Soube-se na semana passada que Michael C. Woodford desistiu da luta pelo cargo de CEO da Olympus Corporation. Os bancos e accionistas japoneses fizeram-no abandonar a pretensão de ocupar de novo aquele cargo, apoiando o actual conselho de administração, no qual estão alguns dos administradores que aprovaram as práticas fraudulentas que fizeram o escândalo despontar. Embora o conselho esteja depurado dos principais mentores das manipulações contabilísticas, esta notícia mostra um espírito de encobrimento que ninguém esperava que se viesse a manifestar, atendendo à gravidade dos comportamentos denunciados por Woodford e às perdas que a Olympus Corp. sofreu com este escândalo. O normal seria que o conselho de administração fosse exonerado, mas o que aconteceu foi o oposto. Como notou Michael Woodford, no Japão nunca se ouviu uma palavra de crítica aos actos dos anteriores conselhos de administração, e Woodford acabou por ser tomado pelo malfeitor, o odioso whistleblower estrangeiro que arruinou o negócio de uma empresa japonesa.
Sabe-se, agora, que parte do capital da Olympus Corporation vai ser adquirido por um dos grandes grupos japoneses com interesses na área da imagiologia: FujiFilm, Sony ou Panasonic. Estes grupos têm sido reputados, nas notícias, como os salvadores da Olympus, o que não deixa de ser irónico, já que, por ex., a Fuji é uma concorrente directa - embora com um volume de negócios irrisório, quando comparado com a Olympus - no fabrico de material óptico de diagnóstico. A Sony e a Panasonic são também concorrentes na área da fotografia, embora esta não seja tão relevante e apetecível como a do equipamento de diagnóstico.
Que pensar de tudo isto? Antes de mais, é um péssimo exemplo. Se, no ocidente, estamos habituados a práticas fraudulentas nas grandes empresas, estamos também habituados a que o opróbrio caia sobre os autores das fraudes e a que estes sejam exonerados, e à acção das entidades reguladoras; no Japão, aparentemente, os autores das fraudes são protegidos pelos investidores institucionais. Isto é o que de pior pode acontecer num mercado desregulado e, se é certo que isto não poderia acontecer na Europa ou nos Estados Unidos sem que houvesse consequências, certo é que não deixa de ser um mau exemplo para o mundo. Os vigaristas sentirão que podem fazer o que entenderem sem que nada lhes aconteça. A pior faceta do capitalismo selvagem sobrevive e prospera no Japão. Esperemos que não se propague...
Quanto à possível aquisição de capital pela Sony, Fuji ou Panasonic, não me parece que ela corresponda ao imperativo patriótico de ajudar uma empresa conterrânea em dificuldades. Mais me parece uma forma de eliminar a concorrência a partir do interior. O optimismo que cheguei a sentir quanto à continuidade da marca de material fotográfico Olympus desvaneceu por completo com esta notícia. A Fuji é uma companhia a quem a divisão de equipamento de diagnóstico da Olympus interessa, pelo que poderá neutralizar a fatia de mercado da Olympus - mas pode também abandonar a sua própria produção e investir fortemente na Olympus. Só o futuro o dirá. A Sony e a Panasonic estarão, porventura, interessadas em encontrar um novo negócio no equipamento de diagnóstico, mas o que me preocupa, quanto a todas elas, é a subsistência da Olympus Imaging: não me parece que nenhuma delas queira manter no mercado uma marca concorrente - e nós sabemos o que a Sony fez quando adquiriu a Minolta. E não estou a ver a Panasonic abandonar o negócio das câmaras em favor da sua aliada no negócio do micro quatro terços...
O que mais me choca, no meio de toda esta confusão, é a impunidade com que tudo isto acontece. Em lugar de se correr com uma administração «podre até ao tutano» (como foi descrita no relatório dos auditores em Dezembro), esta é protegida pelos bancos e investidores. O tempo dirá com que propósitos. A novela ainda está longe de terminar.
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