segunda-feira, 2 de julho de 2012

Em defesa dos fotógrafos profissionais

Por vezes, quando navego pelos comentários a artigos publicados em websites de fotografia, encontro opiniões que postulam (prevêem, predizem) o fim da fotografia profissional. Pessoas deslumbradas com os 41 MP do Nokia PureView 808, ou mesmo com a qualidade de imagem do iPhone, vêem nesta evolução o fim das câmaras fotográficas. Uma coisa leva à outra, e ei-los perorando acerca da desnecessidade de fotógrafos profissionais, já que qualquer um, com um bom telemóvel na mão, é capaz de fotografias fantásticas. Tudo isto é uma ilusão, e direi em breve porque penso assim, mas a verdade é que já vão havendo editores de publicações que vêem na proliferação de fotografias de qualidade aceitável na Internet uma forma de poupar dinheiro ainda mais engenhosa do que aquela que as nossas administrações regionais de saúde encontraram para poupar dinheiro com enfermeiros: em lugar de pagar a um fotógrafo profissional, encarregam um desktop publisher de recolher fotografias da Internet. Esta última circunstância, embora não vá acabar com os fotógrafos profissionais - há sempre jornais e revistas ditas de referência que são exigentes quanto à qualidade das fotografias, e não estou a ver o Público a resolver o contrato com o Enric Vives-Rubio -, pode contudo constituir uma fonte de privações e empobrecimento para muitos dos que se dedicam à fotografia e retiram dela o seu sustento. Mas isto não é mais do que um sinal dos tempos que atravessamos e de uma evolução perversa que leva ao sacrifício da qualidade em favor de uma poupança que, bem vistas as coisas, é ilusória, e de um abaixamento da exigência de qualidade das audiências. Porque haverá sempre lugar para a fotografia profissional e para a qualidade.
As opiniões a que me referi no início são formadas por pessoas que, quer por serem muito jovens e terem ainda noções muito rudimentares sobre fotografia, quer por serem pouco exigentes, quer ainda por simplesmente não saberem do que estão a falar, não sabem distinguir uma boa fotografia de uma fotografia mediana. Entendem que uma fotografia serve meramente para fornecer uma informação visual, daí que não seja necessário mais do que apontar e disparar para obter o efeito pretendido, mas isto é esquecer que a fotografia - mesmo aquela que surge nos órgãos de informação - é muito mais do que um mero meio de informação. E - o que é absolutamente crucial - esquecem que, assim como há regras para fazer fotografias, também as há para ver fotografias. E a apreciação de uma fotografia é algo universal: todos, sejamos ou não conhecedores de fotografia, sabemos identificar uma má fotografia, a qual produz uma sensação de desconforto visual e intelectivo (ainda que não sejamos versados em fotografia). O público não é tão ignorante e inexigente como alguns querem que pensemos. Por outro lado, por serem tão iludidos pela aparente qualidade fotográfica dos novos telemóveis, aqueles opinadores esquecem que o equipamento é apenas parte da história. Não são os 41 MP do Nokia 808 que vão substituir um olhar treinado e uma aptidão forjada durante muitos anos de prática e de estudo - já disse aqui, por várias vezes, que uma pessoa tem de estudar para ser um bom fotógrafo -, nem é verdade que as fotografias feitas por um telemóvel sejam tão boas como aparentam. Um telemóvel é completamente inútil para fotografar um evento dentro de portas com iluminação ténue, como por ex. um casamento. Os níveis de ruído e a inaptidão para regular manualmente a sensibilidade, o tempo de disparo e a abertura precludem o uso de um telemóvel nestas circunstâncias. E este é apenas um exemplo entre muitos. Futebol e Fórmula 1 com um telemóvel? Ridículo!
Também eu me iludi quando comecei a fotografar. Tal como os que venho referindo, também imaginava que uma câmara compacta era tudo quanto bastava para fazer grandes fotografias: afinal de contas, quando estamos diante de imagens digitais, tudo se resume à resolução e ao pixéis, sendo a câmara indiferente... Nada mais errado, evidentemente, mas a verdade é que, quando se começa, não se sabe nada. A realidade mostrou, no meu caso particular, ser bem diferente do que especulava há apenas dois anos atrás, quando imaginava não haver diferenças entre uma 1D e a minha compacta, com a qual poderia fazer fotografias como um pro... que ilusão patética. Mas suponho que é preciso passar por esta fase.
Não, nada substitui uma boa fotografia. E, já agora, um bom fotógrafo. E, contudo, acredito que há muitos fotógrafos profissionais que se ressentem de um volume de trabalho menor por causa dos iPhones e dos contadores de botões nas editoras. Como sou um profissional independente, sei bem o que isto é - mas acredito que um dia esta loucura da austeridade imposta pela chanceler Merkel e pelas agências de rating vai acabar e tudo vai voltar ao normal, e vamos todos poder apreciar fotografias de qualidade nos nossos jornais e revistas e contratar bons fotógrafos para os nossos casamentos, baptizados e comunhões (ou bar mitzvahs, que este não é um blogue religioso ou excludente). Ou se calhar não...   

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