sábado, 15 de outubro de 2011

Desconstruindo os mitos sobre lentes

Lente grande-angular
Para um neófito, a chegada ao mundo da fotografia é acompanhada por um sem-número de mitos e preconcepções que importa desfazer, sob pena de se laborar perpetuamente em erro. Estas ideias preconcebidas incidem, principalmente, sobre as lentes, o que é agravado pelo advento das compactas e das bridge, com as suas lentes únicas que cobrem uma gama de distâncias focais.
Vamos começar por aqui: o que é a distância focal?
A distância focal é aquela que os raios de luz que entram na lente percorrem até focar. Isto tem, desde logo, a implicação de o ângulo de visão ser tanto menor quanto maior for a distância focal, uma vez que, quanto mais curta for a distância, maior será a quantidade de luz projectada sobre o sensor, tornando a imagem mais larga. É por este motivo que o ângulo de visão diminui à medida que aumenta a distância focal: de uma lente fisheye de 8mm, com o seu ângulo de 180º, até aos 2º de uma 1200mm (ver diagrama abaixo). É também por este motivo que as lentes grande-angulares têm, em regra, aberturas maiores que as teleobjectivas.
Isto significa que a construção das lentes varia conforme a distância focal, sendo, por regra, tanto maiores quanto maior for a distância focal. O leigo pode ser tentado a pensar que uma lente grande-angular é uma lente fisicamente grande, pela inclusão deste adjectivo na denominação, mas esta noção não corresponde à realidade. As lentes grande-angulares são grandes quanto ao ângulo de visão; fisicamente, estão entre as mais pequenas. Há excepções: há lentes grande-angulares que, para evitar a distorção causada pelo ângulo amplo (i. e. para evitar o efeito de curvatura das fisheye), são construídas com um número maior de grupos ópticos, o que aumenta o seu comprimento. Um dos melhores exemplos desta construção é a nova Olympus 12mm/f2.0.
Teleobjectiva com zoom
As teleobjectivas contêm em si um paradoxo: consideram-se como tal aquelas lentes cuja distância focal é menor do que a sua dimensão física. Isto tem uma explicação: se as teleobjectivas tivessem um tamanho correspondente à sua distância focal, seriam monstruosas. Uma lente de 1200mm teria um metro e vinte - fora a baioneta! Daí que sejam construídas com elementos convergentes e divergentes para diminuir o seu comprimento. A partir de, digamos, 80mm, as lentes são construídas de modo a que a sua dimensão física seja menor do que a distância focal. Há casos em que esta diminuição é conseguida através de construções especiais, como as lentes reflex, ou catadióptricas, que recorrem a espelhos internos para diminuir o tamanho, obtendo distâncias focais elevadas com uma construção que não ultrapassa a dezena de centímetros mas cujo desempenho óptico é sofrível.
Em termos práticos, tudo isto resulta numa especialização do uso das lentes. Quando, por ex., se fotografam paisagens, as lentes indicadas são as grande-angulares, uma vez que só estas permitem obter uma largura da imagem conforme ao enquadramento pretendido. As grande-angulares têm o efeito de favorecer a sensação de profundidade, uma vez que tendem a fazer convergir as linhas direitas em diagonais. Por vezes vejo gente tentando fotografar paisagens com teleobjectivas, o que é um erro: antes de mais, porque estas lentes têm ângulos de visão reduzidos, pelo que são incapazes de exprimir a sensação de amplitude no plano horizontal; depois, porque comprimem a imagem em profundidade, diminuindo as dimensões relativas entre os motivos mais próximos e os mais distantes. Por muito paradoxal que isto possa parecer, a dimensão da imagem de uma teleobjectiva é menor que a de uma grande-angular; embora a teleobjectiva amplie o motivo focado, fá-lo à custa das dimensões de largura e de profundidade.
Lente zoom 18-135
Há também uma questão importante, que é a da proliferação das lentes zoom. Há lentes zoom grande-angulares, teleobjectivas e «normais» (uma classificação intermédia pouco relevante, algures entre os 40 e os 80mm), mas algumas destas lentes de distância focal variável cobrem distâncias que, no plano teórico, permitem ter uma grande-angular e uma teleobjectiva numa só lente (por ex. 18-135mm). Estas zoom têm a vantagem resultante desta combinação, permitindo captar imagens de diferentes dimensões a partir da mesma distância em relação ao objecto sem ter de trocar lentes, mas com o efeito perverso de os defeitos típicos de umas distâncias focais se repercutirem nas outras. Há aberrações da imagem típicas das grande-angulares que se manifestam quando a lente é usada como teleobjectiva, e vice-versa. Para eliminar estes defeitos são necessárias correcções ópticas que encarecem as lentes, pelo que não surpreende que os verdadeiros fotógrafos tenham vastas colecções de lentes de modo a cobrir o maior número possível de distâncias focais com lentes prime, i. e. de distância focal fixa.
Deste modo, o ideal é termos lentes de distância focal fixa para cada aplicação. Simplesmente, isto não é muito prático e, a menos que planeemos as nossas sessões fotográficas de modo a usar apenas uma ou duas lentes, teremos de estar preparados para mudar rapidamente as lentes - este é um procedimento que tem de ser o mais rápido e preciso possível, de maneira a que não entre sujidade no compartimento do sensor - ou aceitar os compromissos de qualidade da imagem que os zoom implicam. Quando experimentei a lente 14-42, senti-me intensamente frustrado com uma lente que é demasiado lenta para grande-angular e que induzia os piores defeitos das teleobjectivas nas distâncias focais mais longas. Foi nesse dia que compreendi por que razão os entendidos gostam tanto de lentes prime.
Há, à custa desta especialização, uma quantidade incrível de tipos de lentes no mercado. O ideal é simplificar, sem contudo cair na asneira de pensar que uma zoom pode ser uma solução 2 em 1. O ideal é ter uma grande-angular (à volta de, digamos, 25mm), uma lente «normal» - cerca de 50mm - e uma teleobjectiva, sempre que sentirmos a premência de fotografar aves ou fazer retratos. Esta selecção chegará para manter o fotógrafo satisfeito - pelo menos por algum tempo...  

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