sábado, 31 de dezembro de 2011

2012


Vem aí mais um ano. No fundo, mais um ano é irrelevante: o tempo é linear. Inventámos medições do tempo, mas este é um fluxo constante e irreversível. Os anos, meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos apenas servem para termos uma medida e nos situarmos no que de outra maneira seria um fluir infinito marcado pela luz solar e pelos ciclos climáticos. Que significado tem um ano? A cada ano que celebramos esquecemos o facto de irmos ficar mais velhos, de caminharmos inexoravelmente para a degenerescência e ficarmos uma medida de tempo mais próximos da morte. Visto assim, o ano novo não tem muito que celebrar...
Como se esta relatividade do tempo não fosse suficiente, o ano que chegará logo vem carregado de frustração e desespero. Prometem-nos um ano ainda pior que o anterior e dizem-nos que não nos é permitida qualquer esperança. Avançamos para a restauração da escravatura, para os salários miseráveis e a abolição dos direitos; o pouco que nos pagam - a nós, os que temos a sorte de ter trabalho - vai ser devolvido aos donos do dinheiro, que controlam tudo aquilo em que vamos ter de gastá-lo. Devemos conformar-nos - dizem eles - com uma vida que devemos viver para sermos produtivos, contribuindo para a riqueza deles, e que devemos viver com o mínimo possível e sem o amparo de um Estado que, refém dos donos do dinheiro, garante a salvação dos banqueiros e, progressivamente, abandona os súbditos nas mãos de uma caridade falsa e hipócrita.
Em 2012, devemos reflectir sobre o que fizemos - em que é que cada um de nós contribuiu - para chegarmos a isto. Mas devemos, também, reflectir naquilo que podemos fazer para que esta vida estúpida a que nos querem condenar possa mudar. E, mais que reflectir, devemos agir. Nenhum de nós está isolado; os nossos actos, por insignificantes que sejam, têm repercussões. Tal como uma praia se compõe de uma infinidade de grãos de areia, também cada um de nós compõe um todo e tem influência no destino do todo. Todos nós contribuímos para que o mundo chegasse a isto, e cabe a cada um de nós fazer algo para o mudar.
Um bom 2012 para todos.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 8: E a foto do ano é...

 Esta! Não tenho dúvidas: esta é a foto mais humana, mais terna, mais sensível que tirei. É uma fotografia que posso rever vezes sem conta sem me saturar, como se o sorriso da criança perdurasse para sempre e o olhar da rapariga me inquirisse sempre que vejo a fotografia. Já me referi a ela neste balanço, pelo que não me vou repetir. Apenas repito o que escrevi neste blog acerca desta fotografia no próprio dia em que a fiz: «Cartier-Bresson tem a Derrière la Gare de St. Lazare, Robert Doisneau tem aquela do beijo junto ao Hotel de Paris, Robert Capa a do soldado republicano a levar um tiro, Alberto Korda a do Che - e eu tenho esta! É a minha obra-prima.» Claro que não me estou a comparar a estes deuses da fotografia: estou apenas a hierarquizar esta imagem no conjunto das minhas fotografias, o que não é o mesmo e tem até uma certa dose de auto-ironia.
Esta é, contudo, a minha apreciação pessoal (e eu bem gostaria de saber o que os leitores pensam, mas nunca tenho comentários...). Os visitantes do meu flickr têm uma opinião diferente: para eles, a minha melhor fotografia é esta: 
Que hei-de dizer? Não é má... sinto-me até bastante orgulhoso dela, e foi um crime não a ter incluído nos textos anteriores (o balanço do ano era para ter apenas sete textos). Foi esquecimento, porque é uma fotografia de que gosto muito - mas falta-lhe a rapariga à esquerda. E o sorriso da criança, e a força daquela mãe transportando uma menina que até não é assim tão pequena, o que ajuda a conferir uma expressão enorme à fotografia. A despeito de existir uma presença humana na fotografia do interior do Museu de Arte Contemporânea da Fundação de Serralves, a anterior é mais... humana.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 7 (e mais tergiversações musicais)

2011 foi um ano de descoberta e revelação no campo da fotografia. A aquisição da Olympus E-P1 e das lentes, bem como o workshop que frequentei no Instituto Português de Fotografia, levaram a que o meu interesse por fotografia, que já era considerável, crescesse desmesuradamente. Não que se tivesse tornado uma obsessão: não passo os meus dias sob a compulsão de fotografar, nem fico ansioso à espera de tempos livres para pegar no saco e ir tirar fotografias a tudo o que me apareça pela frente, mas os momentos que passo a sós com a câmara são absolutamente insubstituíveis. Encontrar um objecto interessante e fotografá-lo de maneira satisfatória tornou-se numa actividade tão recompensadora que não me consigo imaginar desprovido de uma câmara.
Consigo, pelo menos por enquanto, manter-me calmo quanto ao equipamento: estou plenamente satisfeito com a câmara e as lentes que tenho neste momento. Não é exagero dizer que estou apaixonado pela minha câmara e pelas lentes OM. Não me vejo, no futuro próximo, a adquirir uma DSLR. A única evolução que prevejo para 2012 é dedicar-me ao macro - seja pela aquisição de extensões, seja pela compra de uma lente. Mas o macro requer paciência, um tripé, sessões fotográficas sem vento - sim, este último é um obstáculo a este tipo de fotografia - e sobretudo um flash anelar, pelo que duvido que venha a tornar-me num fotógrafo macro.

Entretanto, e porque a fotografia está longe de ser o meu único interesse, um balanço pessoal do ano não ficaria completo se não aludisse às minhas preferências musicais de 2011. A canção do ano está escolhida desde Março, e confirmei o que pensara sobre ela desde o início: não saiu nada melhor desde então. A minha canção do ano está definida desde muito cedo: é Helplessness Blues, dos Fleet Foxes. Canção, aliás, que ouvi na rádio no dia em que regressei a casa depois de comprar a E-P1!
Esta é a canção internacional; entretanto, o surgimento da Vodafone FM fez-me ver que há muitos conterrâneos a fazer música excelente, tão boa em Portugal como em qualquer outra parte do mundo. Estes têm a vantagem de ser portuenses como eu: são os X-Wife, e a canção é Keep on Dancing. Excelentes!
Devo dizer que hesitei entre os X-Wife e os Paus, porque esta Deixa-me Ser também é fantástica - mas o Keep on Dancing remete-me para a minha adolescência e para os Gang Of Four.
Bem sei que isto nada tem que ver com fotografia - mas, se o meu único interesse na vida fosse a fotografia, esta cedo se tornaria numa monotonia...

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 6 (Onde se fala de Anton Bruckner e de arte)

