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O texto anterior pode ter deixado a impressão de que a focagem manual é excessivamente complicada, mas não é. Até há vinte anos atrás, a focagem manual era a única disponível, e já havia muita gente a tirar fotografias. A evolução é que nos tornou preguiçosos, e esta preguiça que a era digital nos trouxe dispensou-nos, até, de tentar compreender como funciona uma câmara, i. e. quais os processos ópticos e mecânicos que permitem a captura de imagens.
No caso concreto da focagem, tudo o que o fotógrafo casual dos nossos dias precisa de saber é que a câmara vai focar sozinha quando se pressiona o botão do disparo até meio. Alguns até não sabem deste pormenor e carregam de imediato no botão até ao fundo, sem dar tempo à câmara para encontrar um ponto de focagem. Este tipo de (des)conhecimento não me serve. Eu gosto de saber como as coisas funcionam. Nesse aspecto, a compra da minha lente medieval da era analógica fez-me compreender melhor a focagem.
Em fotografia, a focagem é o fenómeno óptico pelo qual um objecto visto através da lente adquire nitidez. Não é necessário ser um Cornelius Drebbel para entender esta noção: nós fazêmo-lo a todo o dia e a toda a hora com os nossos olhos. A maneira como focamos os objectos que vemos, contudo, é completamente diferente da que uma câmara emprega: antes de mais, é impossível, ou excessivamente dispendioso, reproduzir numa câmara a visão binocular do ser humano. A lente é, na verdade, uma patética tentativa de reprodução da vista humana, um arremedo que nem sequer consegue chegar perto das propriedades ópticas dos nossos olhos. O olho é o instrumento óptico mais perfeito que existe, daí que a câmara - tal como o telescópio, os binóculos ou o microscópio - tenha de se contentar com o estatuto de mero complemento da visão humana. De resto, nenhuma câmara consegue o feito dos nossos olhos - a focagem instantânea. Não há lente que consiga superar o olhar neste aspecto: olhamos para algo, e depois olhamos para outro objecto: o nosso olhar foca instantaneamente. Enquadramos um objecto no visor da câmara, e depois enquadramos um outro: a câmara tem de se ajustar, automaticamente ou através do fotógrafo, às novas circunstâncias de luz, o que demora bem mais.
A focagem, entendida assim como o fenómeno óptico pelo qual um objecto visto através da lente adquire nitidez, depende de dois factores: a abertura e a profundidade de campo.
A abertura consiste, em termos simples, na quantidade de luz que penetra na lente. Esta quantidade é controlada através de um diafragma mecânico composto por um número determinado de lâminas metálicas que, abrindo ou fechando, formam um orifício pelo qual a luz vai ser encaminhada, através dos elementos ópticos da lente, para o sensor ou filme; quanto mais afastadas do centro e próximas da periferia da lente as lâminas estiverem, maior será a quantidade de luz que entra na lente; inversamente, se as lâminas estiverem mais próximas do centro, o orifício pelo qual a luz passará será menor. Pensemos nos olhos, mas desta vez os de um gato: se os observarmos com atenção, veremos que, em condições de muita luz, as suas pupilas se reduzem a uma ranhura ínfima, enquanto que, quando a luz é reduzida, as pupilas dilatam ao ponto de quase ocuparem toda a parte exposta do globo ocular. Pois bem - com o diafragma, o fenómeno é o mesmo. Quando as lâminas do diafragma da lente estão recolhidas, dizemos que estão mais abertas, ou que têm um valor de abertura maior; e, quando expandidas, esse valor diminui. É isto que se entende por abertura, que, como sabemos, se mede por números f que variam na proporção inversa da abertura: quanto menor o número f, maior a abertura.
A abertura é determinante na nitidez da imagem: grandes aberturas permitem obter imagens nítidas em condições de escassa luminosidade, e vice-versa, mas não é apenas quanto à luminosidade que a abertura afecta a focagem. Uma abertura grande apenas consegue manter a nitidez num plano próximo. Para obter uma imagem nítida num plano distante, é necessário diminuir o valor da abertura.
A esta variação da nitidez conforme a distância chama-se, em fotografia, profundidade de campo. Pela sua importância e repercussões na focagem - i. e. na nitidez -, este é um assunto que será tratado na publicação seguinte.
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