extremamente escorregadios, como o que encontrei hoje - pedras revestidas de pequenas algas. Não deve ser uma experiência agradável alguém estatelar-se no chão segurando mais de €1000 de equipamento nas mãos, mas essa eventualidade existe - tal como a de termos de nos deitar de bruços sobre terrenos poeirentos para apanhar um bom ângulo. Não é necessário exagerar na indumentária: nada de coletes (são ridículos), nem botifarras de 10 quilos. Basta uma T-shirt, uns jeans antigos e sapatilhas (e um blusão impermeável no Inverno). O que é obrigatório é proteger bem o equipamento, sendo importante ter um bom saco.
E, acima de tudo, é necessária muita paciência. E este é um dos requisitos que me leva a não ser um grande adepto da fotografia ornitológica...