Um dia perguntaram a Anton Bruckner qual o significado do Finale da sua 8.ª Sinfonia. Habituados à religiosidade de Bruckner, muitos tentaram ouvir louvores a Deus, à imortalidade da alma e outros significados beatos naquele andamento soberbo e imponente. Anton Bruckner respondeu, com a simplicidade rústica que o caracterizava: «o Kaiser foi a Viena para discutir a guerra com o Imperador». Todos ficaram desiludidos com uma explicação tão terrena. (Mas a verdade é que aquele Finale tem mesmo uma sonoridade marcial.)
Na arte nem tudo tem de ter um significado - ou, pelo menos, o significado que alguns querem por força ver em determinada obra. Por vezes o significado não é óbvio, noutras vezes não tem de ter significado nenhum - o que não quer dizer que a obra seja sem propósito. Tentar encher a arte de conteúdo é, por vezes, mais uma tarefa para os críticos e apreciadores que para o autor. A arte é a expressão de um pensamento, de uma maneira pessoal de ver o mundo - mas é, sobretudo, uma emanação do mundo interior do artista, logo impossível de objectivar.
A mim pouco interessa - pelo menos por agora, que ainda não domino a fotografia - que achem que as minhas fotografias são desprovidas de significado. Aliás, nem sequer tenho o atrevimento de qualificá-las como arte. Contudo, tento (se consigo ou não, deixo-o ao critério de quem vê) que elas digam alguma coisa, e quando as faço é com uma intenção. Não tiro fotos ao acaso, mas apenas àquilo que me parece interessante e merecedor de ser fotografado. Por mais frívolo ou trivial que pareça o resultado.
No caso da fotografia acima, da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, procurei um enquadramento que exprimisse a essência da arquitectura de Siza Vieira: a integração no meio circundante, aprendida com Alvar Aalto, a geometria das linhas e a mestria com que Álvaro Siza lida com a luz e a sombra. E quis, também, ver os edifícios de uma perspectiva interessante - neste caso a partir da pequena guarita (eu sei que não é uma guarita, mas parece...) construída na parte oeste do conjunto arquitectónico. Foi como se visse a obra de Siza Vieira através da obra de Siza Vieira, como ele provavelmente quis que ela fosse vista daquele ponto (se não, porque teria construído aquela passagem ali, como se fosse um gigantesco postigo com vista para a faculdade?) Não quis que ela exprimisse uma mensagem, mas sim interpretar a maneira como o arquitecto concebeu aquele espaço do ponto de vista visual. Se consegui ou não, só o próprio Siza o poderá dizer - mas pelo menos tentei.
Também não estou preocupado se as minhas fotografias são um enorme sucesso. As fotografias de flores estiveram na moda até meio deste ano, altura em que parecia que todo o fotógrafo digno desse nome se dedicava a esse tema, mas o que me levou a fotografar flores não foi a necessidade de que toda a gente gostasse das minhas fotografias; foi a conjugação do desejo de fotografar com profundidades de campo reduzidas com o facto de ter finalmente uma lente que não me limitava tecnicamente para o fazer. E a profundidade de campo diminuta - a que muitos chamam bokeh - resulta particularmente bem nas fotografias de flores. Uma flor é uma flor; não há qualquer significado oculto numa flor, nem numa fotografia de uma flor. Porque o único sentido oculto das coisas/É elas não terem sentido oculto nenhum, citando Fernando Pessoa disfarçado de Alberto Caeiro.  Que conteúdo se pode extrair de uma planta? Apenas que é uma planta. Se, acidentalmente, essa planta é de uma beleza extrema, porque não deveria fotografá-la - e fotografá-la de maneira a mostrar todo o seu esplendor?
Há quem faça fotografia para agradar aos outros. Eu não. Ou melhor: gosto de reconhecimento como qualquer outra pessoa, mas não busco fórmulas para agradar a toda a gente. Claro que a fotografia apenas faz sentido se for partilhada - o mesmo se pode dizer de qualquer outra arte -, mas as minhas fotografias são, acima de tudo, ilustrações de uma evolução que ainda está muito, muito longe de chegar aos patamares superiores da fotografia, e devem ser vistas como tal. Não caio no ridículo de me apresentar como «fotógrafo artístico», mas quero que a minha fotografia tenha significado - mesmo que esse significado possa ser muito pessoal, e não aquele que quem a vê dela depreende. 

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 5

Em Setembro dominava já a técnica da focagem manual - o que não é lá muito difícil, pois toda a gente o fazia antes da invenção da focagem automática... -, mas a OM 28mm não me dava algo que eu procurava desesperadamente - uma profundidade de campo reduzida. Com uma abertura máxima de f3.5 e uma distância focal equivalente de 56mm, era impossível esperar aqueles fundos totalmente esbatidos que me esforçava por obter. Foi então que resolvi aceitar a proposta de comprar a OM 50mm/f1.4.
Foi uma decisão bastante acertada. Fotografar com aberturas tão amplas é um verdadeiro prazer. Claro que, com 100mm de distância focal equivalente, esta não é uma lente para todas as ocasiões: na verdade, quando montada na E-P1 comporta-se como uma pequena teleobjectiva. E a profundidade de campo só se torna verdadeiramente reduzida quando aproximo a lente até muito perto do objecto a fotografar. Mas é uma lente com a qual dou por mim a inventar motivos para a usar - tal o gozo que fotografar wide open proporciona. Nunca apreciei fotografias de flores, mas depois de ter a OM 50mm e descobrir o que se pode fazer com aberturas tão amplas, a fotografia de flores passou a ocupar uma parte substancial do tempo que dedico à fotografia.
 O facto de ter tanta satisfação em fotografar com a OM 50mm não implicou que me esquecesse das outras lentes, em especial da 28mm. E o facto de fotografar muitas flores não significou que deixasse de procurar outros temas. A OM 28mm tem a vantagem de fotografar os objectos sensivelmente na mesma proporção do olhar, o que a torna ideal quando quero fotografias mais documentais, i. e. mais reais e condizentes com aquilo que vejo. E eu vivo numa cidade com muito que ver. A Rua Miguel Bombarda, por exemplo: à custa da instalação das galerias de arte, aquela área tornou-se num nicho frequentado por pessoas de gostos sofisticados e levou ao desenvolvimento de um comércio imensamente fútil, mas ainda assim elegante e sofisticado. Com esta fotografia altamente iconoclástica, penso ter capturado este ambiente ligeiramente retro e underground que quase se sente na pele quando se percorre a zona das galerias de arte do Porto. Um ambiente no qual a E-P1 só é superada pelas Lomo...

domingo, 25 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 4

A minha atitude perante a fotografia é a mesma que uma criança perante a vida: quero descobrir tudo, e tudo de uma vez só. Tenho necessidade de me exprimir artisticamente, mas creio que as minhas fotografias revelam também um lado imaturo de quem quer descobrir os limites da técnica e procurar soluções para os problemas técnicos da fotografia. Há muito autodidactismo nesta minha busca, e tenho consciência de que, em muitas das minhas fotografias, a forma prevalece sobre a substância e denota algumas limitações.
O que é uma boa fotografia? Decerto não basta que seja tecnicamente bem tirada, com a composição, o enquadramento, a exposição e a medição correctas. A fotografia tem de despertar uma reacção em quem a vê, mesmo que seja de simples prazer contemplativo. Nem sempre tem de ter uma mensagem, ou pelo menos uma mensagem explícita. Tomemos o exemplo da Derrière la Gare de Saint-Lazare, de Henri Cartier-Bresson: qual é a mensagem que retiramos dali, quando comparada com as fotografias de Josef Koudelka aquando da invasão de Praga ou as fotografias que Kevin Carter fez no Sudão? E, contudo, é uma fotografia desafiante para a mente de quem a vê.
No caso da fotografia acima, feita no palacete dos Andresens quando visitei a exposição memorável de fotografias de Harold Edgerton, o preto-e-branco pareceu-me a única opção. Ao abstrair do elemento cor, a fotografia a preto-e-branco produz o efeito de concentrar o olhar nas formas e nos contrastes. Esta é uma fotografia na qual as formas predominam, ajudadas pela conjugação das luzes e das sombras. Há nela um sentido puramente parnasiano que me agrada, e uma harmonia das formas que faz com que seja uma das minhas preferidas.
Por outro lado, tenho vindo a descobrir as potencialidades da fotografia com uma avidez juvenil. A fotografia acima é um exemplo desta descoberta. Convém abrir aqui um parênteses para referir que não costumo manipular imagens. Todo o trabalho de retoque da imagem (pelo qual não me sinto nada culpado) é feito com o Olympus Viewer 2. Apenas adoptarei o Photoshop no dia em que descobrir que a câmara já não consegue satisfazer as minhas necessidades de expressão. E esse dia está longe. Nesta fotografia usei uma abertura estreita e uma velocidade de disparo longa. Respectivamente, nada menos que f22 e 13''! E tive de escurecer a imagem consideravelmente para que os rastos de luz sobressaíssem.
Sinto que, enquanto não dominar a técnica, não serei capaz de extrair todo o potencial da fotografia. Uma câmara como a E-P1 é já uma máquina razoavelmente evoluída que permite aceder a inúmeras funcionalidades - não esqueçamos que é uma DSLR sem espelho e pentaprisma -, e quero saber tudo o que ela tem para dar. Quero dominá-la, concretizar o triunfo do homem sobre a máquina. Não por ter um interesse desmesurado pela técnica, mas para poder empurrar as fronteiras da minha fotografia para um nível superior que, embora longínquo, sei estar ao meu alcance. Não importa se daqui a dois, cinco ou dez anos.

