domingo, 17 de junho de 2012

Dúvidas

Estou cansado de fotografar e de escrever sobre fotografia. É um estado de espírito que não se funda em nenhum acontecimento em especial, mas tem a sua causa numa saturação que me leva a pensar se não terei ido longe demais na minha entrega à fotografia. Na verdade, desde Abril deste ano apenas fiz uma fotografia que me satisfez inteiramente. Dou por mim a sair para fotografar, não por ter uma ideia ou um objectivo em mente, mas por não ter nada melhor para fazer. O que é o antónimo do prazer de fotografar; é fotografar por desfastio, e nada de bom pode sair daqui. 
Estou também cansado de escrever: preferia ter mais gente a ver as minhas fotografias do que a ler os meus textos, mas é o oposto que acontece. (O que provavelmente significa que escrevo melhor do que fotografo.) Os textos mais lidos deste blogue são aqueles que menos têm que ver com a criação fotográfica, como os que escrevi sobre o direito aplicável à fotografia. Fico muito satisfeito por saber que as pessoas que lêem este blogue encontram alguma utilidade nos seus textos, mas isto não me satisfaz: ninguém percebe (percepciona) este blogue como um espaço aberto, e são muito poucos os que participam com comentários - o que é o oposto daquilo que pretendia quando comecei o ISO 100: um blogue que servisse para trocar ideias e que ajudasse os leitores - e a mim mesmo - a evoluir enquanto fotógrafos amadores. Em lugar disto, incorro frequentemente no risco de ser confundido com alguém que escreve sem saber muito bem o que está a dizer - apesar de sempre ter tentado evitar que isto acontecesse, porque tenho uma consciência demasiado aguda das minhas limitações.
Quanto às minhas fotografias, tenho notado, nas últimas semanas, que tenho feito muito pouca coisa que valha a pena, apesar de fotografar cada vez mais. Estou mesmo um pouco cansado de fotografar, e cada vez mais insatisfeito com os resultados que obtenho.
Tudo isto leva-me a pensar se vale a pena persistir. Leva-me a perguntar-me se as minhas fotografias têm algum valor artístico, ou meramente estético, que as distinga dos milhares de milhões de fotografias que todos os dias são feitas por fotógrafos amadores. E, quando comparo o que faço com fotografias de Enric Vives-Rubio, Paulo Alegria, António Pedrosa e tantos outros fotógrafos, vejo que as minhas fotografias são desprovidas de substância, sem uma mensagem que diga algo a quem as vê. Algumas serão, quando muito, agradáveis, mas isto não me basta.
Talvez tenha apontado para algo demasiado alto, algo que me é inatingível. É bem possível que, no meio de tanta técnica e preocupação com o equipamento e como usá-lo, tenha deixado para trás o que me levou a fotografar - querer traduzir em imagens a maneira como vejo o que me rodeia. Talvez seja esta maneira como olho para as coisas que não é suficientemente interessante, ou talvez o meu olhar não esteja suficientemente treinado.
Foto de António Pedrosa, da série Iraquianos, vencedora do Prémio Estação Imagem|Mora 2012
Ou talvez não queira tornar-me num fotógrafo. Ontem - sábado, 16 de Junho - fui assistir à inauguração da exposição das fotografias premiadas pela Estação Imagem no Centro Português de Fotografia. Senti-me completamente deslocado, sem nada que me identificasse com as pessoas que ali estavam. Notei que os fotógrafos que estavam presentes eram pessoas mais interessadas em exibir o seu equipamento do que em apreciar as fotografias expostas. E eu não quero ser assim, nem quero olhar com sobranceria quem tem equipamento inferior ao meu ou ostentar uma condição de grande fotógrafo que não é a minha. As pessoas que estavam verdadeiramente interessadas na exposição não levavam câmaras - ou, quando muito, usavam os seus telemóveis para fotografar. Em contrapartida, o vencedor do prémio, António Pedrosa, irradiava simpatia, genuinamente contente por mais este reconhecimento público. E não levou o seu equipamento. Não sentia qualquer necessidade de ostentar a sua condição de fotojornalista, à semelhança do que noto noutros profissionais que conheço. Para estes, os corpos e as objectivas têm a mera condição de utensílios de trabalho. As fotografias expostas são, como seria de esperar, excelentes. Eu gosto de ver fotografias de bons fotógrafos, embora o resultado seja, invariavelmente, o de reforçar as minhas dúvidas sobre se alguma vez serei capaz de fazer uma fotografia que seja com aquele nível de qualidade. Talvez não. Mas talvez seja insensato ter como ambição fazer fotografias comparáveis às de profissionais que têm oportunidade de ver pessoas e lugares tão diversos e variados - o que me é inacessível - e que têm uma formação que eu não tenho.
Back to basics - eis uma divisa que não me canso de repetir, mas não consigo pôr em prática. Jurei que ia voltar a fotografar em JPEG e com retoques mínimos das fotografias, e acabei fotografando RAW e a comprar um programa de edição de imagem ainda mais manipulativo que o Lightroom. E, quando tento fazer fotografias com alma, o que me sai é demasiado rebuscado e acaba por não atingir o objectivo. Já não consigo fotografar espontaneamente, e por vezes dou por mim a tentar fotografar como outros o fizeram, em lugar de ser eu mesmo e de transmitir as impressões que eu senti quando vi determinada cena. O que é, convenhamos, um absurdo.
Talvez deva fazer um intervalo - passar algumas semanas sem fotografar e reformular completamente a maneira como faço fotografias. O que se estende aos textos que escrevo aqui. Isto não significa que tenha desistido de procurar melhorar a minha fotografia: até aqui, entendi que essa melhoria consistia no aprofundamento dos conhecimentos técnicos, mas estava errado. A melhoria que devo procurar é na temática, no conteúdo e na mensagem. Talvez esta pausa sirva para responder às minhas dúvidas.

