quinta-feira, 19 de abril de 2012

Como escolher lentes (1)

O título deste texto devia levar um ponto de interrogação. Na verdade, já cometi erros de palmatória na escolha de lentes, pelo que talvez não seja a pessoa mais indicada para dar conselhos nesta matéria. Os meus erros nasceram, acima de tudo, da ignorância de um principiante que bem teria agradecido palavras de aconselhamento, mas se esqueceu de as procurar. Felizmente os erros não saíram particularmente caros, nem são irremediáveis - mas redundam na posse de lentes de uso bem mais limitado do que imaginara quando as comprei.
A primeira coisa que devemos fazer, antes de comprar lentes, é saber ao certo para que as queremos. Por vezes fala-se em «lentes para paisagens» ou «lentes para retratos» e, embora à primeira vista estas classificações pareçam reducionistas e disparatadas, não o são: elas fornecem uma ideia quanto aos planos focais e aos ângulos de visão das lentes, o que é, desde logo, uma indicação útil desde que saibamos interpretar as nossas necessidades.
Isto significa que nós precisamos de lentes para cobrir determinadas distâncias focais e ângulos de visão diferentes (sendo que estes últimos variam na proporção inversa da distância focal). Uma lente de 28mm é boa para paisagens ou para fotografias de interiores e arquitectura, mas é péssima para retratos, flores e captação de objectos longínquos, que surgirão demasiado pequenos no enquadramento. E uma lente de 150mm é excelente para retratos e flores, mas não adianta de nada se quisermos fotografar paisagens com um grande ângulo de visão. Por outro lado, se queremos fotografar objectos correspondentes à dimensão que o nosso olhar transmite, não devemos usar nem uma nem outra das distâncias focais que exemplifiquei, mas sim as distâncias standard - entre os 45 e os 50mm. Não era por acaso que as câmaras dos anos 70 e 80 vinham equipadas com lentes - em kit ou fixas - destas distâncias focais: a Minolta 7S do meu pai tem uma lente de 45mm, e as Olympus OM podiam ser compradas com a lente 50mm. (Em ambos os casos, eram lentes com aberturas f1.8, o que mostra que o apetite por lentes rápidas não é recente.)
Note-se que se pode comprar lentes de distância focal fixa - as chamadas prime - ou zooms, e estas dão-nos, numa só lente - o que pode, à primeira vista, parecer vantajoso, mas nem sempre o é - uma gama de distâncias focais que pode ir de grande-angular a super teleobjectiva, como algumas 18-200 que pululam no mercado. Os zooms, contudo, levantam muitos problemas que levam alguns fotógrafos a virar-lhes as costas. 
Antes de mais, um zoom barato é, em regra, lento: a abertura destas lentes é geralmente estreita, e tanto mais quanto maior for o zoom que se faz. Uma lente destas pode ter uma abertura de f3,5 ou f4 na distância focal mínima e chegar a valores como f6,3 na máxima. Se a primeira não é particularmente problemática - f3,5, ou mesmo f4, não coloca grandes problemas -, já a abertura nas distâncias focais longas pode, se as condições de luz forem menos que ideais, tornar impossível fotografar segurando a câmara com a mão, uma vez que a velocidade do obturador tem de ser bastante reduzida para manter uma exposição correcta.
Outro problema dos zooms generalistas é o de apresentarem problemas de focagem. Hoje aconteceu-me isto: como tive uma redução considerável no meu volume de trabalho por ter perdido um part-time que mantinha, agora faço vida de reformado (mas sem receber reforma) e aproveito para fotografar mais. Fui até ao Jardim Botânico e, em vez de levar a lente de distância focal fixa que geralmente uso - a prime Olympus OM 50mm/f1.4 -, levei a 40-150mm/f4-5.6, uma lente zoom moderna de focagem automática. Quando a usei para fotografar flores, pretendendo manter a flor isolada com o desfoque do plano de fundo, a focagem automática falhava; apesar de seleccionar o ponto de focagem sobre o objecto que queria manter em foco, a lente fazia exactamente o contrário do que eu queria: desfocava a flor e mantinha o plano de fundo bem focado. Não adiantava aproximar-me ou afastar-me, nem fazer mais ou menos zoom: a certa altura desisti e optei pela focagem manual. Só então obtive os resultados que queria. Uma lente estúpida!
Se quisermos comprar um bom zoom, devemos estar preparados para gastar muito dinheiro. E este não cresce nas árvores (ou, quando cresce, as árvores estão sempre num pomar que não é o nosso). O que caracteriza um bom zoom é, antes do mais, o facto de manter uma abertura constante ao longo de toda a gama de distâncias focais: f2.8 é f2.8, quer se fotografe a 17mm ou a 50mm. Porque são estes zooms tão caros? Antes de mais, por imperativos de construção: manter uma abertura constante implica abdicar de compromissos usados para manter os preços baixos, pelo que os grupos ópticos e a estrutura do zoom são de muito maior qualidade, o que se repercute no preço e no volume - especialmente no diâmetro e peso - destas lentes. As lentes - todas elas - são um compromisso: não há lentes perfeitas. 
Acresce que os zooms generalistas, que abrangem distâncias focais que vão da grande-angular até à teleobjectiva, partilham dos defeitos comuns a ambas estas categorias: a distorção de barril e as aberrações cromáticas das grandes-angulares e a distorção convergente (pincushion) nas teleobjectivas. Uma das razões por que os zooms especializados são tão caros e volumosos é a necessidade de utilização de grupos ópticos cuja concepção permita corrigir ou minimizar estas aberrações. Além de que, por existirem mais partes móveis, as zoom são mais permeáveis a avarias e problemas de funcionamento que as lentes de distância focal fixa. 
Muitos poderão sentir-se entusiasmados com artigos e ensaios de lentes feitos pelas revistas e websites de fotografia. Embora alguns deles sejam fiáveis, há que ter muito cuidado com a interpretação das conclusões desses ensaios: Um zoom barato, digamos um Olympus 40-150 f4/5.6, pode receber a mesma nota técnica que uma Leica Vario-Elmarit, mas tal não significa que se equivalham em qualidade: a Olympus pode ser «altamente recomendada», mas é-o quando em confronto com lentes do mesmo preço e com características semelhantes. Se o teste fosse feito com uso de critérios absolutos, a Leica trucidaria a Olympus por completo. É muito difícil escolher uma boa lente, e a pior coisa que se pode fazer é avaliá-la pela publicidade ou pelos ensaios. Vale mais aconselharem-se numa loja especializada de confiança, como (aqui no Porto) a AFF e a Colorfoto. Evitem comprar online, a menos que tenham a certeza absoluta do que estão a fazer. E, sobretudo, não usem este texto como guia de compras, mas antes como um conjunto de sugestões ou referências, porque, apesar de ter por princípio escrever sempre com fundamento, sei pouco mais do que vocês... (continua)      