Balanço do ano, 3

Terminadas as férias, foi tempo de voltar à minha condição de fotógrafo de fim-de-semana. Deixou de ser possível fotografar sem planear as saídas, uma vez que uma sessão de fotografia pode ser tão cansativa como uma tarde de trabalho e torna-se necessário organizar bem o tempo disponível. A fotografia da Ponte D.ª Maria Pia (acima) é um exemplo desse planeamento: em lugar de pegar na câmara e fotografar o que se me atravessasse no caminho, resolvi concentrar a sessão neste objecto. Esta sessão foi a última em que utilizei exclusivamente as lentes concebidas para fotografia digital - neste caso a 40-150, uma lente um pouco antipática mas capaz de excelentes resultados. Curiosamente, toda a gente pensa que esta fotografia é a preto-e-branco, mas não é; o seu aspecto monocromático vem de um céu encoberto e da pintura cinzenta da ponte.
No dia 22 de Agosto comprei a lente OM de 28mm/f3.5. Nos primeiros dias foi complicado conseguir focar manualmente, mas acabei por dominar a técnica - com a ajuda da ampliação do ponto de focagem, é certo, mas no caso da fotografia acima ainda não tinha descoberto como se chegava a esta função. Esta fotografia é, ao contrário da anterior, o resultado de deambulações sem rumo definido pelas ruas do Porto. Uma Piaggio Vespa estava estacionada na Rua José Falcão, e o círculo perfeito do retrovisor esquerdo pareceu-me poder constituir um bom objecto para fotografar. Por sorte, consegui descobrir um ângulo do qual era visível um bom reflexo e fiz uma fotografia extremamente conceitual. Não, as fotografias da família e dos animais de estimação não são para mim. Eu vivo a minha vida à procura de qualquer coisa que ainda não sei bem o que é; quando a encontrar, a vida deixa de ter graça... talvez nessa altura me decida a comprar uma compacta para fotografar criancinhas e gatinhos.
A OM 28mm revelou-se um verdadeiro achado. As cores que ela capta são maravilhosas: saturadas, vivas e contudo muito naturais. Os seus únicos problemas são uma abertura máxima reduzida e um nível muito elevado de aberrações cromáticas, consequência de uma ligeira incompatibilidade resultante da diferença de concepção entre a lente analógica e a câmara digital. Estas aberrações, contudo, só surgem quando fotografo contra a luz, pelo que não é um problema grave. 
A fotografia acima é a expressão da minha vontade de fotografar objectos de uma forma diferente: em lugar de fotografar o pôr-do-sol directamente, aproveitei o reflexo das janelas espelhadas de um restaurante da Foz do Douro. Por sorte, um casal ia a passar quando estava a compor a imagem. Eu gosto desta fotografia: parece-me original e diferente, qualidades que reputo de importantes em fotografia.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 2

Continuando o exercício de narcisismo solipsista (ou será solipsismo narcisístico?) começado ontem, mostro-vos agora três fotografias que conto entre as melhores que fiz em 2011:
Adoro fotografia de rua. Embora ainda não me tenha encontrado como fotógrafo - nunca soube responder à pergunta básica que tipo de fotografia preferes? -, a fotografia de rua pode ser particularmente recompensadora. É o caso desta aqui: é a fotografia mais humana que fiz até hoje. É a minha pequena obra-prima. Deixei-me fascinar pela comunhão entre estas três pessoas (decerto mãe e filhas), pelo sorriso maravilhoso da criança e pelo olhar ligeiramente enigmático da rapariga à esquerda. Alguém sugeriu, depois de ter publicado esta foto no Facebook, que devia cortá-la, de maneira a excluir a rapariga à esquerda e concentrar a atenção na criança. Outra pessoa, Michiel Fokkema, comentou que "toda a gente tem fotografias sem a rapariga à esquerda". A rapariga à esquerda ficou. E ainda bem: considero o olhar dela ainda mais interessante que o sorriso da criança - por muito cativante que este seja.
Talvez esta seja a minha melhor fotografia. Quando ando pela Internet à procura de artigos sobre a Olympus E-P1, encontro sistematicamente comentários mordazes quanto ao tamanho do sensor e ao consequente ruído que invade as fotografias. Devo ser um génio, porque consigo fotografar à noite com esta câmara sem que o ruído destrua a imagem... Esta fotografia foi tirada em Amarante no dia 30 de Julho de 2011 e é o resultado de um planeamento exaustivo e cuidadoso: estudei o melhor lugar, a melhor hora e as melhores configurações da câmara para obter este resultado. Valeu a pena: esta é uma das fotografias de que sinto maior orgulho. Apenas lamento ter de a mostrar com um texto por cima, para prevenir eventuais usurpações - mas, como referi ontem, ela pode ser vista no meu Flickr. Intacta.
De novo a fotografia de rua. Este tipo de fotografia exige reacções extremamente rápidas e uma atenção particularmente desperta. Se o rapazito à esquerda não tivesse os olhos fechados, a fotografia seria de uma cena de rua banal, sem qualquer interesse especial. Tive sorte - ou estava atento, não me lembro. É pena que as figuras de fundo estejam excessivamente expostas, mas não pude fazer nada para o evitar. Nem a medição pontual ajudaria: se tivesse focado no rapaz, o segundo plano ficaria sobre-exposto; se tivesse focado o fundo, o músico e o miúdo surgiriam demasiado escuros. De resto, neste tipo de fotografia não há tempo para medições pontuais.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Balanço do ano, 1

Nesta época é habitual fazer-se o balanço do ano, cujo fim está bem próximo. Apesar de considerar este género de exercício um pouco fútil, a verdade é que 2011 foi um ano muito importante para mim no campo da fotografia. 2010 já o fora - afinal de contas, foi o ano em que comecei a fotografar -, mas 2011 foi o ano em que pude aceder a uma câmara digna desse nome. A E-P1 transformou por completo o meu modo de fotografar, possibilitando o acesso a funções avançadas e, o que é mais importante, o uso de lentes de acordo com as minhas necessidades. Em 2011 aprendi a dominar a técnica, usando-a para melhor exprimir as minhas ideias. Sei que tenho ainda muito que aprender - se não tanto no domínio da técnica, pelo menos na inspiração e criatividade. Trago comigo uma limitação de monta: viajo pouco, e a minha cidade está quase a esgotar o potencial fotográfico. Ainda não fotografei tudo numa cidade onde se conjugam o campo e a praia, o cosmopolitismo e a aridez, a urbanidade e a ruralidade, o esplendor e a miséria, o frenesim e a calmaria - mas a limitação do espaço não significa uma redução das suas potencialidades fotográficas. Há ainda muito a fotografar em cada esquina, em cada porta e em cada passeio desta cidade fascinante que é o Porto.

Para este balanço decidi mostrar dezassete das minhas fotografias, seleccionadas dentre as que considero as melhores que fiz neste ano que chega agora ao fim. Algumas já são conhecidas dos leitores do blogue, outras não. Infelizmente, vi-me obrigado a inserir textos, o que as destrói por completo, porque sei que muitos visitantes deste blogue vêm aqui com o único propósito de descarregar fotografias, completamente alheios ao facto de estas terem um autor cuja criação, embora não seja particularmente brilhante, merece ser respeitada. Não suportaria saber que alguém descarregara uma fotografia minha e a usara como se fosse sua - não por minha vaidade ou pretensão, mas por condenar a usurpação em si. As fotos, contudo, podem ser vistas sem estorvos no Flickr, onde estão devidamente protegidas. 
 Esta fotografia foi tirada durante os ensaios do grupo Sesquialtera na igreja de S. Lourenço, também dita dos Grilos, no dia 30 de Abril de 2011. Era o terceiro dia em que usava a E-P1, que adquirira no dia 27. Preocupei-me em aprender a câmara no mais curto tempo possível para poder fotografar o concerto em condições decentes. As imagens saíram vastamente superiores às que tirara no Natal de 2010 neste lugar, com a compacta Canon A3150: as cores são muito mais naturais, o ruído infinitamente menor e os pormenores muito mais nítidos. Porque prefiro esta fotografia às do concerto propriamente dito? Antes de mais, pelas duas figuras em movimento à esquerda. Um mês antes, teria rejeitado a fotografia por entender que o arrastamento arruinara a fotografia; hoje, porém, vejo o arrastamento como um efeito extremamente interessante: ajuda a descrever o movimento e dá dinâmica à fotografia. E é uma fotografia em que há muitas coisas a acontecer ao mesmo tempo. Sem o perceber, usei os princípios da fotografia de rua num espaço confinado que não podia ser mais diferente da rua. Tecnicamente está fraquinha: tem muito ruído e, quando ampliada, nota-se haver pouca nitidez em alguns planos. Teria precisado de um tripé e de mais tempo de exposição, mas não está má de todo.
 Esta fotografia foi feita em Maio no Centro Português de Fotografia (antiga Cadeia da Relação). Nesta altura ainda fotografava no modo P. Como se pode ver, a medição feita pelo fotómetro é quase ideal: as grades do primeiro plano surgem como uma simples silhueta, o que significa que a exposição foi medida no céu, e não nas grades. Bravo, Olympus! Consegui uma fotografia extremamente dinâmica, com um contraste interessante entre a contemporaneidade da estrutura metálica e a vetustez das grades. Ao capturar este contraste, creio ter apreendido o espírito dos arquitectos que renovaram a Cadeia da Relação. É conceitual - eu gosto de fotografias conceituais, com pontos de fuga enérgicos e linhas bem vincadas -, geometricamente forte, e é, do meu ponto de vista, uma das minhas fotografias mais conseguidas.

