domingo, 13 de novembro de 2011

O controlo da medição

«Eu era um fotógrafo feliz antes de descobrir a medição» - exclamei para uma das colegas do workshop durante uma saída de campo no Sábado, 12 de Novembro, na estação de S. Bento.
E porquê? Não me entendi nada bem com o controlo manual da medição na minha primeira experiência. A medição é feita por um tirano que habita cada câmara fotográfica e que tenta impor os seus pontos de vista ao fotógrafo, reagindo mal quando é contrariado. Este tirano, de nome «fotómetro», é, como todos os da sua estirpe, particularmente estúpido: ele não percebe muito bem a luz que é reflectida pelos objectos, por isso parte do princípio que cada objecto apenas reflecte cerca de 18% da luz. É por isso que, quando tentamos fotografar motivos muito contrastados, a fotografia fica sempre mal exposta. Tomemos o exemplo de uma zona de sombra e de um céu azul sobre ela: se o céu fica bem exposto, a sombra fica escuríssima e os pormenores não se vêem; se a sombra ficar correctamente exposta, o céu fica branco! Decerto todos os fotógrafos se deram já conta disto. À parte o uso de filtros gradientes, que permitem restituir a tonalidade de uma parte da imagem (que podem não funcionar bem, a menos que haja um horizonte bastante linear), não há maneira de evitar isto. Como a medição feita pelo déspota assume que cada objecto apenas reflecte 18% da luz, ele clareia os tons escuros e escurece os tons claros. Um exemplo clássico é o de tirar uma fotografia a um objecto branco e a um objecto preto: ambos tendem a ficar cinzentos, porque o ditador acha que todos os objectos reflectem a mesma quantidade de luz.
O tirano tem, contudo, a magnanimidade de permitir que o fotógrafo determine o modo de medição. O padrão mais comum - o usado pela câmara de forma automática, por defeito - é o da medição matricial: a imagem é decomposta numa grelha e o ditador decide quais as áreas que devem ficar mais ou menos expostas em função da distribuição da luz. Isto funciona mais ou menos correctamente, mas não evita expor deficientemente os contrastes fortes porque a besta imunda não percebe que há objectos que reflectem a luz para além e aquém dos tais 18% que ela pensa serem os valores correctos. 
Para além desta medição matricial, há ainda a medição ponderada ao centro, ou medição parcial, que funciona muito bem quando o motivo está centrado, mas como o fotómetro, além de estúpido, é ignorante, não conhece a regra dos terços e parte do princípio que os fotógrafos também não, pelo que a medição ponderada ao centro só funciona bem se o motivo estiver a meio do enquadramento. Daí que o motivo possa ficar mal exposto se surgir num dos lados da imagem - tal como as boas regras de composição e enquadramento determinam. Em termos práticos, a medição ponderada ao centro só resulta bem em retratos e fotografias altamente estáticas.
Como Sun Tzu ensina na Arte da Guerra, conhecer o inimigo é meia vitória. Por isso o heróico resistente à ditadura do fotómetro tem um outro meio de enganar o déspota e combater a ferocidade do regime imposto pelo fotómetro: a medição pontual. Reparem, contudo, que é apenas meia vitória, e não a derrota total e sem prisioneiros do inimigo. Tudo o que a medição pontual faz é privilegiar a exposição num determinado ponto da imagem, correndo-se o risco de os motivos fora dessa área da imagem continuarem a ficar expostos deficientemente. É como se o tirano malvado, numa manifestação suprema de cinismo, nos desse a escolher entre sermos fuzilados ou enforcados. 
Se apontarmos para a zona subexposta, esta fica bem na imagem, mas as zonas sobreexpostas ficam completamente brancas. E vice-versa. Em todo o caso, a medição pontual permite-nos privilegiar a exposição de uma determinada zona da imagem, escolhendo aquela que queremos que fique mais bem exposta (que não é, necessariamente, a mesma que o ditador impõe). Como é que isto se faz? Hão-de encontrar, algures no menu da câmara - o tirano, cioso do seu domínio, não se atreve a ostentar um botão visível e acessível -, o modo de medição, com os símbolos diabólicos que ilustram este texto. O ponto (correspondente a 1% do enquadramento) onde é feita a medição pontual situa-se a meio do visor ou ecrã, por isso aponta-se a câmara de modo a que o que queremos bem exposto fique no meio, regula-se a abertura e a velocidade do disparo de modo a que a exposição fique correcta e reenquadra-se a imagem. Depois dispara-se. Se tivermos seleccionado uma área da imagem com fraca luminosidade, esta área vai ficar bem exposta - mas o resto vai ficar sobreexposto. E vice-versa. É, por isso, uma questão de escolha e de compromisso. Por vezes não se conseguem tirar fotografias perfeitas. Isto é algo que temos de aceitar - enquanto esperamos pela revolução que finalmente derrube o déspota maldito...

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