4 comentários:

Vitor disse...

Olá Manuel, excelente teu blog!
Estou começando a aprender sobre fotografia, tudo que leio no seu blog é muito válido pra mim.
Grande abraço
Vitor

Manuel Vilar de Macedo disse...

Obrigado, Vítor. Mas não se esqueça de ler estes conselhos com um grão de sal: há gente que sabe muito mais do que eu, e é com esses que se pode - e deve - aconselhar. O que aqui está são apenas dicas, mas ainda bem que as achou úteis.
abc

grouchomarx disse...

Bom post! só não concordo com o "evitem comprar online". Hoje em dia na amazon já nem os portes se pagam e tem uma politica de devoluções muito mais generosa do que em qq outro sitio, já par anao falar dos preços, claro.

grouchomarx

Manuel Vilar de Macedo disse...

Eu já comprei muita coisa via Amazon. O problema que vejo em encomendar online não é tanto a compra em si, e não discuto as políticas de devolução; o que desaconselho - e faço-o com base na minha experiência - é uma aquisição que não seja precedida de muita e boa informação sobre o item que se quer encomendar. Os conselhos de um profissional, numa boa loja da especialidade, podem evitar o aborrecimento de uma devolução. E a vantagem do preço é, por vezes, uma ilusão - especialmente se comprar através de uma loja de um país extracomunitário, como os EUA, porque nesse caso a mercadoria é taxada em território nacional. (E às vezes fica retida na alfândega durante uma eternidade!)