domingo, 18 de dezembro de 2011

O macro tornado simples


1. Introdução

Afinal, talvez a medição pontual e a calibragem do equilíbrio dos brancos não tenham sido as lições mais importantes do workshop do Instituto Português de Fotografia que frequentei; é bem possível que o ensinamento mais importante tenha sido um truque básico e extremamente rudimentar, mas que me abriu os olhos para um tipo de fotografia cujas possibilidades são imensas. O truque é simples, mas requer algum cuidado: 1) desmonta-se a lente; 2) monta-se a lente ao contrário, i. e. com a baioneta voltada para o exterior; 3) segura-se a lente com a maior firmeza possível; 4) dispara-se. Com este truque, consegue-se tirar fotografias macro sem a despesa de uma lente especial ou de tubos extensores. Claro que não é bem a mesma coisa, mas é possível obter resultados interessantes. A ampliação é extrema - eu usei, nesta minha primeira experiência, a OM de 50mm - e o resultado não é muito diferente do obtido com material específico para macrofotografia.

2. Precauções

Como referi, isto requer algum cuidado. Antes de mais, é necessário segurar a lente com muita firmeza, sem contudo danificá-la por usar força excessiva. É necessário também que a inversão da lente seja feita com extrema rapidez, de maneira a que o sensor seja exposto à luz pelo menor tempo possível. É algo que só devemos fazer se tivermos a certeza absoluta que não vai sair asneira - como deixar a lente cair, roçar o vidro no corpo da câmara ou deixar espaço entre a lente e o sensor.
Por outro lado, o manuseamento dos comandos da câmara pode tornar-se extremamente difícil, uma vez que a mão esquerda está mais ocupada em manter a lente no lugar do que em segurar a câmara, tarefa que é deixada à mão direita. Pode ser complicado regular a velocidade do disparo e premir o botão do obturador. Não será má ideia usar um tripé.

3. Focagem
Neste modo artesanal de fazer macro a focagem é feita aproximando ou afastando a lente do objecto. Não se aplicam a focagem automática, nem a focagem manual. A nitidez depende inteiramente da distância da lente em relação ao objecto, o que pode precludir o uso do tripé (a despeito da utilidade que este teria para se poder manusear os comandos da câmara).



4. Conclusões

Embora as amostras que aqui deixo sejam de qualidade discutível, elas prenunciam o que pode ser obtido na fotografia macro. É necessário ter em conta que se trata de ampliações entre 3x e 4x dos motivos escolhidos, e de imagens tiradas sem grande estabilidade, pelo que a perda de nitidez se deve mais a arrastamento do que a desfocagem. Há duas semanas passei pela loja do Porto onde comprei as minhas lentes OM, e o dono mostrou-me anéis macro da defunta Vivitar, concebidos para a série OM. Os resultados pareceram-me promissores, mas os motivos - letras impressas num jornal e a unha de um cliente da loja! - não eram particularmente interessantes. A experiência de hoje, porém, foi como a revelação de um mundo novo e inexplorado - o do infinitamente pequeno. O macro é uma das experiências fotográficas mais interessantes que pode existir. Pode-se fotografar motivos minúsculos com uma ampliação muito para além da que os olhos permitem, mas também motivos de um enorme grau de abstracção. O macro é fascinante!

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Novidades da Olympus

Hoje, 14 de Dezembro, era o dia que a Tokyo Stock Exchange fixara para que a Olympus Corporation apresentasse o balanço rectificado relativo ao primeiro semestre deste ano. Os resultados demonstrados deveriam reflectir as perdas que haviam sido encobertas através das aquisições e honorários suspeitos, e a Olympus cumpriu. Se não o tivesse feito até hoje, teria sido excluída da cotação, o que teria sido catastrófico. Evitou assim, por agora, a exclusão da bolsa de Tóquio, mas isto não significa que não possa vir a ser excluída se forem detectadas irregularidades graves - mas, pelo menos para já, essa possibilidade está afastada. Resta agora saber o que vai acontecer com o actual conselho de administração, cuja exoneração é necessária para restabelecer a confiança na companhia, e se Michael C. Woodford, o CEO que foi despedido por ter denunciado o escândalo, vai voltar a exercer as funções.
As perdas resultantes do exercício do primeiro semestre de 2011 foram de USD $414.000.000 (já reflectindo as perdas encobertas ao longo dos exercícios anteriores), o que não é uma quantia modesta, mas as acções têm vindo a subir progressivamente: depois de terem perdido 80% do valor nas duas semanas após o despedimento de Michael Woodford, valem agora metade do que valiam antes de o escândalo se tornar conhecido, o que significa que recuperaram cerca de 30%.
Talvez seja por este optimismo moderado que a Olympus lançou uma nova lente para o formato Micro Quatro Terços: a M.Zuiko Digital 12-50 f3.5-6.3. É uma lente que ninguém queria, e que apenas pode fazer sentido se substituir a execrável 14-42. Por um lado, é demasiado lenta na distância focal maior: com uma abertura de 6.3 e um volume tão avantajado - esta lente não é retráctil como a 14-42 -, vai obrigar a usar velocidades de disparo lentas e um tripé sempre que se quiser fotografar a 50mm. Mesmo na distância focal mínima de 12mm, a abertura de 3.5 não é nada de especial. Esperava que esta lente fosse uma versão para Micro Quatro Terços da lente 12-60 f2.8-4.0 que a Olympus fabrica para as DSLR, pelo que fiquei um pouco decepcionado. O facto de ter zoom motorizado não me impressiona, tal como a presença de um modo macro: fazer macro a 20 cm de distância não me parece assim tão interessante. As únicas vantagens são o facto de ser relativamente barata - €400,00 -, ter uma distância focal mínima de ultra grande-angular e ser à prova de água. Esta última característica também não me impressiona por aí além: significa apenas que tem um anel de borracha na baioneta, protegendo o interior da câmara de poeiras e humidade - mas pode prenunciar o lançamento de uma nova câmara da família PEN resistente à água, o que pode ser uma boa notícia: será a «PEN Pro» de que tanto se fala? Não faz sentido lançar uma lente resistente à água para um sistema de câmaras que não o é, pelo que parece que a Olympus está a lançar pistas sobre mais qualquer coisa ao apresentar esta lente. Vamos esperar... 

domingo, 11 de dezembro de 2011

Teoria geral do ruído

Como vimos nos três textos anteriores acerca da fotografia nocturna, o ruído é o maior inimigo da qualidade da imagem. Embora eu abomine ainda mais a distorção geométrica que o ruído, a verdade é que aquela se manifesta em muito menor escala, já que apenas surge quando se usam determinadas distâncias focais. O ruído, esse, aparece em praticamente todas as imagens em que haja zonas de sombra, o que lhe confere um carácter insidioso. Pelo que importa compreendê-lo de maneira a melhor o evitar - sendo certo, como veremos, que não é possível erradicá-lo totalmente.
O ruído é algo que resulta necessariamente do modo de funcionamento do sensor. Este é percorrido por correntes eléctricas  e estas correntes são tanto mais intensas quanto maiores forem os tempos de exposição. O sensor é um dispositivo electrónico: é, necessariamente, percorrido por pequenas cargas eléctricas, uma vez que as células que captam a luz (fotodiodos) convertem-na num sinal, i. e. num impulso eléctrico. Simplesmente, algumas destas correntes produzem interferências que criam um efeito pelo qual alguns pixéis causam aberrações na imagem, efeito que recebe a denominação de ruído e se pode manifestar em duas variedades: ruído de luminância e ruído de crominância. O ruído de luminância consiste no surgimento de pixéis sem relação com os circundantes, manifestando-se especialmente nas zonas de transição luz - sombra, e o ruído de crominância caracteríza-se pela difusão de pixéis coloridos que alteram a cor da imagem em zonas sub-expostas.
Para melhor ilustrar os efeitos nocivos do ruído, mostro-vos imagens captadas em tamanho normal, e ampliações a 100% de zonas afectadas pelas duas formas de ruído que especifiquei:


Neste caso, temos ruído de luminância na transição entre a luz e a escuridão. Devo referir que, das várias imagens que colhi deste lugar, esta foi a fotografia mais afectada pelo ruído, por ser aquela em que a transição entre luz e escuridão é mais abrupta. Noutras fotografias, em que a transição é mais suave, o ruído é virtualmente inexistente.