4 comentários:

Anónimo disse...

Todo o criador tem um momento em que duvida das suas capacidades. De vez em quando temos que parar e fazer um «reboot». Acredite, sou ilustrador, desenhador, animador profissionalmente e sei bem o que quer dizer. Fotografo pelo prazer que isso me traz e é isso que deve fazer, sem objectivos. è importantíssimo ver o trabalho de outros fotografos mas tentar fazer o que eles fazem é outra coisa completamente diferente. Costumo postar fotografias num site que conhece de certeza- dpreview. Dá-me um prazer imenso que outros amantes de fotografia avaliem o meu trabalho e votem de acordo. Ficar nos 10 primeiros lugares de um qualquer desafio enche-me de prazer. Não devemos medir-nos em relação a outros, se o fazemos acabamos por desistir porque «não chegamos lá». Descanse um bocado e volte À luta...e não deixe de escrever também.

OLM

Manuel Vilar de Macedo disse...

Obrigado pelas suas simpáticas palavras, OLM. Talvez o que necessite seja mesmo um par de semanas «sabáticas»!
Cmps

grouchomarx disse...

Isso e' photographer's block... :P

eu nao tenho qq pretensao, nem posso ter, por total inabilidade e falta de capacidade, pelo que nao padeco disso!

Quanto 'as visitas no site, e' facil, comeca a publicar fotos de bebes, caezinhos, "vedetas" do futebol, mensagens de amor&amizade do facebook etc e vais ver isto cheio de pessoal!!!

LOL

grouchomarx

Manuel Vilar de Macedo disse...

lol, grouchomarx, mas nota que não me queixo do número de visitantes. É da falta de comentários, de contributos.
Quanto à apreciação que fazes da tua própria fotografia, acho que estás errado... senão não tinha posto um link para o portostreetshooting!

Saudações "microquatrotercistas"