sexta-feira, 11 de maio de 2012

Morrer a fotografar

Bernardo Sassetti por Pedro Cunha
Morreu Bernardo Sassetti, um dos nossos mais brilhantes pianistas. Morreu enquanto fotografava, ao cair de uma falésia no Guincho.
A sua morte veio lembrar-me que, por vezes, se correm riscos excessivos por uma boa fotografia. É verdade - até eu já me coloquei em risco, quando decidi fotografar nas rochas da praia de Lavadores, perto do Cabedelo (o do Porto, não o de Viana do Castelo). Devo reconhecer que foi uma loucura: o vento estava incrivelmente forte, a famosa nortada que bate a costa do norte de Portugal; e as ondas, embora não fossem muito altas, eram ameaçadoras, porque a maré estava a subir. Confesso que tive medo: meses atrás, um jovem tinha morrido naquelas imediações, se não mesmo naquele lugar. O seu corpo só foi encontrado três dias depois. O caminho que levava ao local onde fotografei era íngreme e ligeiramente escorregadio, mas escolhi um espaço largo e estável; o tipo de fotografia que fui fazer exigia pouca luz natural, pelo que tive de regressar ao carro em plena escuridão. Mesmo se tinha uma lanterna para iluminar o caminho, algo de muito mau podia acontecer. E, com uma mochila de cinco quilos às costas, seria difícil reagir.
Loucura? Talvez, mas quando se gosta de fotografar, por vezes incorre-se em comportamentos arriscados. No fundo, sente-se sempre que vale a pena - ainda que as fotografias que fiz nesse local não tivessem sido nada de particularmente espectacular.
Fazer fotografia, contudo, não é algo tão importante que mereça o sacrifício da vida. Compreendo que um fotógrafo profissional corra riscos - o nosso João Silva é um exemplo -, mas um estrito amador deve tomar todas as precauções possíveis e agir com a maior prudência. E, sobretudo, deve pensar muito bem nos perigos que certos locais constituem. Uma boa fotografia não deve ser paga com a vida. Não faço ideia quais foram as circunstâncias que levaram B. Sassetti a escolher um local que era considerado perigoso; tenho a certeza, contudo, que o que se via dali era merecedor de uma boa fotografia. Não quero, de forma alguma, criticar a sua atitude - provavelmente, nas mesmas circunstâncias, teria feito exactamente o mesmo -, mas penso que a sua morte deve servir para que nós, amadores da fotografia, reflictamos antes de escolher os locais para fotografar.
As minhas condolências à família e amigos de Bernardo Sassetti (1970-2012). O mundo musical português, que não é particularmente rico, ficou ontem privado de um dos seus melhores membros. Por amor à fotografia. 

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