Esta imagem do aqueduto que fornecia água a Vila do Conde na era romana, colhida na freguesia de Amorim, surpreendeu-me pela quantidade de ruído de crominância presente, que é visível no canto inferior esquerdo, apesar de ter usado ISO 200 e de a velocidade de disparo não ter sido particularmente lenta (1/400). Como vêem, o ruído de crominância manifesta-se aqui de forma particularmente agressiva, introduzindo pixéis coloridos que obstam à uniformidade da zona de sombra.
O ruído é um problema inerente à captação da imagem. Não existe nenhum sensor perfeito: todos os sensores, mesmo os full frame (na semana passada li uma recensão da Leica M9, ilustrada por fotografias tiradas com valores ISO elevados, nas quais o nível de ruído era simplesmente inadmissível), produzem ruído, tal como o filme também produzia uma forma de ruído geralmente denominada grão. Ora, se o grão da fotografia analógica podia trazer algum acréscimo estético à textura da imagem - a Olympus explora esta característica com um filtro artístico denominado grainy film, capaz de bons resultados -, já o ruído digital é intolerável, contendo em si o potencial de destruir por completo a qualidade da imagem.
Naturalmente, os níveis de interferência eléctrica aumentam com a sensibilidade do sensor à luz: quanto mais elevada for a sensibilidade do sensor, mais correntes eléctricas o atravessam e, consequentemente, maior será a quantidade de ruído. Daí a minha insistência quase obsessiva em usar - e recomendar - o uso das menores sensibilidades ISO possíveis. Hoje em dia é quase uma moda fotografar com sensibilidades ISO elevadas, de tal maneira que a possibilidade de usar altos valores ISO se tornou num argumento de marketing. Se dependesse de mim, nenhuma câmara teria sensibilidade superior a ISO 800 - mas está bom de ver que, dadas as parvoíces que o marketing dos fabricantes emprega para impingir os seus produtos, ninguém compraria essas câmaras, cujos valores baixos de ISO seriam interpretados como uma desvantagem concorrencial.
Nem todos os sensores, porém, reagem da mesma maneira, nem produzem a mesma quantidade de ruído. De um modo geral, pode dizer-se que quanto maior for a área do sensor menor será a quantidade de ruído, mas esta regra comporta excepções. A quantidade de ruído depende de um factor denominado relação sinal/ruído, que implica que o nível de ruído será tanto menor quanto maior for a área do sensor e menor a quantidade de pixéis. O sensor de uma compacta é inerentemente ruidoso, mas o nível de ruído será um pouco atenuado se tiver uma quantidade moderada de pixéis - daí que sejam raras as compactas que vão além dos 14 megapixéis. Nos sensores de maior área, aqueles que tiverem menor quantidade de megapixéis terão, em regra, menos ruído - embora esta quantidade não possa ser tão baixa que comprometa a qualidade da imagem com o consequente aparecimento de serrilhado nos limites dos objectos. Estas excepções explicam-se pela dimensão física dos fotosensores: quanto menores estes forem, maior será o ruído aparente (o que, de novo, explica o mau desempenho das câmaras compactas no combate ao ruído).
Imagem colhida com uma compacta (Canon PowerShot A3150): o nível de ruído é assustador!
Os fabricantes de material fotográfico têm consciência deste fenómeno, pelo que, para além de optimizarem a relação sinal/ruído de maneira a obter um compromisso aceitável entre resolução e ruído, recorrem a filtros que têm por fim limitar a quantidade de correntes parasitas que circulam através das células fotosensoras. Estes filtros combatem o excesso de ruído, mas esta redução é feita à custa de uma suavização dos contornos da imagem que pode, quando a acção do filtro é demasiado agressiva, privá-las de pormenores subtis que contribuem para a resolução e definição da imagem; pelo que o filtro deve ser desligado quando se fotografa sob boas condições de luminosidade e deixado no modo normal ou automático quando a imagem inclui sombras. Associada a este filtro está a função de redução do ruído, que apenas deve ser activada na fotografia nocturna. O ideal seria fotografar sempre com o filtro desligado e sem a redução de ruído - o que beneficiaria a resolução e a nitidez da imagem -, mas a ausência destes meios traria um acréscimo insuportável de ruído. Alguns fabricantes - a Olympus é um deles - optam por filtros de ruído pouco invasivos, de maneira a preservar o pormenor, mas o preço a pagar pelo acréscimo de resolução é o aumento do ruído aparente.
Quanto às formas de minimizar o ruído, já me referi a elas nos textos precedentes sobre a fotografia nocturna (aqui, aqui e aqui). Resta apenas referir que o ruído pode também ser reduzido na pós-produção, em programas como o Adobe Photoshop ou através de plug-ins especializados, mas o efeito desta correcção é, invariavelmente, o esbatimento dos contornos das áreas afectadas pelo ruído.  

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Guia definitivo da fotografia nocturna (3)

Para terminar esta série de textos sobre a fotografia nocturna, falta apenas referir alguns pormenores técnicos que contribuem para a qualidade da imagem. Já mencionei, no primeiro texto, que todas as configurações que se usam ao fotografar de dia têm de ser mudadas, e isto justifica-se por dois motivos: a necessidade de captar a quantidade de luz requerida para uma exposição correcta - mas atenção, porque também pode haver sobre-exposição na fotografia nocturna! - e a obtenção da maior estabilidade possível. Tempos longos de exposição significam que a câmara se torna sensível a todo e qualquer movimento, por mais insignificante que pareça, pelo que, além do uso obrigatório do tripé, existem ainda outros cuidados a tomar para que a câmara não seja afectada por movimentos que, por mais pequenos que sejam, causam distorção por arrastamento e consequente perda de nitidez e de qualidade da imagem. 
Deve, por isso, ser desligado o estabilizador de imagem, quer este seja incorporado na câmara, quer na lente. O estabilizador de imagem pode interpretar o movimento das cortinas do obturador como vibração e ser accionado, o que provoca um movimento reactivo do sensor ou dos grupos ópticos estabilizados da lente. Este movimento causa distorção da imagem, pelo que é importante ter presente que o estabilizador de imagem deve ser posto fora de acção antes de disparar. O tripé trata de todo o trabalho de estabilização da câmara.
A câmara demora muito tempo a colher a imagem quando se seleccionam velocidades de disparo lentas; durante esse tempo, que pode ultrapassar a dezena de segundos, é essencial não tocar na câmara e assegurar que esta não será afectada por qualquer tipo de vibração. Desde logo, o botão do obturador não deve ser accionado directamente pelo fotógrafo, uma vez que esta acção pode causar vibração. Na fotografia nocturna usa-se sempre o temporizador, que retarda o disparo entre 2 e 12 segundos. Alternativas ao temporizador são o emprego de cabos disparadores (que só podem ser aplicados em câmaras cujo botão do obturador permita que um cabo seja enroscado) ou comandos remotos electrónicos, que funcionam ligando-se à entrada mini USB da câmara.
Os possuidores de câmaras reflex devem estar atentos ao facto de estas câmaras estarem equipadas de um espelho que desvia a luz que entra na lente para o pentaprisma, e daí para o visor óptico. Este espelho, colocado à frente do sensor, é levantado no momento do disparo, de maneira a que o fluxo de luz atinja o sensor. O movimento do espelho causa uma vibração conhecida por mirror slap, que prejudica a estabilidade da câmara. As DSLR têm um comando denominado mirror lock, que bloqueia o espelho e faz com que a visualização seja obtida através do ecrã da câmara, e não do visor. Convém, deste modo, utilizar esta função, e também um outro estratagema - já não para combater a vibração, mas para impedir a entrada de luz parasita na câmara: tapar o visor. A Canon adverte expressamente para a necessidade de obstruir o visor, tendo as correias das suas reflex uma pequena tampa para colocar sobre o visor quando se fotografa com tripé.  
Quanto às lentes a usar na fotografia nocturna, estas podem ser as mesmas que se usam noutras circunstâncias quaisquer, com uma pequena advertência: apesar de ter referido que devem ser usadas aberturas estreitas, ao redor de f11, aconselho o uso de lentes capazes de grandes aberturas máximas (à volta de f2,8). As lentes pouco luminosas não transmitem correctamente a imagem que se quer fotografar, sendo a imagem que surge no ecrã demasiado escura, o que pode induzir em erro. Este não chega a ser um problema, uma vez que a imagem captada acabará por corresponder à exposição desejada, mas introduz um factor de imprevisibilidade e de dificuldade quando se tenta enquadrar a imagem no ecrã. Fora esta ressalva, os critérios de escolha das lentes são exactamente os mesmos que para a fotografia diurna: grande-angulares quando se quer profundidade e largura, standards quando se pretende uma dimensão correspondente à visão humana e teleobjectivas quando se quer aproximar o objecto.
Uma última palavra quanto a um objecto especificamente nocturno ao qual algumas destas regras não se aplicam: a lua. Para fotografar a lua continua a ser imperativo usar um tripé, desligar o estabilizador de imagem e activar o mirror lock, mas as velocidades de disparo devem ser mais elevadas: de 1/125 a 1/250. É que o movimento de rotação da Terra pode - acreditem ou não - causar distorção por arrastamento. Para fotografar a lua exige-se uma teleobjectiva de grande distância focal - a partir de, digamos, 600mm. Caso contrário as crateras ficam imperceptíveis. 

