Mesmo correndo o risco de ser repetitivo, porque já abordei estes assuntos, hoje parece-me importante deixar aqui algumas considerações acerca do ISO, que me parecem oportunas por causa da maneira como as pessoas o usam nestes dias.
O ISO, como sabemos, é o valor que indica a sensibilidade do sensor - ou do filme - à luz. ISO são as iniciais de International Organization for Standardization (como os anglo-saxónicos gostam de acrónimos, inverteram a ordem das duas últimas iniciais), que é a organização internacional que dimana as normas ISO, presentes em áreas tão diferentes como as dimensões dos pacotes de leite ou as normas de qualidade de produtos e serviços. (Os sistemas de qualidade das empresas, por exemplo, regem-se pelas normas da família ISO 9000.) Antes da adopção universal do standard ISO, a sensibilidade era também expressa em valores ASA (American Standards Association) ou DIN (Deutsches Institut für Normung), mas o carácter universal dos padrões ISO levou a que este prevalecesse.
O valor ISO exprime-se em passos (vulgarmente designados, na gíria fotográfica, por EV, iniciais de exposure value) que dobram o valor da sensibilidade a cada incremento. A escala de sensibilidades inicia, geralmente, em ISO 100, e ascende multiplicando o valor por dois: 100, 200, 400, 800, 1600, 3200, 6400, 12800. Algumas câmaras dividem o valor mínimo por 2, obtendo ISO 50, e outras atingem, mediante um modo especial, valores da ordem dos 102400 (e os fabricantes prometem não ficar por aqui).
Convém reter a noção de que os passos ISO são meras indicações, tendo um carácter aproximativo, de modo que um valor indicado na câmara como ISO 800 pode, dependendo do fabricante, ter variações e não corresponder ao real: pode, por ex., ser ISO 960. Alguém comparou a escala ISO de uma câmara ao velocímetro de um automóvel, e a analogia, embora um pouco grosseira, é essencialmente correcta. O facto de o velocímetro indicar um máximo de 230 Km/h não significa que o automóvel atinja realmente essa velocidade, e muito menos que deva fazê-lo!
Muitos principiantes terão pouca ou nenhuma noção do que é a sensibilidade ISO, pelo que cometem o erro de deixar que a câmara determine automaticamente qual a sensibilidade a usar em cada exposição. Isto pode ter um efeito detrimental sobre a qualidade da imagem, uma vez que o fotómetro, quando deixado ao seu livre arbítrio, irá escolher um valor ISO que será tanto mais alto quanto menos intensa for a luz. O que, como sabemos, se repercute na quantidade de ruído presente na imagem.
ISO 800, f2.8, 1/30, sem flash, redução do ruído do DxO Optics Pro 7 |
Para evitar o ruído, há que manter a sensibilidade ISO no valor mais baixo possível. Isto já todos sabemos, mas é importante ter esta noção em mente quando se fotografa. Se fotografarmos uma paisagem à noite, com a câmara montada num tripé, não devemos deixar o ISO no modo automático nem escolher valores demasiado elevados: nesta circunstância o ISO deve ser mantido no mínimo, optando-se por tempos de exposição longos e por uma abertura relativamente estreita. Os valores ISO muito elevados servem para fotografar em condições de escassa luminosidade, quando o uso do tripé é impossível ou não é prático (por ex. para fotografar interiores pouco iluminados) e o emprego do flash é inviável - em muitas igrejas é proibido usar flash -, mas mesmo nestes casos o valor ISO deve ser o menor possível: apenas o estritamente necessário para garantir tempos de exposição entre 1/20 e 1/60, de maneira a que não se produza arrastamento. Em regra, valores como ISO 800 poderão ser suficientes para assegurar que a fotografia não vai ter distorção por arrastamento. Outro caso em que o uso de valores ISO elevados se justifica é a fotografia de objectos em movimento em condições de escassez de luz (por ex. um evento desportivo nocturno); aqui o importante não é a qualidade da imagem em termos absolutos, mas captar o objecto usando tempos de exposição extremamente curtos, deste modo evitando o arrastamento. Em todo o caso, mesmo nestas circunstâncias a sensibilidade ISO deverá ser a menor possível - mesmo que este menor possível seja 6400 -, mas, neste caso, estamos diante de situações extremas em que o compromisso da qualidade é aceitável.
A evolução dos sensores tem vindo a permitir o uso de sensibilidades extremamente elevadas, o que muitos aproveitam para dispensar o tripé e o flash. Isto é uma asneira, porque o ruído vai necessariamente prejudicar a qualidade da imagem - mesmo que se use a melhor câmara do mundo. Muitas fotografias podem parecer isentas de ruído quando feitas com uma câmara de boa qualidade, empregando sensibilidades da ordem dos 6400 ou superiores, mas quando a imagem é ampliada o ruído torna-se evidente. A aparência da imagem pode ser aceitável quando a fotografia é visualizada em formato reduzido, mas tal só acontece porque os filtros de ruído da câmara estão activos. Ora, estes filtros não devem ser usados, porque a redução do ruído feita pelo processador da câmara é feita em detrimento da qualidade da imagem, suprimindo os pormenores subtis. A câmara deve ser usada sempre com os filtros desligados, tratando-se o ruído na edição. E mesmo o melhor programa de edição de imagem pode não ser capaz de impedir que o ruído interfira com a qualidade da fotografia: o mais habitual é que os contornos dos objectos sejam suavizados, destruindo assim a resolução que poderia ter sido obtida se o fotógrafo tivesse optado por um valor ISO baixo.
Deste modo, não há nada que substitua o tripé e o flash. Este último não serve apenas, como muitos imaginam, para fotografar à noite: serve também para eliminar as sombras, caso em que alude ao flash como «de preenchimento» (fill in). E serve, sobretudo, para evitar a distorção por arrastamento quando se fotografa em condições de luz escassa. Mas o flash tem um alcance limitado, iluminando apenas, na melhor das hipóteses, uma dezena de metros, pelo que nem sempre dispensa o tripé. Aliás, se repararem bem, mesmo os fotojornalistas presentes em jogos de futebol usam tripés - ou, pelo menos, monopés. Porque usam objectivas gigantescas, evidentemente, mas também porque sabem que a sensibilidade ISO não pode ser usada indiscriminadamente. Se os fotojornalistas usam o ISO comedidamente, por que havemos nós, os comuns mortais, de puxar o mais possível pelo ISO?
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