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Guia definitivo da fotografia nocturna (2)

Agora que já temos o tripé montado numa superfície razoavelmente plana e suficientemente firme, apontado para o objecto que seleccionámos, o passo seguinte é configurar a câmara. O mais importante, na fotografia nocturna, é obter uma exposição correcta e, ao mesmo tempo, evitar que o ruído destrua a imagem. O ruído é uma aberração que afecta as zonas de sombra e as transições entre a luz e a escuridão, nunca afectando as altas luzes e sendo invisível nas zonas sem luz: uma área negra não é afectada pelo ruído, nem uma zona intensamente iluminada. O efeito do ruído consiste em dar um aspecto granuloso às áreas da imagem por ele afectadas, o que raramente produz imagens agradáveis de se ver. Muito do ruído é imperceptível em imagens pequenas, mas é notório em ampliações.
Vejamos, pois, quais os valores correctos de exposição e qual o método para diminuir o ruído para níveis toleráveis.
Na fotografia nocturna convém seleccionar os modos de exposição S ou M. Apesar de a velocidade do obturador ser o valor mais importante quando se fotografa de noite, o modo manual é preferível, uma vez que, se seleccionarmos a prioridade ao disparo (S), o fotómetro pode seleccionar aberturas demasiado estreitas. A abertura deve ser estreita - na ordem dos f11 -, mas não tanto que obrigue a exposições excessivamente prolongadas ou prejudique a nitidez. Embora possa parecer um paradoxo usar aberturas tão estreitas quando a luz é escassa, é necessário tomar em atenção que a abertura e a velocidade do disparo funcionam entre si numa relação de reciprocidade: quanto maior a abertura, maior é também a velocidade do obturador. Simplesmente, o uso de aberturas muito grandes implicaria velocidades de disparo elevadas, que é exactamente o que não se pretende na fotografia nocturna, que requer exposições consideravelmente longas; daí o uso imperativo de aberturas estreitas.
A velocidade do disparo deve ser lenta: 2 segundos ou mais. A regra não podia ser mais simples: quanto menos luz, menor a velocidade do obturador. Velocidades da ordem dos quinze segundos permitem uma captação de luz óptima quando o objecto a fotografar for pouco iluminado (fotografar à noite requer alguma paciência), e é possível obter exposições ainda mais prolongadas usando o modo bulb, pelo qual o obturador se mantém aberto enquanto o botão de disparo estiver premido. O bulb só deve ser utilizado quando a luz ambiente é praticamente inexistente.
Muito importante, neste tipo de fotografia, é manter uma sensibilidade ISO baixa. Hoje em dia, com câmaras a anunciar sensibilidades ISO da ordem dos 12800 ou mesmo 25600, muitos fotógrafos parecem sentir-se compelidos a usar sensibilidades elevadas para fotografar à noite (o que até faz sentido quando se pretende congelar motivos em movimento), mas nós já sabemos que a quantidade de ruído presente na imagem é tanto maior quanto mais elevada for a sensibilidade ISO utilizada. Daí que recomende o uso de ISO 100 - ou menor, se disponível. O uso conjunto de velocidades de disparo lentas e aberturas estreitas assegura, por si só, que os valores de exposição sejam os adequados para captar a luz necessária.
Outra configuração da câmara a ter em conta é a redução do ruído, função que pode ser encontrada nos menus da câmara e deve ser ligada antes de obter a fotografia. O efeito da redução do ruído não é o ideal, uma vez que tende a suavizar os pormenores subtis que conferem nitidez a algumas partes da imagem, mas este esbatimento dos pormenores é preferível ao ruído, pelo que é de fundamental importância usar esta função.
A calibração do equilíbrio dos brancos depende das preferências pessoais do fotógrafo e da natureza da luz. Quando se fotografam objectos iluminados por luz incandescente, podemos obter imagens com preponderância de tons laranja, uma vez que a câmara vê esta luz de modo diferente dos nossos olhos e tende a saturar a tonalidade alaranjada. Nestes casos é preferível retirar um pouco à saturação a usar o equilíbrio dos brancos para corrigir o excesso. Sempre que fotografo à noite faço diversas experiências com o equilíbrio dos brancos, mas acabo, invariavelmente, por escolher a definição automática. Contudo, também é possível obter bons resultados com a configuração fluorescente, que torna as cores ligeiramente mais frias. Repito: é uma questão de gosto. Podemos preferir um tom saturado, ou um aspecto mais neutro, mais próximo da nossa própria visão. Nada substitui a experimentação. (Continua)

Guia definitivo da fotografia nocturna (1)

Eu sei que já escrevi um texto sobre a fotografia nocturna, que está, no essencial correcto; simplesmente, ao tempo em que escrevi o texto, ainda não era um fotógrafo certificado. Agora que o sou, talvez as minhas sugestões sejam levadas mais a sério.
Sem brincadeiras: o texto anterior era pouco sistemático no tratamento dos requisitos da fotografia à noite, o que pretendo corrigir com este novo texto. De resto, mesmo sem o workshop, hoje conheço melhor as técnicas fotográficas que em Julho, mês em que escrevi o primeiro texto. Fotografar à noite não é simples, nem é intuitivo. De uma maneira geral, todas as configurações da câmara e da lente que se usam durante o dia têm de ser mudadas. Acresce que a fotografia nocturna traz consigo um problema sério, que é o do ruído digital, que tem o potencial de destruir a qualidade da imagem mas pode ser drasticamente reduzido, se forem tomados alguns cuidados.
De resto, a fotografia nocturna está nos antípodas do espontâneo e do improvisado. É um tipo de fotografia que exige estudo e antecipação, bem como uma preparação que não tem paralelo na fotografia diurna. Na fotografia nocturna não basta pegar na câmara e disparar, e não é qualquer motivo que pode ser fotografado de noite: as condições de iluminação do objecto são fundamentais para se obter sucesso numa fotografia.
A primeira observação a ter em conta, quanto à fotografia nocturna, é a necessidade absoluta de um tripé. As fotografias tomadas segurando a câmara com as mãos podem parecer decentes quando visualizadas no ecrã da câmara, mas não resistem a uma ampliação. Por mais estáveis que sejam as nossas mãos, e por mais ergonómica que seja a câmara, notar-se-ão sempre fenómenos de distorção por arrastamento, particularmente visíveis nas luzes artificiais.
O tripé não é um acessório que se adquira levianamente. Um dos meus colegas do workshop tinha um Manfrotto de base para segurar uma reflex da Nikon. Eu rejeitei esse tripé por receio de não ser suficiente para a E-P1 quando montasse lentes pesadas. Os tripés são concebidos para suportar determinadas cargas: um tripé com uma carga máxima de 1,5 kg não é adequado para uma reflex, cujas lentes podem ultrapassar facilmente esse peso. Inversamente, comprar um tripé para uma carga de 5 kg e usá-lo com uma compacta é um desperdício. Os tripés trazem consigo etiquetas ou folhas de instruções nas quais se indica qual a carga máxima que suportam: deve-se consultá-las antes de comprar o tripé, antecipando a possibilidade de adquirir teleobjectivas de elevado peso no futuro. É que algumas lentes - especialmente as teleobjectivas de abertura constante - podem servir também como pequenos halteres.
É importante referir que não é só de noite que se usa o tripé. Este pode ser usado em qualquer altura do dia, quando se requeiram velocidades de disparo lentas ou sempre que a fotografia exija grande estabilidade (como na macrofotografia). A fotografia nocturna é, porém, o domínio por excelência do tripé; a diferença que vai de uma fotografia tirada de noite com e sem tripé é a mesma que existe entre uma fotografia bem tirada e uma fotografia mal tirada.
Os principais requisitos do tripé são a estabilidade e a rigidez, que nem sempre são sinónimos. O meu tripé, um Manfrotto MK393-H, não é particularmente rígido, mas é muito estável. E um tripé rígido pode ser instável, se por ex. as fixações das pernas não forem seguras, ou se a cabeça não tiver um aperto suficientemente firme. A estabilidade e a rigidez contribuem para que as fotografias sejam desprovidas de distorções, permitindo fotografias de muito maior nitidez. É que, como veremos mais adiante, a fotografia nocturna requer tempos de exposição muito elevados, o que torna impossível obter boas imagens quando se segura a câmara com as mãos. Há truques que contribuem para uma ainda maior estabilidade do tripé: por exemplo, alguns tripés têm um gancho na base da coluna. Esse gancho serve para pendurar o saco do equipamento (ou qualquer outro objecto pesado), de maneira a aumentar a estabilidade. Outro truque, bem mais simples, é o de não elevar a coluna do tripé. A altura do tripé deve ser obtida estendendo apenas as pernas, e nunca a coluna. E, se a altura for suficiente, deve evitar-se estender totalmente as pernas do tripé.
O tripé deve ficar bem nivelado. Seria lamentável seguir todas as recomendações deste e do próximo texto e verificar, ao descarregar as imagens, que elas ficaram descaídas. Alguns tripés têm níveis de bolha incorporados; se não tiverem, deve usar-se um nível de bolha portátil; se não for possível encontrá-lo numa loja de fotografia, eis uma sugestão: alguns fabricantes de alta fidelidade, como a Ortofon, fabricam níveis de bolha pequenos para gira-discos, nos quais o nível correcto é fundamental. Em alternativa, se disponível, pode usar-se o nível digital da própria câmara. O nível pode ser ajustado na cabeça do tripé ou ajustando a altura de uma ou duas pernas.  
Refira-se, por fim, que os tripés se compõem de uma cabeça ajustável, à qual a câmara é fixada, e das pernas. Estes elementos podem ser adquiridos em conjunto (os chamados kits) ou separadamente, e esta é, em regra, a opção dos profissionais. Para os fotógrafos estritamente amadores, os kits são mais que suficientes. Os tripés podem ser construídos em quatro tipos de materiais: alumínio, madeira, fibra de carbono e basalto. O emprego de cada um destes materiais faz variar a rigidez, mas também o peso - o que é um factor importante quando se transportam vários quilogramas de equipamento. A escolha mais ajustada será a fibra de carbono, por ser leve e rígida, mas os tripés de fibra de carbono são caros. No caso dos fotógrafos sem pretensões, o alumínio é um bom compromisso entre preço, estabilidade e rigidez. (Continua)

sábado, 3 de dezembro de 2011

O histograma e eu

O histograma é a representação gráfica da exposição. Patenteia as altas luzes, as sombras e as cores num gráfico que pode ser consultado directamente na câmara (no caso da E-P1 acede-se pressionando quatro vezes o botão INFO) ou, depois de se transferir a imagem para o computador, no programa de edição de imagem.
Ainda não consegui compreender a utilidade do histograma. Embora tenha aprendido a interpretá-lo correctamente, não sei em que é que ele pode substituir a minha visualização. Eu não preciso de um gráfico para entender se uma fotografia está sub-exposta ou sobre-exposta: basta-me olhar para ela para o perceber. Aliás, eu prefiro as minhas fotografias ligeiramente sub-expostas e com muito contraste, pelo que, a avaliá-las com base na informação do histograma, teria de concluir que estão sempre erradas. Os histogramas das minhas fotos poderiam, se fossem analisados sem olhar a imagem, ser interpretados como uma prova de inabilidade para fotografar (o que é apenas parcialmente correcto...)
Deste modo, costumo ignorar a informação do histograma, tal como costumo ignorar os gráficos que demonstram os valores da inflação ou da perda do poder de compra: estas são coisas que sinto, não preciso que sejam confirmadas por gráficos. Não preciso de um gráfico para perceber que estou a viver pior ou melhor que há um ano atrás.
Para quem se interesse por estas coisas - como é o caso de quem compõe a imagem no Photoshop - o histograma pode ser útil, pelo que seguem algumas indicações sobre como interpretá-lo.
- Quando as curvas do histograma estão maioritariamente chegadas ao lado esquerdo do gráfico, tal significa que a imagem está sub-exposta;
- Inversamente, a preponderância de curvas sobre o lado direito indica que a imagem está sobre-exposta.
Temos, assim, o primeiro elemento que importa compreender ao interpretar o histograma: o máximo de sombra é representado no lado esquerdo, e o máximo de luminosidade no direito. Curvas aproximadas ao lado esquerdo surgem quando a fotografia está escura, e vice-versa. A exposição ideal terá uma concentração de curvas a meio do gráfico.
Simplesmente, aquilo que é a exposição ideal para o fotómetro pode não o ser para o fotógrafo; este pode gostar de imagens muito contrastadas, ou pode ter interesse em imagens banhadas em luz. Em ambos os casos, estas fotografias tenderão a ser interpretadas graficamente como, respectivamente, sub ou sobre-expostas.
O problema surge quando o histograma apresenta informação demasiado chegada à esquerda ou à direita. Alguns histogramas têm uma marcação em ambos os lados, um pouco antes dos extremos horizontais do gráfico, que representam os limites da gama dinâmica. Isto significa que, quando as curvas ultrapassam essas marcas, a imagem excedeu aquilo que o sensor vai captar. Aqui pode haver um problema, já que as imagens em que esses limites sejam ultrapassados serão ou demasiado escuras ou demasiado claras e a imagem apresenta deficiências de resolução, com perda de pormenores da imagem nas zonas afectadas - mas isto é algo que se depreende imediatamente quando se visualiza a imagem no ecrã logo a seguir ao disparo do obturador. Concedo, contudo, que o histograma pode ser útil nestas situações - embora o bom fotógrafo tenha o cuidado de se certificar dos valores da exposição antes de tirar a fotografia, o que torna a informação do histograma redundante.
O que referi até agora refere-se à distribuição das curvas na horizontal, mas o histograma é uma representação a duas dimensões, pelo que também há que saber interpretá-lo na vertical. A informação na vertical mostra-nos a preponderância dos tons na gama dinâmica, sendo frequente que, por ex. na fotografia de uma rosa, que o magenta surja representado numa curva que excede o topo superior do histograma. Ao contrário da sub e da sobre-exposição no plano horizontal, isto não é alarmante - significa apenas que o sensor não conseguiu captar todo o espectro da cor, por este exceder a capacidade de captação (ou, se preferirmos, a sensibilidade) da câmara. Devo dizer que isto me acontece com bastante frequência quando uso as lentes OM, uma vez que não há comunicação electrónica entre a lente e a câmara, pelo que as aberrações cromáticas, não sendo controladas, se manifestam em curvas extremamente altas, excedendo o topo do histograma.
O que nos leva a uma revelação triste: o filme tem maior gama dinâmica que o sensor (*) e os extremos da referida gama são mais suaves, com melhor transição nas sombras e altas luzes. Enquanto a representação da gama dinâmica de uma câmara digital é uma linha recta entre o canto inferior esquerdo (sombras) e o superior direito (altas luzes), a mesma linha, na fotografia analógica, apresenta curvaturas nos dois extremos, assim evitando transições abruptas numa gama dinâmica que é mais extensa. Como as lentes OM são concebidas para responder a uma gama dinâmica mais extensa que a do sensor digital, as curvas que surgem no histograma são mais abruptas. Não é certamente isto que me vai fazer ir a correr comprar uma Olympus OM-1, mas está explicada a maior riqueza e saturação das cores quando uso estas lentes.
Acima de tudo, o histograma apenas é interessante para quem atribuir grande importância às questões técnicas, analisando as fotografias do mesmo modo que um economista interpreta a variação da inflação ou do produto interno bruto. O histograma é um auxiliar que pode ter a sua importância em casos pontuais, mas não é fundamental consultá-lo. O fotógrafo que pensa antes de carregar no botão de disparo terá previamente escolhido o valor da exposição para que a imagem não surja demasiado clara ou escura. De resto, a existência de problemas de exposição que o histograma possa patentear não significa, necessariamente, que se esteja diante de uma má fotografia. Daí que encare o histograma como algo de limitada utilidade e, em última instância, uma informação desnecessária.
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(*) Michael Freeman, Mastering Digital Photography, Ilex, p. 627 

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Fotógrafo certificado

Já não sou um autodidacta! As minhas competências - ou falta delas - estão agora certificadas. E não por uma espelunca qualquer, mas pelo Instituto Português de Fotografia.
Se é verdade que, do ponto de vista técnico, ou objectivo, fiquei com melhores conhecimentos de fotografia, também é certo que não é em cursos que se aprende a tirar fotografias subjectivamente boas. Nenhum curso pode substituir ou suprir a aptidão para captar fragmentos do espaço e do tempo. Esta é algo que se tem ou não. Nenhum workshop pode ensinar esta faculdade, que tem que ver com a mente do fotógrafo.
Contudo, é sempre bom saber que as técnicas fotográficas estão ao nosso alcance, e nem sequer são tão complicadas como se pode pensar. A frequência do workshop eliminou algumas das minhas grandes dificuldades técnicas e confirmou a validade dos conhecimentos que adquirira, quer em leituras, nas consultas da Internet ou simplesmente explorando as funções da câmara. Acho que posso dizer que, tecnicamente, sou hoje um fotógrafo melhor que era antes de 4 de Novembro.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Classificação das lentes

Através dos dados do Blogger, tenho verificado que existe um interesse considerável pelo conhecimento dos diversos tipos de lentes. Apesar de já ter versado este tema, tentarei, neste texto, oferecer uma sistematização das lentes, de acordo com os critérios mais importantes: a distância focal, o ângulo de visão e o tipo de construção.
A distância focal é o espaço que a luz que penetra na lente percorre até obter a focagem. Esta distância pode ir de valores tão baixos como 7mm até acima de 1000mm. Conforme estes valores, as lentes podem ser divididas em três grandes grupos: grande-angulares, normais e teleobjectivas.
Grande-angular de distância focal fixa

1. Grande-angulares

As grande-angulares são, como o nome indica, lentes que conjugam uma distância focal reduzida - aproximadamente entre 7 e 35 mm - com um ângulo de visão amplo (e nós sabemos que o ângulo de visão varia na proporção inversa da distância focal). São lentes que produzem ângulos de visão extremamente amplos, produzindo, em consequência, linhas diagonais fortes e com tendência a convergir. As grande-angulares compreendem uma subdivisão: as ultra-grande-angulares, na qual se compreendem as distâncias focais entre 6 e 18mm, categoria na qual se incluem as lentes fish-eye, que, pelo seu ângulo de visão extremo, acentuam a curvatura das linhas horizontais e verticais, produzindo efeitos que podem ser extremamente interessantes, mas cuja utilidade é residual.
As lentes grande-angulares são indicadas para paisagens e fotografias de arquitectura e interiores, ou sempre que se pretenda obter ângulos de visão extensos. São também ideais para prover uma sensação de envolvimento do espectador com a imagem. As grandes-angulares produzem distorção da imagem na forma de divergência das linhas verticais e horizontais, a que vulgarmente se chama distorção de barril, uma aberração óptica que é tanto mais pronunciada quanto menor é a distância focal.
Zoom standard 18-55

2. Standard

As lentes normais, ou standard, abrangem distâncias focais entre os 35mm e os 70/80mm. Estas distâncias focais são aquelas que têm maior similitude com a forma como o olho humano vê os objectos, sendo pacífico que a distância focal mais próxima da visão humana é a de 50mm. São aptas para a fotografia de rua e para uma utilização mais geral e são as mais isentas de aberrações geométricas.

3. Teleobjectivas

As teleobjectivas são todas as lentes de distância focal superior a 70-80mm. Estas lentes caracterizam-se por a sua dimensão física ser inferior à distância focal. As teleobjectivas comprimem a perspectiva e têm ângulos de visão reduzidos, e a sua utilidade pode ir desde o retrato e a fotografia de close-ups até à captação de motivos distantes, que com as outras lentes surgiriam em dimensões reduzidas.
As teleobjectivas apresentam alguns problemas com os quais o fotógrafo deverá estar preparado para lidar. Antes de mais, são lentes cujos valores máximos de abertura são, por regra, demasiado diminutos. São lentes concebidas para fotografar com as maiores aberturas possíveis, o que significa que a sua profundidade de campo é reduzida. Para manter uma focagem nítida ao longo de toda a imagem, estas lentes requerem aberturas reduzidas, o que implica velocidades de disparo igualmente baixas. Isto, acrescido ao volume de algumas teleobjectivas, significa que é difícil obter imagens nítidas, exigindo o uso de tripé para que não existam efeitos de arrastamento provocados pelo tremor das mãos. Quanto às aberrações ópticas, as teleobjectivas, nas distâncias focais mais longas, tendem a produzir distorção convergente, em que o centro das linhas horizontais e verticais convergem para o interior da imagem.


Teleobjectiva de distância focal variável (zoom)
As lentes podem também ser divididas em dois grandes grupos de acordo com o seu tipo de construção: lentes de distância focal fixa (ou prime) e variável (zoom) Existem lentes grande-angulares de distância focal fixa e de distância focal variável, lentes normais de distância focal fixa e de distância focal variável e teleobjectivas de distância focal fixa e de distância focal variável. Contudo, enquanto nas lentes grande-angulares a regra é serem de distância focal fixa, a distância focal variável é a regra para as teleobjectivas, sendo relativamente raras as teleobjectivas de distância focal fixa.
Quanto às lentes normais, ou standard, é frequente que sejam de distância focal variável, não sendo raras aquelas cujo zoom lhes permite comportarem-se como grandes-angulares na distância focal mínima e como teleobjectivas na distância máxima, mas estas lentes conjugam os problemas comuns às grandes-angulares e às teleobjectivas, apresentando distorção divergente nas distâncias focais curtas e convergente nas distâncias longas. Além disso, é extremamente difícil fabricar lentes desta natureza com aberturas grandes, pelo que estas standard zooms costumam ser lentas, obrigando a usar aberturas grandes de maneira a obter velocidades de disparo decentes para evitar o arrastamento dos motivos causado pela instabilidade no manuseamento do conjunto câmara - lente.
Devo dizer - embora esta seja uma preferência estritamente pessoal - que as lentes de distância focal fixa são mais agradáveis de usar que as zoom. Nestas a regra é o valor mínimo de abertura aumentar à medida que se seleccionam distâncias focais superiores, o que introduz algumas dificuldades na focagem - mesmo na focagem automática. E, dada a sua dimensão, tornam-se difíceis de estabilizar, levando frequentemente à obtenção de arrastamentos por falta de firmeza ao segurar a câmara com essas lentes montadas.
Lente catadióptrica 500mm
Um último parágrafo para referir alguns tipos especiais de lente: para além das fish-eye, que são ultra grandes-angulares com uma distorção óptica exacerbada, existem ainda as lentes macro, que ampliam motivos muito para além da capacidade de visão humana, as lentes de plano focal variável (que podem ser movidas nos planos vertical e horizontal), que compreendem as tilt and shift e as lentes de fole, e as lentes catadióptricas, que, à semelhança dos telescópios, aumentam a distância focal com recurso a espelhos internos - com o inconveniente de, por terem um disco reflector no centro da lente, fazerem surgir círculos na imagem quando a profundidade de campo é reduzida. Têm, contudo, a vantagem de permitir grandes distâncias focais em lentes relativamente compactas.